Aumento de custo de vida Está tudo cada vez mais caro e as pessoas deitam mãos à cabeça
Sílvia Agostinho 03-11-2022 às 12:37
É sábado e o mercado municipal de Vila Franca de Xira vai registando o seu volume de clientes. Não muitos, porque a crise e o aumento de custo de vida sente-se em força no negócio e há comerciantes que deixaram de vir todos os dias, porque pura e simplesmente não compensa. Embora antes do clima de guerra que se vive na Europa, o mercado já não fosse muito frequentado, ainda ia dando para os custos, agora os vendedores encontram-se na expetativa para perceber se vale a pena continuar com uma banca. Mas entre quem compra e quem vende, o sentimento de frustração é comum. “Isto está incapaz, minha senhora”, começa por referir uma das clientes abordadas pelo Valor Local. Analívia Piedade confessa que com a sua idade o que não lhe falta é ginástica financeira. “No outro dia encontrei aqui três preços diferentes para o mesmo produto, claro que fui ao mais barato”. Já no peixe opta agora por comprar “aquele que é do mais inferior”, porque pura e simplesmente não dá para ser de outra maneira. Quando vai aos supermercados, observa onde é que determinado produto pode estar mais barato – “Por exemplo todos eles vendem batatas para assar no forno, e há diferenças de 20 e tal cêntimos. Temos de estar atentos”. Mas quando lhe perguntamos qual o supermercado que acha mais barato, diz que ainda não conseguiu descobrir. “Diga-me que eu vou lá!”, diz divertida. A cliente do mercado de Vila Franca diz que já recebeu o apoio de 125 euros do Governo “que deu para qualquer coisa”. Com a aproximação do Natal, deita as mãos à cabeça já a pensar no investimento que tem de fazer em prendas numa época em que os preços sobem em flecha. “Toda a gente faz das tripas coração por causa de um dia. Nós lá em casa vamos optar por dar pequenas lembranças só para não esquecer a data”.
As duas peixeiras contam que têm visto o negócio a definhar
“Frutas, legumes, peixe está tudo caro e por isso estou a sofrer muito o impacto do aumento de preços, como aliás toda a gente”, começa por referir Dulce Cardoso. Para já as contas de casa estão equilibradas e conta que o único luxo, por assim dizer, de que abdicou foi de ir tantas vezes almoçar ou jantar a restaurantes. Quando vem ao mercado, refere que as compras não diferem em muito daquilo que fazia antes, talvez “porque em casa somos apenas dois” e ainda não foi preciso apertar muito o cinto. Outra despesa que acha que está pela hora da morte é a do gasóleo. Dulce Cardoso recebeu o apoio dos 125 euros no dia da nossa reportagem. “Vai dar para pagar algumas despesas”. Habituada a muitas flutuações de preços, Maria de Lurdes de 83 anos não tem dúvidas- “Subiram muito os preços e diminuíram o tamanho das coisas”. Nos supermercados aproveita as promoções dos folhetos. Já sobre o incremento à reforma, neste mês de outubro, diz que é mais uma manobra “para enganar”. “Prometem muito, mas cumprem pouco”. Maria de Lurdes diz que vai partir um dia “muito preocupada com aquilo que vai ser a vida” das sua filhas e netos. “Fui enfermeira toda a vida, na altura e no tempo de Salazar bastava ter a quarta classe. Agora as minhas filhas com cursos superiores não ganham para aquilo que estudaram”.
Analívia Piedade
Dulce Cardoso
Maria de Lurdes
Constância Costa deixou de vir todos os dias
Já entre os vendedores do mercado o cenário é muito desanimador. Constância Costa que vende azeitonas, frutos secos e tremoços tudo se torna ainda mais complicado “porque não estamos a falar de produtos de primeira necessidade”. Os fornecedores aumentaram os preços, pelo que teve de fazer o mesmo junto do consumidor final. A quebra nas vendas chega a ser de mais de 50 por cento. “Tanto que só venho trabalhar três dias por semana, neste momento, porque há dias em que não se vende absolutamente nada. Desde que começou a guerra que tem sido assim. Com despesas de deslocação, água, luz e a mensalidade à Câmara não dá mesmo”.
Já numa banca de peixe, uma vendedora queixa-se bastante. Emília Gameiro também optou por não vir todos os dias. “Agora não vale a pena, porque o gelo está muito caro. A enguia por exemplo está cara, é só para o rico, o pobre não leva”, constata. Mas não pensa em desistir – “Eu ainda não tenho direito à reforma e até lá tenho de andar, embora muitos dias não ganhe para nada”. Também Maria Murujo optou por vir apenas dois dias por semana. “Faz este mês 53 anos que estou aqui e nunca vi nada assim”, resume o momento.