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Centro de Saúde de Azambuja com consulta pioneira de Prevenção do SuicídioEntre os concelhos do Estuário do Tejo, é o que apresentava as estatísticas mais preocupantes neste domínio até há poucos anos atrás
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Sílvia Agostinho
07-10-2019 às 17:29 |
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Desde 2017 que as consultas de psicologia no Centro de Saúde integram uma componente de Prevenção do Suicídio através da psicóloga clínica e de saúde Conceição Neves que recebe os doentes encaminhados, regra geral, por via da consulta com os profissionais de saúde geral, quando detetam alguns estádios de maior desânimo, depressão, e em que os pacientes falam em colocar termo à vida como uma hipótese, ou que, de facto, já fizeram uma tentativa no passado. Neste momento, cerca de 20 a 30 pessoas estão a frequentar esta vertente da consulta de psicologia, desde adolescentes até aos mais velhos, sem grandes diferenças entre o número de homens e mulheres.
Prevenção é palavra de ordem e no dia 10 de setembro, Dia Mundial da Prevenção do Suicídio, as profissionais do centro de saúde, Conceição Neves, e a médica de clínica geral, Filipa Rodrigues, mobilizaram-se em duas sessões dirigidas à comunidade e aos que trabalham neste centro de saúde numa ação de sensibilização para uma temática da qual nunca é fácil falar. O concelho de Azambuja, no âmbito dos vários municípios que integram o Agrupamento de Centros de Saúde do Estuário do Tejo, é o que tem vindo a apresentar as estatísticas mais preocupantes nesta área. Conceição Neves fala em problemáticas que urgem ser trabalhadas como a da violência doméstica, violência contra idosos, a questão da autoflagelação por via dos cortes nos adolescentes, e no fundo a vida moderna que deixa pouco tempo para que as pessoas fomentem relações de amizade e proximidade, refugiando-se no isolamento. A falta de tempo dos pais para os filhos e a ausência do verdadeiro diálogo familiar é outro quadro que preocupa as profissionais de saúde. Entre 2013 e 2016, a taxa de suicídios oscilava entre os 1,7 por cento e 2,4 por cento sobre o número de população total (21 mil 814 habitantes) com esta realidade a ser mais premente na freguesia de Aveiras de Cima. Em 2017, a taxa desceu para os 0,8 por cento. Com uma carreira que passou pelo Hospital Psiquiátrico Júlio de Matos, Conceição Neves dá a conhecer que tem tentado encaixar em consulta todos os que aparecem nesta vertente, e é da opinião de que o hospital de referência deveria prestar um cuidado mais permanente neste domínio. As pessoas a atravessar um quadro daquela natureza “dão sempre sinal de alarme”. Quem passa por situações de violência física e psicológica ou por situações de luto concorre para os cenários mais complicados em causa. “As pessoas vão dizendo que já não têm interesse em andar no mundo, que preferem estar em casa, procuram estar sozinhas, e isso são sinais de alarme”, refere Conceição Neves. Filipa Rodrigues junta – “Normalmente as pessoas vêm por causas físicas mas o que está por trás é um grande sofrimento psicológico”. Nessas alturas, Conceição Neves tenta encaminhar o doente nas suas consultas. Por vezes há um histórico familiar, porque o quadro tem essa componente genética. Uma vez na consulta “ as pessoas admitem logo todo o abalo psicológico que sentem, desabafam aqui e nunca faltam à primeira consulta”. A psicóloga desmitifica – “Quem está a passar por uma situação em que pensa no suicídio esconde o que se está a passar quando nota que não há abertura dos que o rodeiam, caso contrário essa pessoa pode e quer ser ajudada, e se houver empatia por parte de quem aqui está normalmente não há resistência do doente”. A estatística diz que 90 por cento dos casos que envolvem pensamentos suicidas podem ser revertidos. Mas este não é um trabalho de uma sessão ou duas, é continuado e leva anos. “Atendo os doentes até em situações de emergência nem que seja na minha hora de almoço, basta ligarem-me porque se precisarem mesmo de uma consulta num dia em que estejam mais em baixo faço os possíveis para atender”, refere Conceição Neves. |
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Os adolescentes são um grupo difícil, e entre esses temos os que, numa dada altura, praticaram atos de autoflagelação. Em Aveiras de Cima tivemos um comportamento coletivo de grupo que envolveu vários alunos. Alguns desses jovens estão a ser seguidos nesta consulta. Os maus tratos familiares e os abusos estão ligados por vezes a estes quadros entre jovens. Conceição Neves diz que o fenómeno da violência doméstica, quer física, quer emocional, no concelho é uma realidade muito presente com situações dramáticas.
Chega-se ao adolescente pela empatia. Em algumas das consultas de psicologia promovem-se sessões com os familiares desses jovens através da terapia familiar. O agressor muitas vezes está presente, sendo que “assume o compromisso de mudar, mas acontece que às vezes falha, ou aparece aqui só para controlar, se quer que lhe diga”. O divórcio acaba por ser uma saída e os filhos acabam por sofrer em todas essas fases. Todos estes quadros de agregados familiares disfuncionais não estão ligados a condições socioeconómicas desfavoráveis como se poderia pensar à primeira vista. “Não é um fator determinante, mas antes alguns comportamentos tóxicos ligados ao vício do álcool, por exemplo”. Os números preocupantes da taxa de suicídios no concelho não são fáceis de explicar mas já o Relatório de Saúde Mental da Lezíria de 2015 falava em 43 por cento da população a viver em situação de pobreza camuflada, “e isso já é um fator de risco, o envelhecimento neste concelho é muito elevado, e temos um alto concelho muito isolado, para além de que há um histórico familiar de ideação suicida com prevalência acentuada”, diz Filipa Rodrigues. A consanguinidade pode desempenhar um papel preponderante em alguns desses casos. |
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