A chamada “Lista de Pedófilos”
Por António Jorge Lopes, advogado
O Governo aprovou recentemente uma proposta de lei que altera o Código Penal para prevenir a repetição de crimes de natureza sexual contra crianças e menores. Esta alteração legislativa ainda carece de ser aprovada pela Assembleia da República e já está a ser analisada, em sede de especialidade, pela Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
A proposta de lei consagra três grandes inovações, a saber: (i) a criação de uma base de dados contendo a identificação e o concelho de residência de condenados por crimes sexuais contra menores, (ii) a inibição de uma pessoa condenada por este tipo de crimes ao exercício de atividades profissionais ou voluntárias que impliquem contactos com crianças e menores e (iii) a criminalização de novas formas de abuso e de exploração sexual facilitadas pela utilização das tecnologias da informação, como por exemplo o aliciamento de menor através da internet, os espetáculos pornográficos em tempo real na internet, ou o acesso, com conhecimento de causa e intencionalidade, à pornografia infantil alojada em determinados sítios da internet.
Pelo manifesto impacto mediático e as dúvidas constitucionais que têm sido suscitadas quanto à criação da base de dados, que tem sido popularmente chamada de “Lista de Pedófilos”, optei por aqui descrever de forma muito sucinta esta nova medida de prevenção e minimização dos riscos da prática de infrações de natureza sexual contra crianças.
Antes de mais, sublinho que esta medida não surge isolada no panorama europeu, sendo inspirada nas experiências consolidadas do Reino Unido e da França, que criaram sistemas de registo de condenados com obrigações de comunicação periódica que permitem o controlo e a monitorização de deslocações ao estrangeiro e procuram prevenir o contato profissional destes condenados com crianças. Estes sistemas já foram objeto de análise pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, que aceitou a natureza do registo enquanto medida preventiva da reincidência, não tendo considerado a inscrição no registo e as obrigações de comunicação como uma pena acessória aos condenados por crimes sexuais contra menores.
Nos termos da proposta de lei e do seu anexo, o sistema de registo que será criado em Portugal constituirá “uma base de recolha, tratamento e conservação de elementos de identificação de pessoas condenadas por crimes contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual de menor”, que contém nomeadamente nome completo, residência e domicílio profissional, data de nascimento, naturalidade, número de identificação civil, número de passaporte e referência à respetiva entidade e país emissor e número de segurança social de todos aqueles que forem condenados pela prática deste tipo de crimes.
A inscrição no registo não é permanente, pois é cancelada assim que decorram os prazos que estão fixados na proposta de lei ou quando se verifique a morte do pedófilo. Assim, o tempo de permanência na base de dados depende em concreto da gravidade da condenação: por exemplo, quem for condenado até 1 ano de prisão ficará 5 anos na lista, mas se a pena aplicada for superior a 10 anos o registo na lista será de 20 anos.
A informação constante da base de dados é sigilosa. Mas, obviamente, em determinadas condições é possível que certas entidades ou pessoas possam aceder àquela informação, como os magistrados judiciais e do Ministério Público (para fins de investigação criminal, de instrução de processos criminais, de execução de penas e de decisão sobre adoção, tutela, curatela, acolhimento familiar, apadrinhamento civil, entrega, guarda ou confiança de menores ou regulação do exercício das responsabilidades parentais), as Comissões de Proteção das Crianças e Jovens (no âmbito da prossecução dos seus fins) ou até quem exerça responsabilidades parentais sobre menor até aos 16 anos de idade.
Ou seja, quem exerça responsabilidades parentais (desde logo, os pais), pode pedir o “acesso” a parte da informação que consta da “Lista de Pedófilos”, devendo para tal dirigir-se à autoridade policial da área da sua residência. Este pedido tem de ser devidamente fundamentado e alegar situação concreta que justifique um fundado receio de que determinada pessoa conste do registo por ter sido condenado por crimes contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual de menores e que tenha residência no concelho do requerente ou no concelho onde se situe o estabelecimento de ensino frequentado pelo menor.
Um último apontamento de carácter pessoal. Como pai e como advogado fico muito contente com o reforço do combate à pedofilia. Como pai, por razões óbvias! O abuso sexual de crianças é das situações mais abjectas e nojentas que existem. Como advogado, porque noutra "encarnação" profissional e numa fase ainda preliminar desta alteração ao Código Penal tive oportunidade de dar o meu modesto contributo -para esta nova legislação.
08-05-2015
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