A ceifeira de arroz que era vaidosa do seu trabalho
Ouça e leia a entrevista com Maria Adelaide, uma das últimas mondadeiras da Lezíria
Sílvia Agostinho
16-07-2016 às 10:18 Maria Adelaide, de Benavente, hoje com 77 anos, sempre foi boa aluna, “a melhor”, não tem pejo em admitir, mas quis a vida que fosse trabalhar para o campo, interrompendo um futuro promissor que já se adivinhava na escola primária, “onde era a melhor em tudo”. Mas no arroz, o seu espírito competitivo também se fazia sentir. E apesar de desgostosa com a saída da escola, não hesitou em arregaçar as mangas, ou se calhar é melhor dizer arregaçar as saias, tendo em conta a especificidade deste trabalho. “Fiquei com pena de ver certas raparigas que eram tão burras tirarem a quarta classe, mas eu tinha de ir ajudar os meus pais”; diz no seu tom muito característico. Os pais eram camponeses: “Nunca tive nem doutores nem engenheiros na família. Só campinos e trabalhadores e todos muito sérios” diz com orgulho. Para ajudar a colocar pão na mesa, Maria Adelaide foi com nove anos para a monda do arroz. A quarta classe só a tirou na idade adulta. “Fui sempre boa para trabalhar até gostava mais de fazer o trabalho dos homens, que consistia em levar os molhos do arroz para cima de um reboque que depois ia para a eira”. Isto antes de aparecerem as ceifeiras debulhadoras. Antes havia as foices – “Éramos muitas a trabalhar. A ganhar metade do que os homens ganhavam”. A vida no campo era dura: “Cheguei a ir para a Quinta da Murteira, do outro lado do Almansor. Deveríamos estar lá ao nascer do sol. Atravessávamos toda a várzea de Samora. Tínhamos de passar o rio através de umas tábuas improvisadas”. Maria Adelaide que naquela altura era das mais novas no trabalho do campo, também se recorda de “andar na eira a ‘desatar’ o arroz que ficava nas debulhadoras grandes. Cortávamos com uma navalha”. E mostra algumas sequelas do trabalho: “Gostava de cortar rentinho, porque era muito vaidosa, e este calo que tenho na mão é dessa altura”. “Mas sachar milho era pior do que o trabalho do arroz. Adorava quando havia vento, e enrolava o arroz. Chegávamos aos canteiros e nem o víamos. Estava todo deitadinho. Era engraçado andar à procura dele”. Um dos episódios desses dias foi quando “houve uma grande cheia em Samora, e andávamos com os molhos do arroz à cabeça, e aos nossos pés ratos a quererem subir pela gente acima, e nós a sacudirmo-nos todas”. Para aliviar a rudeza do trabalho, Maria Adelaide e as colegas conversavam sobre a vida, só não se podia fala da ditadura. Cresceu com o Estado Novo e ainda se recorda quando a mãe e um grupo de outras mulheres foram trabalhar para uma propriedade em Santo Estevão, “e havia lá aquela gente, os comunistas, que não queriam que elas fossem trabalhar por causa de uma greve”. Mas muita gente “nem sabia o que era aquilo ou o que eles pretendiam”. Por isso, algumas mulheres foram, mesmo assim, trabalhar “e numa zona que é o Valado, perto da Quinta da Palmeira, enredaram-se numas silvas, enquanto outras andavam a descompô-las, a mandarem-nas para casa, porque não tinham nada que ir trabalhar”. A GNR “foi buscar as que estavam no trabalho, como a minha mãe a minha tia, e as que provocaram o levantamento”. Imediatamente, “chegou lá o tenente de Coruche e deu com um vergalho nas protestavam. Uma senhora que morreu há pouco tempo até se mijou toda. Aquele tenente era do piorio”. E quanto aos patrões – “Nem todos eram bons, havia de uns e de outros”. Pois “alguns malandros que nem queriam pagar”. A maioria dos proprietários eram de Coruche. “Trabalhámos durante anos para um senhor da Fajarda”. Quando apareceram as primeiras máquinas, os ordenados subiram, “e até me lembro de o senhor Paim me ter dito que ia passar a ganhar 50 mil reis, quando antes ganhava 20. Entretanto como já havia menos gente a querer ir para o trabalho do campo, tiveram de subir os ordenados”. O marido de Maria Adelaide foi o primeiro a ir trabalhar com um rebaixador para a Companhia das Lezírias. (clique na seta laranja no canto superior esquerdo da imagem para ouvir a entrevista)
|
Vila Nova da Rainha no Roteiro Nacional do Turismo Militar
Centenário da Aviação Militar: Presidente da República visita Vila Nova da Rainha Flora Ferraz em residência artística no concelho do Cartaxo Portuguesa que procurou clínica das células dendríticas: Fátima Simões venceu o cancro Bombeiros de Alcoentre comemoram 80 anos |