Objetivo Unesco para as tradições da região
Portugal é um dos países com um maior número de bens inscritos como património material da Unesco, e parece querer seguir o mesmo caminho na categoria de bens consagrados como Património Cultural e Imaterial da Humanidade. Um pouco pelo país abundam diferentes candidaturas e a região não foge à regra. “Cantar e Pintar dos Reis”; “Fandango”; “Falcoaria” e “Cultura Avieira” desejam juntar-se como bens da Unesco ao cante alentejano, à dieta mediterrânica, ao fado e ao chocalho.
Sílvia Agostinho
29-09-2016 às 12:54
Candidatura da Cultura Avieira tenta colar cacos depois dos reveses
A candidatura avieira a património nacional surgiu em 2005, e de lá para cá sofreu diversas reviravoltas. Pelo meio, surgiu também a ideia de ser candidatada a património da Unesco mas pouco se tem sabido deste processo. Enquadrada no Instituto Politécnico de Santarém, viu sair nos últimos tempos um dos principais rostos do projeto que liderou durante vários anos as duas candidaturas, João Serrano, que entretanto decidiu abraçar a mesma causa mas no âmbito da Confraria do Tejo. O estudioso que também teceu duras críticas à Entidade Regional de Turismo do Alentejo e Ribatejo, tendo em conta que “a dada altura quis à viva força ficar com a candidatura e açambarcar o protagonismo”. João Serrano comparou mesmo, em declarações ao nosso jornal, em agosto de 2015, a atitude da ERT “a um elefante numa loja de vidros”. Ouvido pela nossa reportagem para este trabalho, o presidente da ERT, Ceia da Silva, tenta desmistificar essa ideia: “Nunca tentámos açambarcar a candidatura, mas apenas disponibilizar a nossa ajuda, até porque em termos de apresentação à Unesco, tudo ainda estava e continua a estar no seu início”.
Lurdes Véstia, do Instituto Politécnico de Santarém, refere que chegados a 2016, e depois de muito caminho percorrido, nesta altura a candidatura a património nacional apenas inclui a bateira, o barco dos avieiros, por ser “o único elemento aglutinador que pode ser incluído como tal, por ainda se manter vivo entre as populações, porque ainda é construído”. Foi escolhida a aldeia das Caneiras, Santarém, e depois de um estudo feito no terreno concebeu-se um “Plano de Salvaguarda das Artes e Saberes da Construção e Uso da Bateira Avieira no Rio Tejo nas Caneiras Santarém” no final de 2015. Depois desta fase, o Instituto Politécnico tem de manter viva esta tradição durante um prazo de avaliação de 10 anos, “através da divulgação nas escolas, mas também através da promoção de formação profissional na componente da construção da bateira”. Segundo Lurdes Véstia, “a candidatura está comprometida em aplicar no terreno o trabalho necessário, para que não aconteça o mesmo que sucedeu com a candidatura do gótico de Santarém em que nada se fez e acabou por morrer, porque o caderno de encargos, nestas coisas, tem de ser cumprido”.
Paralelamente, decorre a candidatura avieira a património da Unesco neste momento nas mãos da ERT, “embora o proponente seja o Instituto Politécnico de Santarém, e é a instituição que aparece sempre nesta linha da frente”, refere Lurdes Véstia. Para a investigadora, a assunção desta candidatura pela entidade “é natural”, e sobre o mau estar que terá provocado junto de João Serrano, admite que o mesmo possivelmente “vê inimigos onde eles não existem”. E saúda o que considera ser uma outra abertura por parte de Ceia da Silva, em relação aos seus antecessores na estrutura do Turismo – “Um homem de terreno que veio várias vezes ver a aldeia, que se interessou imenso pelo projeto, e que se reuniu por diversas ocasiões com responsáveis do Politécnico. Sempre se mostrou interessado em ajudar a candidatura, e não a ficar com ela”.
No âmbito do projeto turístico que envolve o património avieiro, uma equipa contratada pela ERT está também a planificar um projeto de marketing para venda deste produto, “como já o fizeram para o cante e para o chocalho”. “Segundo o que me explicaram a ideia é trazer o turista às nossas aldeias e depois partir com eles para o Alentejo onde vão conhecer o cante, e outras tradições”.
Para a história desta candidatura, ficam os diversos projetos turísticos que ao longo dos anos foram falados, mas que acabaram por ficar pulverizados no mar das boas intenções. “Inclusivamente houve um empresário que se mexeu imenso para construir um hotel palafítico no Escaroupim mas foi sempre barrado, porque a Câmara nunca quis ajudar. Sei que ele penou horas e horas nas repartições”. “Houve dificuldades impostas pelas autarquias. Os planos de pormenor esbarravam nas limitações ecológicas inerentes, porque ficavam dentro de zonas ribeirinhas. Tudo isto cansou muito as pessoas”. A CCDR de Lisboa foi um dos principais travões, “onde era impossível negociar, pois nunca deixaram que nada andasse para a frente”.
O projeto agora em desenvolvimento pela empresa contratada pela ERT não tem o mesmo grau de ambição, até porque os empresários que alguma vez sonharam com projetos à beira rio foram progressivamente desistindo, “apenas houve um de turismo rural que consegui vingar na Golegã”.
Quanto ao dossier técnico a apresentar à Unesco, “será efetuado por uma nova equipa também contratada pela ERT, e que absorverá todo o trabalho que foi feito até à data”. A documentação será entregue até ao final do ano.
Lurdes Véstia afirma-se “satisfeita” com o curso do projeto, embora reconheça que o mesmo “esteja a assumir uma vertente mais comercial, mas possivelmente a vertente cultural dá menos dinheiro, e as coisas passam um pouco pela vertente financeira”. “Mas se as coisas tiverem de ser assim, antes desta forma do que nunca mais”, desabafa.
Ouvido pela nossa reportagem, João Lobo, um dos avieiros do Tejo, lamenta a saída de João Serrano do projeto da instituição académica, e não deixa de expressar que a candidatura já teve mais expressão do que hoje, embora refira que ainda não perdeu a esperança. “Contudo vejo as coisas muito paradas, vamos lá ver…”, deixa no ar. O Valor Local contactou João Serrano que preferiu não se debruçar sobre os acontecimentos que motivaram a sua saída do projeto do IPS. Não deixou de criticar a ERT por “surripiar” o projeto, falando ainda em motivos políticos detrás do seu afastamento do instituto politécnico.
página seguinte
Portugal é um dos países com um maior número de bens inscritos como património material da Unesco, e parece querer seguir o mesmo caminho na categoria de bens consagrados como Património Cultural e Imaterial da Humanidade. Um pouco pelo país abundam diferentes candidaturas e a região não foge à regra. “Cantar e Pintar dos Reis”; “Fandango”; “Falcoaria” e “Cultura Avieira” desejam juntar-se como bens da Unesco ao cante alentejano, à dieta mediterrânica, ao fado e ao chocalho.
Sílvia Agostinho
29-09-2016 às 12:54
Candidatura da Cultura Avieira tenta colar cacos depois dos reveses
A candidatura avieira a património nacional surgiu em 2005, e de lá para cá sofreu diversas reviravoltas. Pelo meio, surgiu também a ideia de ser candidatada a património da Unesco mas pouco se tem sabido deste processo. Enquadrada no Instituto Politécnico de Santarém, viu sair nos últimos tempos um dos principais rostos do projeto que liderou durante vários anos as duas candidaturas, João Serrano, que entretanto decidiu abraçar a mesma causa mas no âmbito da Confraria do Tejo. O estudioso que também teceu duras críticas à Entidade Regional de Turismo do Alentejo e Ribatejo, tendo em conta que “a dada altura quis à viva força ficar com a candidatura e açambarcar o protagonismo”. João Serrano comparou mesmo, em declarações ao nosso jornal, em agosto de 2015, a atitude da ERT “a um elefante numa loja de vidros”. Ouvido pela nossa reportagem para este trabalho, o presidente da ERT, Ceia da Silva, tenta desmistificar essa ideia: “Nunca tentámos açambarcar a candidatura, mas apenas disponibilizar a nossa ajuda, até porque em termos de apresentação à Unesco, tudo ainda estava e continua a estar no seu início”.
Lurdes Véstia, do Instituto Politécnico de Santarém, refere que chegados a 2016, e depois de muito caminho percorrido, nesta altura a candidatura a património nacional apenas inclui a bateira, o barco dos avieiros, por ser “o único elemento aglutinador que pode ser incluído como tal, por ainda se manter vivo entre as populações, porque ainda é construído”. Foi escolhida a aldeia das Caneiras, Santarém, e depois de um estudo feito no terreno concebeu-se um “Plano de Salvaguarda das Artes e Saberes da Construção e Uso da Bateira Avieira no Rio Tejo nas Caneiras Santarém” no final de 2015. Depois desta fase, o Instituto Politécnico tem de manter viva esta tradição durante um prazo de avaliação de 10 anos, “através da divulgação nas escolas, mas também através da promoção de formação profissional na componente da construção da bateira”. Segundo Lurdes Véstia, “a candidatura está comprometida em aplicar no terreno o trabalho necessário, para que não aconteça o mesmo que sucedeu com a candidatura do gótico de Santarém em que nada se fez e acabou por morrer, porque o caderno de encargos, nestas coisas, tem de ser cumprido”.
Paralelamente, decorre a candidatura avieira a património da Unesco neste momento nas mãos da ERT, “embora o proponente seja o Instituto Politécnico de Santarém, e é a instituição que aparece sempre nesta linha da frente”, refere Lurdes Véstia. Para a investigadora, a assunção desta candidatura pela entidade “é natural”, e sobre o mau estar que terá provocado junto de João Serrano, admite que o mesmo possivelmente “vê inimigos onde eles não existem”. E saúda o que considera ser uma outra abertura por parte de Ceia da Silva, em relação aos seus antecessores na estrutura do Turismo – “Um homem de terreno que veio várias vezes ver a aldeia, que se interessou imenso pelo projeto, e que se reuniu por diversas ocasiões com responsáveis do Politécnico. Sempre se mostrou interessado em ajudar a candidatura, e não a ficar com ela”.
No âmbito do projeto turístico que envolve o património avieiro, uma equipa contratada pela ERT está também a planificar um projeto de marketing para venda deste produto, “como já o fizeram para o cante e para o chocalho”. “Segundo o que me explicaram a ideia é trazer o turista às nossas aldeias e depois partir com eles para o Alentejo onde vão conhecer o cante, e outras tradições”.
Para a história desta candidatura, ficam os diversos projetos turísticos que ao longo dos anos foram falados, mas que acabaram por ficar pulverizados no mar das boas intenções. “Inclusivamente houve um empresário que se mexeu imenso para construir um hotel palafítico no Escaroupim mas foi sempre barrado, porque a Câmara nunca quis ajudar. Sei que ele penou horas e horas nas repartições”. “Houve dificuldades impostas pelas autarquias. Os planos de pormenor esbarravam nas limitações ecológicas inerentes, porque ficavam dentro de zonas ribeirinhas. Tudo isto cansou muito as pessoas”. A CCDR de Lisboa foi um dos principais travões, “onde era impossível negociar, pois nunca deixaram que nada andasse para a frente”.
O projeto agora em desenvolvimento pela empresa contratada pela ERT não tem o mesmo grau de ambição, até porque os empresários que alguma vez sonharam com projetos à beira rio foram progressivamente desistindo, “apenas houve um de turismo rural que consegui vingar na Golegã”.
Quanto ao dossier técnico a apresentar à Unesco, “será efetuado por uma nova equipa também contratada pela ERT, e que absorverá todo o trabalho que foi feito até à data”. A documentação será entregue até ao final do ano.
Lurdes Véstia afirma-se “satisfeita” com o curso do projeto, embora reconheça que o mesmo “esteja a assumir uma vertente mais comercial, mas possivelmente a vertente cultural dá menos dinheiro, e as coisas passam um pouco pela vertente financeira”. “Mas se as coisas tiverem de ser assim, antes desta forma do que nunca mais”, desabafa.
Ouvido pela nossa reportagem, João Lobo, um dos avieiros do Tejo, lamenta a saída de João Serrano do projeto da instituição académica, e não deixa de expressar que a candidatura já teve mais expressão do que hoje, embora refira que ainda não perdeu a esperança. “Contudo vejo as coisas muito paradas, vamos lá ver…”, deixa no ar. O Valor Local contactou João Serrano que preferiu não se debruçar sobre os acontecimentos que motivaram a sua saída do projeto do IPS. Não deixou de criticar a ERT por “surripiar” o projeto, falando ainda em motivos políticos detrás do seu afastamento do instituto politécnico.
página seguinte
Comentários
Ainda não há novidades ...