Histórias de discotecas que marcaram o Ribatejo... o Fim do Glamour
Foram nos anos 80 e 90 marcos da vida noturna na região, e possuíam uma importância na vida económica local que deixaram de ter. Fomos saber o que é feito de quem esteve durante anos ligado a um negócio que já deu frutos, mas que presentemente entrou numa fase de decadência, o do mundo das discotecas. O fim do glamour contado por quem viveu o período de ouro das discotecas.
Sílvia Agostinho
19-09-2015 às 22:22
Considera-se um notívago por excelência, e foi por isso que ainda muito jovem, com pouco mais de 20 anos, decidiu lançar-se no mundo das discotecas, no ano de 1984. Foi durante 15 anos, proprietário, primeiro numa sociedade com mais amigos, depois sozinho, de uma das discotecas mais icónicas do Ribatejo – a Lips no Cartaxo. Na gerência do estabelecimento, procurou acima de tudo “romper com as modas e atrair o que intitula de maioria silenciosa”, no fundo “jovens adultos que gostam de se divertir e que não vão nas ditas modas”. Com isso consolidou uma clientela exigente, na qual também se contavam muitos pais que iam deixar as filhas à discoteca, tranquilos, pois sabiam que estavam em boas mãos. Destes momentos, José Reis recorda-se bem, e não deixa de transparecer alguma emoção. Eram os bons tempos da Lips.
O empresário, hoje à frente de uma imobiliária, recorda-se como surgiu o click para abrir uma discoteca – “Um dia estava na Horta da Fonte, e lembro-me que não fiquei lá muito satisfeito com o tratamento. No verão só abriam as portas do pátio quase na hora do fecho, quando estávamos cheios de calor há não sei quantas horas. Não achei correto, e pensei para comigo que um dia haveria de abrir uma casa daquelas, e assim foi, porque tinha gosto pela noite”.
Quando abriu, a Lips teve direito a duas inaugurações, “porque o espaço ainda era pequeno, e não cabiam todos os amigos que foram convidados”. O porteiro era o Roque, campeão de culturismo, e o DJ era o Pechau, uma espécie de lenda da noite cartaxeira, e considerado um dos melhores do país, nos anos 80 e 90, que faleceu recentemente. “Quase que fui pai dele porque cheguei a guardar dinheiro para ele comprar roupa”.
No segredo da boa gestão da discoteca durante vários anos, conta que esteve o facto de ao mesmo tempo não ter abdicado do seu principal emprego, assim como o sócio, pois tornava-se difícil “tirar ordenado naqueles primeiros tempos”. E dessa forma também foi possível investir na discoteca, com obras de ampliação, e também “graças a muita gente que nos ajudou”. “Não esqueço que em todas as obras me fiaram ao todo 1800 contos”.
Mas também a aposta musical na altura se concretizou como arrojada, pois até cantores de fado passaram pela Lips. José Reis tem uma explicação para a forma de estar que adotou na noite – “Quando abri a Lips não foi para destruir a Horta da Fonte, porque não eram do mesmo tamanho, e quis sempre marcar pela diferença. Quando os outros metiam ferro, eu punha madeira; quando metiam madeira, colocávamos plástico; nunca enveredei pelos mesmos caminhos, pois quando era moda os martelinhos, optei por não o fazer; e assim por diante”.
Chegados a este ponto, não tem dúvidas em atirar – “Na minha opinião, há três ou quatro segredos que fazem com que a noite ande ou não ande. Primeiro agradar à maioria silenciosa, pessoas que trabalham mas que não têm tempo para ouvir a música da moda, embora tenham umas noções, mas essencialmente não são notívagas”. E acrescenta – “Acompanhei todas as aberturas de discotecas em Lisboa sempre com os mesmos clientes, pois as pessoas são de modas, e rapidamente frequentam uma casa para passarem para outra, e não era isso que eu queria que acontecesse na minha casa”. “Nunca quis uma casa da moda, que tem durante seis meses 1200 clientes, mas perde-os rapidamente sempre que abre um novo espaço”.
Com uma maneira diferente de ver a noite, José Reis lembra-se que foi intitulado de “saloio” por comparação com a Horta da Fonte, tida por si como uma discoteca da moda. “No início muitos tentaram diminuir-nos porque ainda éramos cachopos”. Mas tal não foi impeditivo para o sucesso da Lips, com “muitos clientes vindos de Alenquer, Alverca, Carregado, Santarém. Gente muito engraçada”, lembra-se. “A nossa nata vinha de fora, enquanto a Horta da Fonte era considerada de elites, mas tesas”, não tem dúvidas em considerar. José Reis vai mais longe – “Havia um certo bluff, porque muitos dos clientes da Horta gostavam muito de beber à pala de alguém. Na minha casa, sempre tentei controlar isso. Não deixava o barman oferecer bebidas ao desbarato, por exemplo”.
“Na base do que consegui está o que considero ter sido o facto de nunca ter enganado um cliente, nunca vendi sumos manhosos, nem whisky à porta. As pessoas tinham de ter respeito para vir para a Lips, nem os meus amigos se aproveitavam desse facto para me usurparem”. Confiança era palavra de ordem – “Muitos pais deixavam as suas filhas na discoteca porque confiavam em nós. As miúdas entravam, e depois às quatro da manhã, os pais chegavam e pediam para nós as chamarmos para regressarem. Isto era incrível, muitas destas moças hoje são mulheres. No fundo, a discoteca era quase uma extensão da família”. Ainda neste particular, José Reis sugere – “Não quer dizer que não dessem um beijinho aqui ou ali, mas se reparássemos em algum excesso, tomávamos providências, porque os pais confiavam em nós.”. Este era também o segredo do sucesso da Lips – “Autenticamente, e foi por isso que nós fizemos daquela discoteca aquilo que ela foi!”, sintetiza. “Criámos o mito- “É possível divertirmo-nos sem prejudicar ninguém”. Hoje em dia acredita que o facto de muitas casas abrirem a pista com música cada vez mais tarde também está na base do insucesso – “À uma da manhã eu mandava o disc-jockey por musica, independentemente de quantas pessoas estavam na casa”.
Os melhores anos da Lips foram já na segunda metade da década de 90, uma espécie de período áureo, de novo com o DJ Pechau, mas foi precisamente nesse auge que José Reis tomou a decisão de abandonar o negócio da noite, pois à medida que o Cartaxo se tornava uma meca da diversão noturna, a insegurança também crescia a olhos vistos, à mistura com muita corrupção policial. “Fui perseguido pela polícia muitas vezes porque não atendia determinados pedidos como comida e bebida sempre que queriam, e não quando eu entendia. Isto é a pura das verdades”. Mas nos últimos anos da sua gerência, recorda-se de ter uma “equipa fantástica, que funcionava como uma família. Lembro-me de um porteiro muito bom que tivemos, o Fernando Ramos, antigo presidente da junta de Vale da Pinta, que mantinha muito respeito”.
“O cansaço levou-me a abandonar a Lips. Ainda demorei um ano a tentar arranjar um comprador. A discoteca teve outras gerências mas sem muito sucesso”. A discoteca fechou entretanto, mas José Reis não se comove inteiramente com o facto até porque a vida traria outros factos bem menos agradáveis como a morte de um filho.
Antes de ter abandonado a noite, ainda falou com o presidente da Câmara, na altura, Conde Rodrigues sobre as suas preocupações com a insegurança que se vivia no Cartaxo. No seu entender era necessário reforçar com uma espécie de polícia municipal a noite cartaxeira, paga pelas discotecas, pois milhares de pessoas frequentavam aqueles espaços no concelho. “Circulavam no Cartaxo naquela altura mais de quatro mil pessoas”, e estava a tornar-se insustentável o clima de algum medo que se começava a instalar. “A ideia era criar uma maximização de reforços para as discotecas. E lembro-me de um episódio que me marcou que meteu ameaça de tiros, e ainda alguns tiros para o ar. O arruaceiro às tantas escapou-se, fugiu para casa, e quando fiz queixa à GNR ignoraram-me, e esse militar não era apenas um soldado raso”, faz questão de salientar.
Lamentavelmente, na sua opinião, a Câmara, na altura, “não quis enfrentar a noite com os empresários”. “Ninguém quis saber do que disse, saí da discoteca com 1800 clientes, atrás de mim foi a discoteca Charrete e outras”. Contudo, confessa que chegou equacionar voltar ao negócio da noite, mas para já fecha a porta. “Pessoas do Cartaxo já me incentivaram muitíssimo para regressar.” E não deixa de enviar uma última acha – “A noite cartaxeira era algo muito bom para o Cartaxo, depois tornou-se ridícula por força da insegurança, e de algumas forças de segurança que andaram a brincar connosco, e quando se recorreu às entidades políticas estas não souberam estimar o que havia de bom, não acarinharam os empresários”.
Foram nos anos 80 e 90 marcos da vida noturna na região, e possuíam uma importância na vida económica local que deixaram de ter. Fomos saber o que é feito de quem esteve durante anos ligado a um negócio que já deu frutos, mas que presentemente entrou numa fase de decadência, o do mundo das discotecas. O fim do glamour contado por quem viveu o período de ouro das discotecas.
Sílvia Agostinho
19-09-2015 às 22:22
Considera-se um notívago por excelência, e foi por isso que ainda muito jovem, com pouco mais de 20 anos, decidiu lançar-se no mundo das discotecas, no ano de 1984. Foi durante 15 anos, proprietário, primeiro numa sociedade com mais amigos, depois sozinho, de uma das discotecas mais icónicas do Ribatejo – a Lips no Cartaxo. Na gerência do estabelecimento, procurou acima de tudo “romper com as modas e atrair o que intitula de maioria silenciosa”, no fundo “jovens adultos que gostam de se divertir e que não vão nas ditas modas”. Com isso consolidou uma clientela exigente, na qual também se contavam muitos pais que iam deixar as filhas à discoteca, tranquilos, pois sabiam que estavam em boas mãos. Destes momentos, José Reis recorda-se bem, e não deixa de transparecer alguma emoção. Eram os bons tempos da Lips.
O empresário, hoje à frente de uma imobiliária, recorda-se como surgiu o click para abrir uma discoteca – “Um dia estava na Horta da Fonte, e lembro-me que não fiquei lá muito satisfeito com o tratamento. No verão só abriam as portas do pátio quase na hora do fecho, quando estávamos cheios de calor há não sei quantas horas. Não achei correto, e pensei para comigo que um dia haveria de abrir uma casa daquelas, e assim foi, porque tinha gosto pela noite”.
Quando abriu, a Lips teve direito a duas inaugurações, “porque o espaço ainda era pequeno, e não cabiam todos os amigos que foram convidados”. O porteiro era o Roque, campeão de culturismo, e o DJ era o Pechau, uma espécie de lenda da noite cartaxeira, e considerado um dos melhores do país, nos anos 80 e 90, que faleceu recentemente. “Quase que fui pai dele porque cheguei a guardar dinheiro para ele comprar roupa”.
No segredo da boa gestão da discoteca durante vários anos, conta que esteve o facto de ao mesmo tempo não ter abdicado do seu principal emprego, assim como o sócio, pois tornava-se difícil “tirar ordenado naqueles primeiros tempos”. E dessa forma também foi possível investir na discoteca, com obras de ampliação, e também “graças a muita gente que nos ajudou”. “Não esqueço que em todas as obras me fiaram ao todo 1800 contos”.
Mas também a aposta musical na altura se concretizou como arrojada, pois até cantores de fado passaram pela Lips. José Reis tem uma explicação para a forma de estar que adotou na noite – “Quando abri a Lips não foi para destruir a Horta da Fonte, porque não eram do mesmo tamanho, e quis sempre marcar pela diferença. Quando os outros metiam ferro, eu punha madeira; quando metiam madeira, colocávamos plástico; nunca enveredei pelos mesmos caminhos, pois quando era moda os martelinhos, optei por não o fazer; e assim por diante”.
Chegados a este ponto, não tem dúvidas em atirar – “Na minha opinião, há três ou quatro segredos que fazem com que a noite ande ou não ande. Primeiro agradar à maioria silenciosa, pessoas que trabalham mas que não têm tempo para ouvir a música da moda, embora tenham umas noções, mas essencialmente não são notívagas”. E acrescenta – “Acompanhei todas as aberturas de discotecas em Lisboa sempre com os mesmos clientes, pois as pessoas são de modas, e rapidamente frequentam uma casa para passarem para outra, e não era isso que eu queria que acontecesse na minha casa”. “Nunca quis uma casa da moda, que tem durante seis meses 1200 clientes, mas perde-os rapidamente sempre que abre um novo espaço”.
Com uma maneira diferente de ver a noite, José Reis lembra-se que foi intitulado de “saloio” por comparação com a Horta da Fonte, tida por si como uma discoteca da moda. “No início muitos tentaram diminuir-nos porque ainda éramos cachopos”. Mas tal não foi impeditivo para o sucesso da Lips, com “muitos clientes vindos de Alenquer, Alverca, Carregado, Santarém. Gente muito engraçada”, lembra-se. “A nossa nata vinha de fora, enquanto a Horta da Fonte era considerada de elites, mas tesas”, não tem dúvidas em considerar. José Reis vai mais longe – “Havia um certo bluff, porque muitos dos clientes da Horta gostavam muito de beber à pala de alguém. Na minha casa, sempre tentei controlar isso. Não deixava o barman oferecer bebidas ao desbarato, por exemplo”.
“Na base do que consegui está o que considero ter sido o facto de nunca ter enganado um cliente, nunca vendi sumos manhosos, nem whisky à porta. As pessoas tinham de ter respeito para vir para a Lips, nem os meus amigos se aproveitavam desse facto para me usurparem”. Confiança era palavra de ordem – “Muitos pais deixavam as suas filhas na discoteca porque confiavam em nós. As miúdas entravam, e depois às quatro da manhã, os pais chegavam e pediam para nós as chamarmos para regressarem. Isto era incrível, muitas destas moças hoje são mulheres. No fundo, a discoteca era quase uma extensão da família”. Ainda neste particular, José Reis sugere – “Não quer dizer que não dessem um beijinho aqui ou ali, mas se reparássemos em algum excesso, tomávamos providências, porque os pais confiavam em nós.”. Este era também o segredo do sucesso da Lips – “Autenticamente, e foi por isso que nós fizemos daquela discoteca aquilo que ela foi!”, sintetiza. “Criámos o mito- “É possível divertirmo-nos sem prejudicar ninguém”. Hoje em dia acredita que o facto de muitas casas abrirem a pista com música cada vez mais tarde também está na base do insucesso – “À uma da manhã eu mandava o disc-jockey por musica, independentemente de quantas pessoas estavam na casa”.
Os melhores anos da Lips foram já na segunda metade da década de 90, uma espécie de período áureo, de novo com o DJ Pechau, mas foi precisamente nesse auge que José Reis tomou a decisão de abandonar o negócio da noite, pois à medida que o Cartaxo se tornava uma meca da diversão noturna, a insegurança também crescia a olhos vistos, à mistura com muita corrupção policial. “Fui perseguido pela polícia muitas vezes porque não atendia determinados pedidos como comida e bebida sempre que queriam, e não quando eu entendia. Isto é a pura das verdades”. Mas nos últimos anos da sua gerência, recorda-se de ter uma “equipa fantástica, que funcionava como uma família. Lembro-me de um porteiro muito bom que tivemos, o Fernando Ramos, antigo presidente da junta de Vale da Pinta, que mantinha muito respeito”.
“O cansaço levou-me a abandonar a Lips. Ainda demorei um ano a tentar arranjar um comprador. A discoteca teve outras gerências mas sem muito sucesso”. A discoteca fechou entretanto, mas José Reis não se comove inteiramente com o facto até porque a vida traria outros factos bem menos agradáveis como a morte de um filho.
Antes de ter abandonado a noite, ainda falou com o presidente da Câmara, na altura, Conde Rodrigues sobre as suas preocupações com a insegurança que se vivia no Cartaxo. No seu entender era necessário reforçar com uma espécie de polícia municipal a noite cartaxeira, paga pelas discotecas, pois milhares de pessoas frequentavam aqueles espaços no concelho. “Circulavam no Cartaxo naquela altura mais de quatro mil pessoas”, e estava a tornar-se insustentável o clima de algum medo que se começava a instalar. “A ideia era criar uma maximização de reforços para as discotecas. E lembro-me de um episódio que me marcou que meteu ameaça de tiros, e ainda alguns tiros para o ar. O arruaceiro às tantas escapou-se, fugiu para casa, e quando fiz queixa à GNR ignoraram-me, e esse militar não era apenas um soldado raso”, faz questão de salientar.
Lamentavelmente, na sua opinião, a Câmara, na altura, “não quis enfrentar a noite com os empresários”. “Ninguém quis saber do que disse, saí da discoteca com 1800 clientes, atrás de mim foi a discoteca Charrete e outras”. Contudo, confessa que chegou equacionar voltar ao negócio da noite, mas para já fecha a porta. “Pessoas do Cartaxo já me incentivaram muitíssimo para regressar.” E não deixa de enviar uma última acha – “A noite cartaxeira era algo muito bom para o Cartaxo, depois tornou-se ridícula por força da insegurança, e de algumas forças de segurança que andaram a brincar connosco, e quando se recorreu às entidades políticas estas não souberam estimar o que havia de bom, não acarinharam os empresários”.

O dia em que a Samantha Fox veio a Azambuja
“Aqui fizeram-se muitos casamentos”, é assim que em parte João Cunha descreve um pouco também do espírito da mítica discoteca de Azambuja, Ponto e Vírgula, que entretanto regressou. O seu primeiro proprietário, que durante 20 anos não pisou o espaço, está disposto a fazer deste um novo ponto de encontro e de convívio na região. João Cunha apagou o ponto final, e está cheio de garra para arrancar novamente com a Ponto e Vírgula, que começou em 1983 apenas como pub.
“A discoteca teve momentos menos bons, sei que nos últimos anos houve várias transformações. No tempo em que geria a casa tentámos sempre ir de encontro ao que o público gostava, e fazer o nosso trajeto, no fundo ir de encontro às modas”.
A evolução para discoteca deu-se na década de 90. As matinés eram as rainhas do espaço e marcaram gerações de azambujenses e não só. “Nessa altura mexemos um bocadinho com o negócio da noite, as nossas sextas e sábados contavam com lotação esgotada, e foi assim que também nos tornámos um pouco icónicos na região a par da Green Hill, na Foz do Arelho, e da Golden Stone”.
Azambuja estava pois na meca da diversão noturna na região, e até uma improvável Samantha Fox veio até ao espaço, ainda a cantora estava no seu auge. “Foi um momento oportuno, porque ela veio a várias discotecas e encaixou na agenda a nossa. Também esteve na Horta da Fonte, no Cartaxo”.
Nesta reabertura 20 anos depois, “regressaram algumas pessoas que na altura eram adolescente e que hoje trazem cá os filhos com as idades que os pais tinham quando frequentavam o espaço, e isso é giro.”
João Cunha também concorda quase de imediato que a noite hoje é muito diferente da noite nos anos 80 e 90. “Hoje as coisas estão mais perigosas, na minha opinião, por isso também controlamos a entrada de algumas pessoas, isto sem querer criar rótulos”. O empresário vai também tentar adaptar-se da melhor forma à nova lei do álcool que restringe os consumos a menor de 16 anos.
A discoteca vai entretanto sofrer obras de remodelação, mas João Cunha está consciente da concorrência cerrada, especialmente com o facto de abundarem “cafés com karaoke, que tentam imitar ao máximo o ambiente das discotecas, porque é fácil arrastar mesas para o lado. Com certeza que o sol quando nasce é para todos, mas alguns para terem tudo a funcionar devidamente pagam as licenças todas que são necessárias, enquanto outros se vão aproveitando das circunstâncias”.
Quanto ao declínio nos últimos anos deste tipo de espaços, João Cunha que afirma querer “morrer na noite”, salienta sobretudo a concorrência. Sofre-se bastante “os efeitos das modas”. Contudo, “a crise neste contexto também não foi assim tão má, porque se deu uma maior seleção”. Também é da opinião de que “os donos destas casas devem tentar sair o mais possível das modas, de que é exemplo hoje em dia o furor das quizombas. Tentarmos ser mais abrangentes porque há muita música com qualidade”.
“As pessoas de Azambuja também não podem queixar-se constantemente de que nada se passa na terra, está na altura de saírem de casa e procurarem a oferta existente”. Com porta aberta desde há sete meses, reconhece que teve algumas noites fracas, mas o balanço acaba por ser positivo. Sempre com muita gente de fora, mas também de Azambuja, e sobretudo de Aveiras de Cima.
“Aqui fizeram-se muitos casamentos”, é assim que em parte João Cunha descreve um pouco também do espírito da mítica discoteca de Azambuja, Ponto e Vírgula, que entretanto regressou. O seu primeiro proprietário, que durante 20 anos não pisou o espaço, está disposto a fazer deste um novo ponto de encontro e de convívio na região. João Cunha apagou o ponto final, e está cheio de garra para arrancar novamente com a Ponto e Vírgula, que começou em 1983 apenas como pub.
“A discoteca teve momentos menos bons, sei que nos últimos anos houve várias transformações. No tempo em que geria a casa tentámos sempre ir de encontro ao que o público gostava, e fazer o nosso trajeto, no fundo ir de encontro às modas”.
A evolução para discoteca deu-se na década de 90. As matinés eram as rainhas do espaço e marcaram gerações de azambujenses e não só. “Nessa altura mexemos um bocadinho com o negócio da noite, as nossas sextas e sábados contavam com lotação esgotada, e foi assim que também nos tornámos um pouco icónicos na região a par da Green Hill, na Foz do Arelho, e da Golden Stone”.
Azambuja estava pois na meca da diversão noturna na região, e até uma improvável Samantha Fox veio até ao espaço, ainda a cantora estava no seu auge. “Foi um momento oportuno, porque ela veio a várias discotecas e encaixou na agenda a nossa. Também esteve na Horta da Fonte, no Cartaxo”.
Nesta reabertura 20 anos depois, “regressaram algumas pessoas que na altura eram adolescente e que hoje trazem cá os filhos com as idades que os pais tinham quando frequentavam o espaço, e isso é giro.”
João Cunha também concorda quase de imediato que a noite hoje é muito diferente da noite nos anos 80 e 90. “Hoje as coisas estão mais perigosas, na minha opinião, por isso também controlamos a entrada de algumas pessoas, isto sem querer criar rótulos”. O empresário vai também tentar adaptar-se da melhor forma à nova lei do álcool que restringe os consumos a menor de 16 anos.
A discoteca vai entretanto sofrer obras de remodelação, mas João Cunha está consciente da concorrência cerrada, especialmente com o facto de abundarem “cafés com karaoke, que tentam imitar ao máximo o ambiente das discotecas, porque é fácil arrastar mesas para o lado. Com certeza que o sol quando nasce é para todos, mas alguns para terem tudo a funcionar devidamente pagam as licenças todas que são necessárias, enquanto outros se vão aproveitando das circunstâncias”.
Quanto ao declínio nos últimos anos deste tipo de espaços, João Cunha que afirma querer “morrer na noite”, salienta sobretudo a concorrência. Sofre-se bastante “os efeitos das modas”. Contudo, “a crise neste contexto também não foi assim tão má, porque se deu uma maior seleção”. Também é da opinião de que “os donos destas casas devem tentar sair o mais possível das modas, de que é exemplo hoje em dia o furor das quizombas. Tentarmos ser mais abrangentes porque há muita música com qualidade”.
“As pessoas de Azambuja também não podem queixar-se constantemente de que nada se passa na terra, está na altura de saírem de casa e procurarem a oferta existente”. Com porta aberta desde há sete meses, reconhece que teve algumas noites fracas, mas o balanço acaba por ser positivo. Sempre com muita gente de fora, mas também de Azambuja, e sobretudo de Aveiras de Cima.

Mirage estimulava uma relação de amizade com os clientes
A Mirage em Marinhais, Salvaterra de Magos, foi também um clássico dos anos 80 na região. A casa deixou marca e saudades na vila ribatejana, e também ela nasceu de um sonho e do bichinho da noite dos seus proprietários, dois irmãos. O Valor Local falou com um deles, António José Neves, hoje arredado do mundo das discotecas.
Foi há 30 anos que a “brincadeira” começou, depois de os dois irmãos terem experimentado algumas incursões em festas e convívios na localidade. A música psicadélica e os saudosos gira-discos davam o tom num barracão com luzes improvisadas. Tinha na altura cerca de 15, 16 anos. Fundou a discoteca com 20 anos. O espaço da Mirage foi construído de raiz por ambos, Alfredo e António José. Na altura teve de pedir um empréstimo, o pai também ajudou, mas rapidamente “o investimento foi rentabilizado, algo que seria impossível hoje em dia.”
Os primeiros tempos da discoteca foram um sucesso, até porque se tratava de uma novidade. Muita gente de fora vinha a Marinhais, e a rivalidade com os outros espaços do concelho e da região era “saudável”. “Ainda hoje vou à Horta da Fonte onde converso com o Toni. Mantenho também uma boa relação com o proprietário de outro espaço que foi importante a Pink Panther de Coruche”.
António José Neves dá uma achega diferente para o fato de a noite ter caído, no sentido comercial de que aqui falamos – “Algumas casas começam por selecionar demasiado os clientes à entrada, no estrangeiro não vimos isso, pois há pessoas de todos os tipos nas discotecas. Inicialmente também foi isso que quisemos fazer na Mirage, e assim se promovia também um maior espírito de convívio e amizade entre os frequentadores. Não havia tantos grupinhos”.
O empresário não vê grande sentido no facto de as discotecas de província quererem continuar a apostar na dita “gente bonita”, de um estrato social mais alto, em contraciclo com o que se passa lá fora. “Por isso é que as casas fecham”. Por outro lado, os jovens “têm grande apetência pelas discotecas de Lisboa, o que complica ainda mais”.
Torna-se mais difícil gerir este tipo de casas no nosso país do que no estrangeiro, essencialmente porque “cá o público vai por ondas, até me admiro de a quizomba já estar a durar há tanto tempo”. Sendo assim “torna-se ingrato para quem quer fazer algo de novo”.
As melhores recordações que guarda da Mirage prendem-se também com o espírito de amizade com os clientes – “Depois da hora de fecho da discoteca ficávamos na conversa e na galhofa com eles, que não acontece hoje. Antigamente conseguíamos reunir um grupo de 20 ou 30 pessoas que depois do encerramento ia para a Barragem de Magos ou para o pão quente”.
Naquela altura, o acesso às novas músicas não estava à distância de um clique, e o proprietário da Mirage lembra-se que quando ia a Lisboa a duas ou três lojas que existiam na altura, a da Portela ou a Bimotor, e já não conseguia arranjar os melhores discos, que eram encaminhados para os donos de discoteca de Lisboa. “Para nós empurravam a música que não era interessante”. Como via essa possibilidade cortada, António José Neves ia com frequência a Alemanha e a Espanha buscar as novidades em inglês. “Cheguei a enviar disc-jockeys a Inglaterra para irem buscar música”. Mas nem sempre as novidades trazidas agradavam a todos: “Púnhamos a tocar essas músicas mas as pessoas inicialmente não aderiam, só passados quatro ou cinco meses essas canções começavam a fazer furor”. Eddy Grant foi uma novidade estreada por si na discoteca.
A Mirage começou a decair há cerca de 15 anos, e António José Neves optou por fechar. Ainda teve outros espaços, mas “só por manter a porta aberta tinha despesas fixas de 600 euros por dia”, e por isso entretanto desistiu. Hoje olha para a decadência da noite com preocupação – “Porque sair à noite, espairecermos, divertirmo-nos faz-nos bem. Um dia vamos pagar essa fatura se as pessoas continuarem a ficar dentro de casa fechadas. Nos países nórdicos vão todos para a rua, você facilmente constata que os jardins, e as esplanadas estão cheias, enquanto no nosso país e na nossa região isso não acontece”.
A Mirage em Marinhais, Salvaterra de Magos, foi também um clássico dos anos 80 na região. A casa deixou marca e saudades na vila ribatejana, e também ela nasceu de um sonho e do bichinho da noite dos seus proprietários, dois irmãos. O Valor Local falou com um deles, António José Neves, hoje arredado do mundo das discotecas.
Foi há 30 anos que a “brincadeira” começou, depois de os dois irmãos terem experimentado algumas incursões em festas e convívios na localidade. A música psicadélica e os saudosos gira-discos davam o tom num barracão com luzes improvisadas. Tinha na altura cerca de 15, 16 anos. Fundou a discoteca com 20 anos. O espaço da Mirage foi construído de raiz por ambos, Alfredo e António José. Na altura teve de pedir um empréstimo, o pai também ajudou, mas rapidamente “o investimento foi rentabilizado, algo que seria impossível hoje em dia.”
Os primeiros tempos da discoteca foram um sucesso, até porque se tratava de uma novidade. Muita gente de fora vinha a Marinhais, e a rivalidade com os outros espaços do concelho e da região era “saudável”. “Ainda hoje vou à Horta da Fonte onde converso com o Toni. Mantenho também uma boa relação com o proprietário de outro espaço que foi importante a Pink Panther de Coruche”.
António José Neves dá uma achega diferente para o fato de a noite ter caído, no sentido comercial de que aqui falamos – “Algumas casas começam por selecionar demasiado os clientes à entrada, no estrangeiro não vimos isso, pois há pessoas de todos os tipos nas discotecas. Inicialmente também foi isso que quisemos fazer na Mirage, e assim se promovia também um maior espírito de convívio e amizade entre os frequentadores. Não havia tantos grupinhos”.
O empresário não vê grande sentido no facto de as discotecas de província quererem continuar a apostar na dita “gente bonita”, de um estrato social mais alto, em contraciclo com o que se passa lá fora. “Por isso é que as casas fecham”. Por outro lado, os jovens “têm grande apetência pelas discotecas de Lisboa, o que complica ainda mais”.
Torna-se mais difícil gerir este tipo de casas no nosso país do que no estrangeiro, essencialmente porque “cá o público vai por ondas, até me admiro de a quizomba já estar a durar há tanto tempo”. Sendo assim “torna-se ingrato para quem quer fazer algo de novo”.
As melhores recordações que guarda da Mirage prendem-se também com o espírito de amizade com os clientes – “Depois da hora de fecho da discoteca ficávamos na conversa e na galhofa com eles, que não acontece hoje. Antigamente conseguíamos reunir um grupo de 20 ou 30 pessoas que depois do encerramento ia para a Barragem de Magos ou para o pão quente”.
Naquela altura, o acesso às novas músicas não estava à distância de um clique, e o proprietário da Mirage lembra-se que quando ia a Lisboa a duas ou três lojas que existiam na altura, a da Portela ou a Bimotor, e já não conseguia arranjar os melhores discos, que eram encaminhados para os donos de discoteca de Lisboa. “Para nós empurravam a música que não era interessante”. Como via essa possibilidade cortada, António José Neves ia com frequência a Alemanha e a Espanha buscar as novidades em inglês. “Cheguei a enviar disc-jockeys a Inglaterra para irem buscar música”. Mas nem sempre as novidades trazidas agradavam a todos: “Púnhamos a tocar essas músicas mas as pessoas inicialmente não aderiam, só passados quatro ou cinco meses essas canções começavam a fazer furor”. Eddy Grant foi uma novidade estreada por si na discoteca.
A Mirage começou a decair há cerca de 15 anos, e António José Neves optou por fechar. Ainda teve outros espaços, mas “só por manter a porta aberta tinha despesas fixas de 600 euros por dia”, e por isso entretanto desistiu. Hoje olha para a decadência da noite com preocupação – “Porque sair à noite, espairecermos, divertirmo-nos faz-nos bem. Um dia vamos pagar essa fatura se as pessoas continuarem a ficar dentro de casa fechadas. Nos países nórdicos vão todos para a rua, você facilmente constata que os jardins, e as esplanadas estão cheias, enquanto no nosso país e na nossa região isso não acontece”.

A Golden Stone foi demolida e pouca gente deu por isso
Entrou pela primeira vez na Golden Stone, uma das mais inesquecíveis discotecas da região e de Vila Franca de Xira, pela mão da mãe com 10 anos. A meio da década de 90, viria a ser um dos disc-jockeys daquela discoteca que já existia desde os primeiros anos da década de 80. João Sabino, com 37 anos hoje em dia, lembra-se que a discoteca sofreu muitos altos e baixos. Em 1998, “fui convidado a sair”. São muitas as memórias desta casa e da importância que significou na noite vilafranquense e não só. Os proprietários do espaço faleceram ambos nos últimos anos.
O antigo DJ da Golden recorda-se que o boom das discotecas deu-se em finais da década de 80, inícios dos anos 90, e nessa altura a discoteca do Monte Gordo (zona de Vila Franca onde se encontrava localizada) rivalizava já com outras da cidade, a Dó, Ré, Mi e a Salsaparrilha. João Sabino que exerce até aos dias de hoje o seu trabalho como DJ tem por isso uma visão privilegiada sobre a evolução da noite, dado que começou, ainda, muito jovem – “A faixa etária dos frequentadores da noite, nessa altura, era um pouco superior à de hoje”. E também ele gostava mais dessa altura e da forma como a noite era vivida, especialmente se nos cingirmos à realidade de Vila Franca – “Preferia, completamente, voltar 20 anos atrás”, desabafa, até porque “havia mais gente em Vila Franca e mais espaços. Principalmente vinha muita gente de fora conhecer a cidade porque sabia-se que a noite aqui era boa”. A animação era efervescente com bares, discotecas e até pequenos espetáculos de rua que entretanto a cidade perdeu.
Com uma vista soberba sobre a cidade, o Tejo e a Lezíria, a que se juntaram várias obras de ampliação e remodelação, a discoteca não conseguiu evitar, contudo, o facto de por, diversas ocasiões, ter mudado de gerência, e ter enfrentado períodos menos áureos. Em 2004, “chegou mesmo a mudar para Xira Club”, refere Sabino. “A Golden enfrentou muita concorrência, derivado também ao facto de os jovens preferirem ir para Lisboa; ou outros locais que de repente ficavam na moda. Lembro-me de uma discoteca em Alcochete por exemplo”. Mas sobretudo coloca o enfoque no facto de “ter tido várias más gerências”.
Tendo já passado por variados espaços noturnos, o DJ tem dificuldades em conseguir arranjar uma justificação para a circunstância de tão depressa uma casa estar no topo das preferências como tão depressa cair em desgraça. “Temos casas dotadas de uma ótima decoração, com ótimo serviço, e onde existe um grande cuidado com o DJ residente, normalmente alguém que consegue ler bem a pista, e sempre com música atual. E hoje em dia, determinada malta que frequenta as discotecas não liga muito a isso, prefere ir atrás de um determinado estilo de música e não dá valor à boa organização. Por vezes o que acontece, é que preferem sítios onde podem entrar sem consumir”.
Voltando à Golden Stone, confessa que chegou a ser contactado no início desta década para em conjunto com outros interessados pegar novamente no espaço, mas acabou por desistir. “Em 2014, fui surpreendido com a informação de que a discoteca havia sido demolida”, devido ao facto de estar em zona de aluimento de terras, como aliás, os restantes edifícios do Monte Gordo.
“Fiquei mesmo chocado com a demolição. Só acreditei quando fui lá e coloquei o meu carro mesmo no meio daquele largo, olhei à minha volta e não vi nada”. A nostalgia tomou conta de si, bem como a sensação de frustração pelo facto de a Golden ter ficado perdida para sempre, “sem que ninguém conseguisse fazer daquele espaço o que ele merecia enquanto casa noturna”. “Podia voltar a ser uma referência, porque a Golden era conhecida como o satélite da noite na região. Os jovens chegavam a subir a pé aquela encosta de noite, e acredito que, hoje, podia ser mais do que uma simples discoteca, talvez um espaço multifunções”.
Ainda sobre a famosa questão do aluimento de terras, não consegue deixar de contar o episódio de quando em 1997, a “dona Helena, proprietária da discoteca, começou a mandar vir com os homens das máquinas que andavam a fazer as obras da urbanização do Monte Gordo, porque se estava a começar a construir os prédios e ela alertou que, para além, de lhe irem destruir a estrada e a discoteca, o subsolo era oco, porque tinha existido naquele lugar uma pedreira. Lembro-me tão bem deste episódio como se fosse ontem”.
Outro fenómeno que no seu entender tem feito mossa nas discotecas, prende-se com o facto de os bares hoje em dia poderem estar abertos até mais tarde, com música posta por um DJ, em que as condições da casa não estão vocacionadas para discoteca, mas onde as bebidas são mais baratas, e “as pessoas evitam seguir para as discotecas, onde os donos têm toda uma série de encargos que os bares não possuem”.
Entrou pela primeira vez na Golden Stone, uma das mais inesquecíveis discotecas da região e de Vila Franca de Xira, pela mão da mãe com 10 anos. A meio da década de 90, viria a ser um dos disc-jockeys daquela discoteca que já existia desde os primeiros anos da década de 80. João Sabino, com 37 anos hoje em dia, lembra-se que a discoteca sofreu muitos altos e baixos. Em 1998, “fui convidado a sair”. São muitas as memórias desta casa e da importância que significou na noite vilafranquense e não só. Os proprietários do espaço faleceram ambos nos últimos anos.
O antigo DJ da Golden recorda-se que o boom das discotecas deu-se em finais da década de 80, inícios dos anos 90, e nessa altura a discoteca do Monte Gordo (zona de Vila Franca onde se encontrava localizada) rivalizava já com outras da cidade, a Dó, Ré, Mi e a Salsaparrilha. João Sabino que exerce até aos dias de hoje o seu trabalho como DJ tem por isso uma visão privilegiada sobre a evolução da noite, dado que começou, ainda, muito jovem – “A faixa etária dos frequentadores da noite, nessa altura, era um pouco superior à de hoje”. E também ele gostava mais dessa altura e da forma como a noite era vivida, especialmente se nos cingirmos à realidade de Vila Franca – “Preferia, completamente, voltar 20 anos atrás”, desabafa, até porque “havia mais gente em Vila Franca e mais espaços. Principalmente vinha muita gente de fora conhecer a cidade porque sabia-se que a noite aqui era boa”. A animação era efervescente com bares, discotecas e até pequenos espetáculos de rua que entretanto a cidade perdeu.
Com uma vista soberba sobre a cidade, o Tejo e a Lezíria, a que se juntaram várias obras de ampliação e remodelação, a discoteca não conseguiu evitar, contudo, o facto de por, diversas ocasiões, ter mudado de gerência, e ter enfrentado períodos menos áureos. Em 2004, “chegou mesmo a mudar para Xira Club”, refere Sabino. “A Golden enfrentou muita concorrência, derivado também ao facto de os jovens preferirem ir para Lisboa; ou outros locais que de repente ficavam na moda. Lembro-me de uma discoteca em Alcochete por exemplo”. Mas sobretudo coloca o enfoque no facto de “ter tido várias más gerências”.
Tendo já passado por variados espaços noturnos, o DJ tem dificuldades em conseguir arranjar uma justificação para a circunstância de tão depressa uma casa estar no topo das preferências como tão depressa cair em desgraça. “Temos casas dotadas de uma ótima decoração, com ótimo serviço, e onde existe um grande cuidado com o DJ residente, normalmente alguém que consegue ler bem a pista, e sempre com música atual. E hoje em dia, determinada malta que frequenta as discotecas não liga muito a isso, prefere ir atrás de um determinado estilo de música e não dá valor à boa organização. Por vezes o que acontece, é que preferem sítios onde podem entrar sem consumir”.
Voltando à Golden Stone, confessa que chegou a ser contactado no início desta década para em conjunto com outros interessados pegar novamente no espaço, mas acabou por desistir. “Em 2014, fui surpreendido com a informação de que a discoteca havia sido demolida”, devido ao facto de estar em zona de aluimento de terras, como aliás, os restantes edifícios do Monte Gordo.
“Fiquei mesmo chocado com a demolição. Só acreditei quando fui lá e coloquei o meu carro mesmo no meio daquele largo, olhei à minha volta e não vi nada”. A nostalgia tomou conta de si, bem como a sensação de frustração pelo facto de a Golden ter ficado perdida para sempre, “sem que ninguém conseguisse fazer daquele espaço o que ele merecia enquanto casa noturna”. “Podia voltar a ser uma referência, porque a Golden era conhecida como o satélite da noite na região. Os jovens chegavam a subir a pé aquela encosta de noite, e acredito que, hoje, podia ser mais do que uma simples discoteca, talvez um espaço multifunções”.
Ainda sobre a famosa questão do aluimento de terras, não consegue deixar de contar o episódio de quando em 1997, a “dona Helena, proprietária da discoteca, começou a mandar vir com os homens das máquinas que andavam a fazer as obras da urbanização do Monte Gordo, porque se estava a começar a construir os prédios e ela alertou que, para além, de lhe irem destruir a estrada e a discoteca, o subsolo era oco, porque tinha existido naquele lugar uma pedreira. Lembro-me tão bem deste episódio como se fosse ontem”.
Outro fenómeno que no seu entender tem feito mossa nas discotecas, prende-se com o facto de os bares hoje em dia poderem estar abertos até mais tarde, com música posta por um DJ, em que as condições da casa não estão vocacionadas para discoteca, mas onde as bebidas são mais baratas, e “as pessoas evitam seguir para as discotecas, onde os donos têm toda uma série de encargos que os bares não possuem”.
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