Vereadoras enfermeiras na linha da frente no Combate à Covid-19 nas autarquias
Carla Munhoz de Arruda dos Vinhos e Fátima Antunes de Vila Franca de Xira estão no terreno diariamente
|
|
| 21 Dez 2020 17:01
Miguel António Rodrigues Em tempo de pandemia, o mais difícil é responder de forma assertiva a todas as situações. A Covid-19 ainda é nova para todos e por isso todos os procedimentos continuam a ser estudados. Há quem faça das “tripas coração” para tentar encontrar soluções e resolver os problemas que se vão amontoando pelo caminho, porque ainda ninguém sabe como vai acabar. Fomos conhecer o exemplo de duas vereadoras na autarquias da nossa região que colocaram o seu percurso profissional na área da enfermagem como uma forma de agilizar processos e encontrar soluções no caos que a pandemia trouxe.
Mesmo com a vacina à vista, ainda não se sabe se o resultado será eficaz. Mas no dia a dia, no terreno, faz falta experiência, imaginação e muita criatividade, para lidar com as situações mais adversas e para colmatar lacunas que aos poucos vão aparecendo, aqui e ali. Se é certo que na primeira vaga, tivemos os jovens em campanhas publicitárias a dizer aos mais velhos para ficarem em casa, agora nesta segunda fase, que esperamos que seja a última, são os mais velhos a pedirem aos mais jovens que se cuidem e que quebrem as cadeias de transmissão, evitando ajuntamentos e saídas desnecessárias. Um dos exemplos vem da Alemanha com um anúncio tocante e emotivo, filmado como se estivéssemos 30 anos mais à frente. Um anúncio que lembra que a pandemia não foi uma miragem nem um pesadelo, mas que foi real e trouxe consequências a todos. Um pouco por todo o lado reproduzem-se campanhas de sensibilização, programas de apoio financeiro aos vários setores da economia, que são importantes, no entanto, os municípios tentam a todo o custo quebrar as cadeias de transmissão utilizando todos os métodos possíveis para tal. Entre muitos outros, estão os concelhos de Vila Franca de Xira e de Arruda dos Vinhos, que têm em comum, duas enfermeiras à frente dos respetivos pelouros da saúde que se têm revelado fundamentais para criar conhecimento e contribuir para o desbravar de algumas situações mais agudas que vão aparecendo no terreno. Carla Munhoz de Arruda dos Vinhos e Fátima Antunes de Vila Franca de Xira estão no terreno diariamente. Ambas têm como função tentar resolver os problemas que vão aparecendo. Nem sempre é fácil, mas a experiência que têm na área da saúde acabou por se tornar uma mais valia neste processo pois acabam por ser mais conhecedoras dos diversos procedimentos. Fátima Antunes é desde há oito anos vereadora da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira. Para trás ficou uma carreira na enfermagem num dos maiores hospitais do país, o Hospital de São José, tendo estado ligada mais recentemente ao Instituto Oftalmológico Gama Pinto. Uma carreira apenas interrompida por ter aceitado integrar o executivo de Alberto Mesquita. Com as áreas da saúde e solidariedade, entre outras, a vereadora assegura que ser também enfermeira tem ajudado no combate à Covid-19. “No fundo falamos a mesma língua”, refere em entrevista ao Valor Local, aludindo ao facto disso facilitar a comunicação entre as diferentes entidades de saúde envolvidas no combate à pandemia. Fátima Antunes revela que o dia a dia no concelho de Vila Franca de Xira não tem sido fácil. Ainda assim o município colocou em prática um plano de ação possível para minimizar o impacto da pandemia, que se traduziu numa “grande aprendizagem” com a primeira vaga da doença. A autarca que assumiu as rédeas no combate à pandemia no concelho de Vila Franca de Xira, sustenta que ninguém estava preparado para o que veio a acontecer. Os casos multiplicaram-se e deram origem a alguns surtos, nomeadamente, em Alverca, algo que se traduziu em conhecimento para esta segunda vaga que tem galopado um pouco por toda a parte e que em Vila Franca não é exceção. Um exemplo disso está relacionado, segundo Fátima Antunes, com os planos de emergência que “os possuíamos a pensar em catástrofes como fogos, inundações, ou sismos mas não para uma situação deste género”, refere a vereadora que salienta que o município de Vila Franca, à semelhança de outros, teve que lidar com uma situação que não estava prevista. No entanto, garante que para futuro, estas incidências terão de ficar previstas, esperando, no entanto que “não tenhamos que voltar ao mesmo, depois de passada a pandemia”. O desconhecimento, até mesmo para quem é da área, tem sido uma tónica dominante: “Todos nós tivemos de nos adaptar a isto”, aludindo aos surtos em lares durante a primeira vaga na Misericórdia de Alverca e agora na segunda em Alhandra e novamente em Alverca. A experiência com a primeira vaga levou a que o município, conseguisse, entretanto, implantar uma série de medidas nos lares: alas separadas para doentes positivos e negativos foi uma das soluções, refere a vereadora. A juntar a isto estabeleceram-se circuitos, durante o período do verão, para se tomarem “outras medidas para evitar o aparecimento de novos surtos”. No entanto, a vereadora sublinha que nenhuma destas medidas é eficaz a 100 por cento. “Por mais medidas que se tomem e que se reforcem os planos de contingência, não é infelizmente possível evitar novos positivos”, refere. Continua, contudo, a ser importante a formação dada para a colocação de máscaras ou viseiras e equipamentos de proteção individual nas IPSS e noutras instituições e empresas. No entanto, a responsável sublinha que “as coisas estão agora mais rotinadas “e não há tanto stress como existiu na primeira vaga da doença”. “Aprendemos muito!”, constata. Fátima Antunes reconhece que os conhecimentos que tem ao nível da sua profissão “ajudaram ao nível da pandemia”. Exemplifica a nível interno quando “foi preciso fazer planos de contingência”. “Acompanhei a elaboração dos mesmos para a Câmara Municipal e para os SMAS”. A vereadora sublinha que o seu conhecimento foi importante na utilização dos equipamentos de proteção individual, para a sensibilidade necessária ao nível dos circuitos, e mesmo para a aquisição das máscaras, como saber qual o tipo de material correto, entre outras questões. Ao Valor Local, a vereadora refere que o conceito de pandemia foi estudado, mas nunca ao nível daquilo que nos encontramos. Da sua experiência, a responsável pela saúde no município, salienta que passou pelas urgências do Hospital de São Jose durante três anos, sendo que esteve ligada a algumas “comissões de controle e higiene o que para este assunto em concreto ajudou bastante”. |
|
Sendo o concelho de Vila Franca de Xira urbano e muito populoso, também as empresas tiveram na altura alguma resistência em implantar planos de contingência. Ainda assim a vereadora refere não ter conhecimento de casos concretos, e na maioria aceitaram as medidas para tentar controlar a pandemia. A falta de equipamentos de proteção individual, máscaras e produtos para higienizar acontecia nas empresas, mas essa dificuldade agora já se encontra debelada.
Outro dos “ensinamentos” da primeira fase foi a utilização dos pavilhões para dar suporte aos hospitais. A vereadora refere que mais uma vez aqui os planos de contingência não estavam adaptados às necessidades e recorda, por exemplo, que os pavilhões não permitiam um isolamento eficaz de cada doente, os circuitos não eram distintos e a circulação de ar não era independente, por isso, nesta fase os hospitais voltam a ser cruciais para o tratamento da doença. Fatima Antunes, que refere ficar impressionada com o número de óbitos, sendo esta uma questão complicada ao nível emocional, salienta também que acredita que a maioria das dificuldades está encontrada e que com o grau de conhecimento, já adquirido, será mais fácil combater esta segunda vaga que já é uma realidade. Carla Munhoz, vereadora e enfermeira da Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos:
“A primeira vaga foi uma aprendizagem” O município de Arruda dos Vinhos tem contado com a colaboração da vereadora e enfermeira Carla Munhoz na gestão da pandemia no concelho. A autarca, que ainda se mantém nas funções de enfermeira, tem dado uma ajuda na gestão através do seu conhecimento no terreno. Conhecer as instituições de saúde pública, assim como todos os protocolos, tem sido uma mais valia. Carla Munhoz exerce funções no centro de saúde de Arruda dos Vinhos e ainda na VMER (Viatura Médica de Emergência) no INEM a partir do hospital de Vila Franca de Xira. São funções “que não podemos dissociar” esclarece a responsável pela área social e da saúde do concelho de Arruda dos Vinhos. Ao Valor Local, assegura ter dificuldade em entender onde começam umas e acabam as outras funções, uma vez que está a meio tempo em ambas e está a tempo inteiro em todas. Ou seja, com a pandemia, as funções fundem-se, ao ponto de estar em alerta permanente e atenta às dificuldades do dia a dia. Ser enfermeira faz parte da sua vida. Já as funções de vereadora, assumiu-as há pouco mais de três anos, altura em que aceitou o desafio de André Rijo, presidente da autarquia, para integrar as listas em 2017. Desde o início da pandemia que Carla Munhoz não tem tido mãos a medir e confessa que “a gestão de uma crise pandémica não passou no sonho de ninguém”. Este é um esforço sobre humano “em termos da energia que isto envolve e de trabalho 24 sobre 24 horas já há oito meses”, desabafa a vereadora à nossa reportagem, que alastra o esforço a toda a equipa do município de Arruda dos Vinhos. Ainda assim a enfermeira vinca que para já, no concelho de Arruda dos Vinhos, apesar da carga horária “é um esfoço suportável”. “Aquilo que sinto é que há pilares muito fortes e que estiveram presentes desde o primeiro momento”, refere Carla Munhoz que conclui que “o esforço tem sido das pessoas no seu todo, desde a proteção civil, passando pelo município, saúde pública, bombeiros e as diferentes IPSS e juntas de freguesia” entre outras. São pilares que fazem com que a equipa ganhe coragem no dia a dia para ir resolvendo os problemas que aparecem. Há outro pilar para que as coisas “tenham corrido bem, dentro do género”, refere a a vereadora: “Todas as equipas conhecem bem o município, estão bem integradas e conhecem as freguesias”, sendo que a comunicação em saúde “nunca falhou e essa comunicação ajuda-nos a estar à frente na resposta que possa ser trabalhada”. No que toca aos testes à Covid 19, o município já está a testar funcionários e utentes das IPSS do concelho, no pavilhão multiusos local, uma vitória graças aos seus conhecimentos, segundo apurámos, e que evitou assim migrações entre municípios, dado que por norma os cidadãos de Arruda dos Vinhos teriam de se deslocar a Vila Franca para os fazer. Para a vereadora a primeira vaga no concelho foi “uma aprendizagem”, há no entanto um melhor conhecimento do comportamento da pandemia e por isso “há um maior conforto, embora o medo continue a estar presente no dia a dia”. A vereadora sustenta, entretanto, que o facto de “ser profissional de saúde, e enfermeira no concelho de Arruda dos Vinhos, e estando ligada aos cuidados de saúde primários e secundários num hospital de referência, acaba por ser facilitador” , vincando que a gestão da “transição segura entre o hospital, comunidade e município é fundamental” para que tudo corra bem. Sublinha ainda que a grande maioria dos utentes de Arruda está referenciada para Vila Franca de Xira, há no entanto uma “franja” que utiliza o hospital de Loures. A autarca e enfermeira recorda que a maioria das pessoas depois de hospitalizada regressa a casa e por isso é cada vez mais importante o conhecimento no terreno e das patologias, porque já têm uma certa idade e por isso estão mais fragilizadas. O conhecimento no terreno é facilitador, e o facto de conhecer os protocolos e as situações na ótica da profissional agilizam procedimentos. Rodeada de emoções durante o dia no seu trabalho, Carla Munhoz não se escusa a referir que são os óbitos aquilo que mais a impressiona. A enfermeira e vereadora que contacta diariamente com várias situações, tanto no concelho como na área de intervenção do Hospital de Vila Franca de Xira, refere que cada caso é um caso, mas não fica indiferente aos estragos sociais e humanos que esta pandemia está a causar pelo mundo fora. Hospital de Vila Franca com 60 camas para doentes Covid
Em tempos de pandemia tem sito importante, um pouco por todo o lado, a gestão dos recursos humanos e técnicos. Somam-se preocupações relativamente ao número de camas disponíveis nos hospitais de referência, com destaque para os edifícios centrais. Fomos saber qual a capacidade de resposta nas principais unidades hospitalares da nossa área de influência, Vila Franca de Xira e Santarém. Em Vila Franca de Xira e quanto ao número de camas, aquela unidade hospitalar refere ao nosso jornal, a existência de um plano de contingência para responder à Covid-19. Segundo o hospital, este plano prevê várias fases de resposta. Numa primeira fase estão “disponíveis 19 camas na área da infeciologia e outras três camas nos cuidados intensivos para estes doentes” em função das necessidades, sendo que “essa capacidade pode evoluir até um total de 53 camas de internamento e 8 camas de cuidados intensivos dedicadas a casos Covid”. Está é a fase “em que nos encontramos atualmente” ou seja já no último patamar da sua capacidade. Isto segundo dados recolhidos na altura desta reportagem. O plano de contingência prevê igualmente que em caso de rutura para o internamento de doentes Covid, e fazendo parte do Serviço Nacional de Saúde, o Hospital Vila Franca de Xira “está articulado com a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo que promove a utilização dessa rede, adequando os recursos disponíveis às necessidades da população”. Com o piso três totalmente adstrito a doentes Covid, a Unidade de Cuidados Intensivos (UCI), o Centro de Hemodiálise e a Urgência Covid, o hospital tem mais de 200 profissionais de saúde alocados a esta área, um número significativo e que engloba auxiliares, enfermeiros e médicos. Ainda assim, o aumento do número de doentes nesta época do ano, tornou-se “um desafio”, sublinha a administração ao nosso jornal. “No mês de novembro estão internados, em média, 48 utentes covid por dia no Hospital Vila Franca de Xira. Este dado coloca grande e constante pressão nas equipas clínicas e obriga a uma gestão muito eficiente dos recursos disponíveis” refere a administração. Ainda assim, e tendo em conta o necessário reforço do quadro clínico, o hospital contratou 26 profissionais “e está previsto um reforço adicional de mais 20”. “A pandemia tem representado um grande desafio ao nível de gestão das equipas hospitalares, dado que se verifica um aumento significativo de ausências, que resultam da necessidade dos profissionais realizarem quarentena ou prestar assistência às suas famílias” e explica a administração que para além das contratações já efetuadas, o “hospital aumentou em 22 por cento a contratação de horas adicionais nos últimos meses, cerca de 53 mil horas extra”. Ao nosso jornal, a administração salienta que para esta segunda vaga, o hospital preparou-se e para fazer face ao aumento significativo da procura registada nos últimos dois meses, “evoluiu para a fase 3 do seu plano de contingência dedicando a totalidade do Piso 3 (53 camas) e da UCI (8 camas) a casos Covid”. A juntar a isto e porque já era uma situação prevista antes da Covid, o Grupo Mello que está de saída no próximo ano da gestão do hospital, iniciou a construção de uma nova ala no serviço de urgência com cerca de 290 m2 que duplicará a capacidade da Sala de Observação para casos Covid. Segundo o hospital “este investimento representa um reforço de 16 postos de observação e estará concluído em meados de dezembro” Para além disto informa que o grupo investiu na aquisição de uma nova gama de testes PCR, “mais rápidos do que os anteriores”. Estes novos testes permitirão uma utilização mais eficiente dos circuitos e espaços físicos adstritos à Covid. Já no que respeita às consultas nas diferentes especialidades e à problemática das listas de espera, no mês de novembro, em média, foram realizadas 682 consultas por dia no hospital, “tendo sido possível eliminar a lista de espera para primeiras consultas a novos utentes em algumas especialidades como a Urologia, Otorrinolaringologia e Dermatologia” refere o hospital que ainda assim salienta a existência de situações pontuais de adiamento de consultas por indisponibilidade do médico, nomeadamente, a ausência motivada por necessidade de quarentena, “mas essas situações serão remarcadas assim que reposta a normalidade” refere. Hospital de Santarém com 11 internados Covid
Das sessenta e duas camas destinadas aos doentes Covid, o Hospital de Santarém, tem preenchidas para já, e à data desta reportagem, apenas 11. Segundo a administração hospital com gestão exclusivamente pública do distrito de Santarém, aquela unidade situa-se no terceiro e último nível de alerta, com “62 camas, às quais se somam as camas de Unidade de Cuidados Intensivos Covid.” Esta unidade, que segundo os dados que nos forneceu, ainda está longe da capacidade total, refere que no caso de se esgotarem as camas, caberá à Administrção Regional de Saúde fazer a ponte para outras unidades. Ao nosso jornal, o hospital que respondeu telegraficamente às nossas questões, sublinha que adstritos à Covid-19 “entre enfermarias Covid, urgência Covid e UCI Covid temos 20 médicos , 110 enfermeiros e 60 assistentes operacionais” e vinca que o mesmo número poderá ser aumentado “e distribuídas equipas conforme as necessidades”. Quanto a esta segunda vaga, o hospital declara que “está atento à evolução e avalia diariamente as necessidades” reforçando que “recentemente contratou 57 profissionais, 18 enfermeiros e 11 assistentes operacionais” e que “as contratações futuras estão a ser avaliadas.” Sobre o número de ventiladoes disponíveis, a unidade hospitalar salienta ter uma quantidae “superior ao número de camas de UCI”. Quanto ao número de consultas, o hospital salienta que foram reforçadas em contracorrente com outros hospitais. Vinca que “em 2020 foram realizadas 103.036 consultas e estão agendadas até ao final do ano mais 2611 primeiras consultas” ainda assim sublinha que “aumentou a taxa de faltas por parte do utente que atribuímos, em parte, ao receio de vir ao hospital em tempo de pandemia”. |
|