Era uma vez um aeroporto... estórias de uma novela

Localização ditada pelo Governo em 2008: no Campo de Tiro de Alcochete
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ImagemDaniel Ferreira fala sobre os vários inconvenientes do aeroporto

Benavente e Ota são até à data a face de uma mesma moeda. O Novo Aeroporto de Lisboa que esteve durante vários anos projetado para o concelho de Alenquer viajou para o Campo de Tiro de Alcochete, e nas duas partes os mesmos cenários vividos: medidas restritivas, condicionamentos e o desenvolvimento anunciado cada vez mais uma miragem. Agora que a Declaração de Impacte Ambiental para o aeroporto no concelho de Benavente, está prestes a caducar e pode vaticinar mais ou menos a “morte” do aeroporto, ouvimos os principais atores desta novela em dois atos.
                            
Em 2008, o anúncio de que o Novo Aeroporto de Lisboa (NAL) viria para o concelho de Benavente, mais propriamente para o Campo de Tiro de Alcochete, parecia à primeira vista um jackpot inesperado face à decisão já mais antiga de que aquela grande infraestrutura ficaria localizada na Ota, em Alenquer. O tecido económico e imobiliário ganharam uma nova animação, mas a crise económica depressa começou a dar amargos de boca e uma sensação de desapontamento. “Até hoje tem significado não uma oportunidade, mas um estrangulamento!”, dizia em entrevista ao Valor Local, António José Ganhão, antigo presidente do município, no final do seu mandato, em 2013. O município nem conseguiu ficar mais conhecido com este anúncio pois a grande maioria acredita que a infraestrutura está localizada no concelho de Alcochete, quando as pistas se localizam na freguesia de Samora Correia, Benavente.

O processo tem andado a reboque de diferentes decisões dos vários governos que continuam a adiar o inadiável pelo menos no papel, dado que mais ou menos toda a gente já intuiu que não há uma data plausível para que algo ande para a frente neste domínio. As medidas preventivas foram levantadas em 2011, e agora aguarda-se com alguma expetativa para ver o que se vai passar após dezembro deste ano quando expirar a Declaração de Impacte Ambiental (DIA), o que a acontecer dita o fim de forma, mais ou menos concreta, do aeroporto.

Para já o presidente do município de Benavente, Carlos Coutinho está mais preocupado com o PDM que, por enquanto, está parado devido a uma providência cautelar da Quercus, mas que também viu o Governo solicitar para que seja contemplado no mesmo o NAL. “Tomámos a decisão de não incluir o aeroporto, para evitar que a Câmara pague indemnizações a proprietários e construtores que possam vir a sentir-se prejudicados pelo fato de já não poderem construir porque está previsto para determinado local a infraestrutura em causa”. O autarca que não se sentiu confortável com a prorrogação da DIA que veio dar mais uma achega a todo o cenário de restrição, em 2012, acredita que possa existir mais um alargamento de prazos após o fim deste ano. “Já nada me espanta nesse processo”, refere.

O vereador do PSD na Câmara de Benavente, José da Avó, opõe-se a que o Governo esteja a tentar que a autarquia limite zonas de Santo Estevão no PDM face à possibilidade do aeroporto. “Não sabemos se estará concluído sequer nos próximos 20 anos, como tal restrições deste tipo são penalizadoras”, até porque se trata de “uma zona de expansão do concelho”. “Falamos de indemnizações a pagar que não serão pequenas, porque a Portucale tem um projeto para a zona em causa, e a Câmara não pode ficar comprometida com essa possibilidade e avançar para a inclusão, por sua espontânea vontade, do aeroporto no PDM”. “O Governo é que tem de assumir isso e arcar com as possíveis indemnizações que daí resultem”.

Outros dos fatores que no entender das várias forças políticas acaba por prejudicar o concelho, prende-se com a circunstância, de a dada altura, o Governo ter mexido na primeira localização do aeroporto naquela zona. As pistas foram mudadas dois quilómetros para norte para mais perto de Santo Estevão, criando todas as condições para tornar menos suportável a qualidade de vida no local, com o possível aumento de ruído provocado, no futuro, pela dinâmica daquela infraestrutura, bem como a alteração de alguns ecossistemas.

Com esta deslocação, o concelho ficará ainda prejudicado no que se refere à possibilidade de crescimento de uma grande cidade aeroportuária, que a julgar pelo desenho do que está projetado se situaria nos municípios do Montijo e Alcochete. “Os benefícios económicos ficariam fora de Benavente. Até entenderia que pudéssemos ter alguma penalização, mas como as coisas estão a ser feitas, não vamos lucrar nada nem desse ponto de vista de algum crescimento, exceto na altura da construção, nem do ponto de vista das vias de acesso. Não vamos ter mais estradas, continuaremos longe do aeroporto e também distantes do centro económico”, vaticina José da Avó.

Santo Estevão: “A Nova Quinta da Marinha”


A expressão é de Daniel Ferreira ligado à administração da Herdade do Zambujeiro, com cerca de 300 casas, que nas últimas décadas viu chegar novos residentes que fizeram do local uma segunda casa, e nalguns casos primeira. O ministro da Saúde, Paulo Macedo, é talvez um dos nomes mais conhecidos. Se não fora o anúncio do aeroporto e tudo o que se seguiu daí para a frente, bem como a crise económica, a localidade do concelho de Benavente tinha tudo para se tornar na nova meca do turismo rural. “Infelizmente houve uma paragem quase de 80 por cento” no que se refere ao aspeto imobiliário-turístico ligado ao empreendimento.

“Na aplicação das medidas preventivas, não tiveram a noção do que andavam a fazer. Na Ota ainda deram uma margem de cerca alguns hectares de área de proteção, aqui não fizeram nada disso, com restrições até ao concelho de Coruche”, refere e exemplifica – “Se eu quisesse fazer um casa de banho a ANA é que tinha de dar autorização, mesmo que a Câmara concordasse. Se quisesse vender uma parcela de terreno, igualmente o mesmo processo. Nisto tudo, a Câmara era um verbo de encher! Não se podia fazer nada no concelho. Muitos venderam e outros deixaram de comprar”, recorda Daniel Ferreira. Mesmo com o fim das medidas em causa, tal não afastou o fantasma – “As pessoas questionam-se: E se voltam a reintroduzir as medidas?, Face a isto desistem”, demonstra para enfatizar as sequelas da questão.

 Associação para a Defesa Ambiental de Santo Estevão fala em interesses obscuros

Um dos rostos mais visíveis desta novela do novo aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete é Henrique Chaves, da Associação para a Defesa Ambiental de Santo Estevão (ADASE), constituída logo após a decisão do Governo aquando da troca de Ota por Benavente, com o intuito de “acompanhar o processo e defender a qualidade de vida dos residentes”. O antigo ministro do Governo de Santana Lopes, que escolheu a Herdade do Zambujeiro para segunda habitação, é particularmente caustico na análise dos vários acontecimentos que motivaram avanços e recuos nesta matéria.

Na sua opinião há claramente “a defesa de interesses pouco conhecidos” logo à partida na definição das pistas do aeroporto mais a norte, tendo em vista a criação da cidade aeroportuária, uma decisão governamental que trouxe imediatamente um ónus mais pesado para a freguesia de Santo Estevão. “Queriam claramente beneficiar alguém mas quem não sei exatamente, também sempre se ouviu dizer que quando se anunciou a Ota, gente conhecida do PS foi logo à pressa comprar terrenos na zona”.

A ADASE chegou a ser recebida pela antiga estrutura NAER, antes da mais recente privatização da ANA. “No início do processo falámos com um tipo chamado Carlos Madeira, responsável da NAER, e pelo qual não tenho a mínima consideração, porque omitiu intencionalmente essa intenção de passar a por o aeroporto a apenas quatro quilómetros de Santo Estevão e não os oito inicialmente previstos, ou seja acabar com tudo na localidade”. Para além de que tal deslocalização “acarretaria ainda mais prejuízos do ponto de vista ambiental e da avifauna”, considera. “A infraestrutura estava prevista justamente para o local onde se concentram arrozais com uma grande concentração de aves. A loucura chega a um ponto em que se propõe esvaziar os arrozais, que são propriedade privada, isto é mesmo de gargalhada!”, acrescenta.

O rosto da ADASE não tem dúvidas de que tudo foi cozinhado nas costas de Benavente, e do antigo presidente Ganhão. “Fizeram esse novo desenho clandestinamente de modo a libertar a sul muitos hectares de terreno onde se praticava uma pequena agricultura, rumo à especulação imobiliária”. “O antigo presidente Ganhão, na altura, alertado por mim pediu satisfações àquele organismo que desmentiu, alegando que tudo não passava de invenção minha. Ganhão convenceu-se disso mas rapidamente a tese deles caiu por terra quando numa apresentação pública no Campo de Tiro de Alcochete com muitos convidados, interpelei uma engenheira que interveio, e que ficou completamente embatucada perante a minha questão, sendo obrigada a confessar perante toda a gente a nova arquitetura das pistas”, confidencia. Henrique Chaves recorda que o assombro tomou conta de muitos dos participantes e prossegue – “No intervalo da sessão, até o Augusto Mateus ligado a esta questão se mostrou desconcertado”. Quanto a António José Ganhão, “este perdeu logo ali a cabeça”. “Disse que tudo aquilo era inacreditável e que a NAER tinha andado a mentir. Arranjou-se logo ali um 31 incrível”. Para além do impacte ambiental, “o Estado ainda teria de indemnizar severamente a Portucale que já naquela altura tinha um projeto imobiliário muito adiantado”.

Com a instalação da crise, o atual Governo tem desviado as atenções para a possibilidade de um aeroporto para voos low-cost no Montijo, ao mesmo tempo que não desarma por completo da infraestrutura em Benavente. A Declaração de Impacte Ambiental cujo prazo terminava em dezembro de 2012 foi prorrogada até dezembro deste ano, tendo sido alvo de processos em tribunal por parte da ADASE, Câmara de Benavente e Portucale tendo em conta os prejuízos ambientais. “Ninguém teve coragem até hoje no Governo para colocar um ponto final nisto, vai ter de ser o tribunal a decidir no final de 2014”. Henrique Chaves demonstra, ainda, que chegou a encontrar-se com o atual ministro do Ambiente, Jorge Moreira da Silva, que confirmou estar a leste do processo de renovação da DIA ocorrido em 2012. “Disse que não conhecia o despacho, que era impensável um despacho daquela natureza passar sem que ele de nada soubesse, até afirmou que ia reestruturar todo o ministério, e que me ligaria dali a uns dias depois de averiguar o que se tinha passado. Olhe até hoje! Nada me disse. É caso para dizer que os interesses se moveram do PS para o PSD”.  

Contudo o residente na Herdade do Zambujeiro acredita que poderá acontecer nos próximos anos um volte-face com o triunfo da região como paraíso do desporto equestre e do turismo rural como muitos haviam sonhado, isto se o aeroporto “morrer”. “Com a falência dos Espírito Santo, a Comporta que já estava muito orientada para o pólo, poderá ser suplantada por Santo Estevão com o projeto da Portucale. A marca Espírito Santo era um atrativo, até snob, porque muita gente queria ir para ao pé deles. Com a Comporta a decair, Santo Estevão vai lucrar com isso, nos próximos anos".

ImagemÁlvaro Pedro acusa outras câmaras de excessiva ambição
A Ilusão continuou com o Plano de Compensações da Ota

Com o anúncio do fim do aeroporto na Ota, um conjunto de municípios constituído pela totalidade dos que compõem a região Oeste, com Alenquer num primeiro plano e os quatro municípios da Lezíria do Tejo- Santarém, Rio Maior, Azambuja e Cartaxo, o Governo prometeu que haveria de arranjar maneira de os compensar com um pacote de obras, algumas das quais previstas até antes do anúncio.

Álvaro Pedro, à data do anúncio da deslocação do NAL de Ota para Benavente, em 2008, recorda-se bem daqueles dias que antecederam o fim da Ota, em que telefonava constantemente para José Sócrates para saber se já havia fumo branco. Até que foi a vez do antigo primeiro-ministro lhe telefonar, e ter perguntado a Álvaro Pedro se estava sentado- “Já todos estávamos mais ou menos à espera daquela decisão. O presidente da República puxava mais pela outra opção, de modo que não houve novidade nenhuma”.

Para trás ficavam décadas a sonhar com um aeroporto na região, algo que já se falava desde os anos 70, embora “sempre tenha existido muita controvérsia porque alguns falavam do intenso ruído que podia causar”. “Por causa do aeroporto, até a CLC era para vir para cá, mas a proposta foi chumbada na Assembleia Municipal e com isso a empresa acabou para ir para Aveiras de Cima”, recorda-se.

Um dos fenómenos bem característicos da opção Ota prendeu-se com a especulação imobiliária, com a compra de terrenos, especialmente por parte de António Varela, da Renit,, a valores muito irrisórios junto de pequenos proprietários tendo como fim a especulação imobiliária. “Havia quem só se dedicasse a isso, depois tiveram azar”, refere o antigo autarca.

A possível proximidade a um aeroporto despertou o interesse em Alenquer de outro género de negócios, nomeadamente, pensou-se numa cidade do cinema para a zona do Monte Redondo, “que também quiseram deitar abaixo para favorecer as pistas”. Quanto às medidas restritivas lembra-se que ainda se conseguiu “safar com alguma sorte uma fábrica em Cheganças, a Linde Sógas que possuía uma torre muito alta que podia interferir com os aviões, mas chegou-se a acordo com a ANA, com o compromisso de se destruir a torre no caso de a infraestrutura avançar, como isso não aconteceu ainda hoje lá está”.

Quando chegou a hora de se negociar o pacote de compensações, diz que houve câmaras no Oeste que foram demasiado ambiciosas, e por isso desde logo se apercebeu que pouco do que se andava a negociar podia algum dia ir para a frente. Alenquer reivindicou o há muito prometido IC11 entre Carregado e Torres Vedras, a par do Centro Escolar de Alenquer. “A minha Câmara e a de Azambuja, que erámos as mais prejudicadas tínhamos noção do que pedíamos, mas o resto dos municípios exageraram.” “Quando íamos às Caldas falar com o ministro, sabia que era impossível conseguirmos o que andávamos a pedir. Não sei por que Leiria ou Peniche também tinham de pedir, quando os únicos prejudicados eram os concelhos de Alenquer e Azambuja”, desabafa.

Joaquim Ramos, antigo presidente da Câmara de Azambuja, que também participou nestas reuniões considera que o plano de compensações foi “o maior embuste político” dos seus mandatos. “Estou à vontade nesta crítica porque o Governo era do meu partido. No início acreditei nessas compensações até que comecei a desconfiar porque não se falava da fonte financeira para por em prática esses projetos. Ninguém sabia de onde viria esse dinheiro, nem o secretário de Estado ligado ao QREN. Por outro lado, o ministro Mário Lino mandava uns gritos nas reuniões dizendo que não nos devíamos preocupar com o dinheiro, porque o primeiro-ministro tinha tudo sob controle”, refere e prossegue: “Fez-se uma grande cerimónia nas Caldas de assinatura de protocolos, mas eu ia muito desconfiado, porque não se podia simplesmente dizer que se ia buscar o dinheiro ao QREN para o que estava preconizado, deveria, antes, ser contemplada uma verba específica em Orçamento de Estado”.

Até que “eu e o Álvaro Pedro começámos a fazer uma grande barulheira, dizendo que estávamos muito solidários com os colegas, mas que os outros concelhos do Oeste não deviam merecer as mesmas verbas porque não eram prejudicados, mas entretanto até os do Alentejo quiseram meter-se ao barulho. Desataram todos aos gritos, e foi tudo corrido a 100 mil euros, que no caso de Azambuja, apliquei na rede de saneamento em Vale Brejo, Comeiras e Tagarro”. Ramos conclui – “Talvez da parte de Mário Lino não houvesse intenção de nos calar ou enganar, mas do primeiro-ministro não tenho dúvidas”. “Guardo essa mágoa!”. Para trás ficou o biotério, uma variante e a requalificação urbana de Aveiras de Cima. “Passaram durante muito tempo a ideia de que os autarcas podiam continuar a sonhar com os projetos, que o dinheiro havia de aparecer de algum lado”. Quanto à sorte de Benavente neste processo agora que o aeroporto começa também a ganhar contornos de quimera no outro lado do Tejo, vaticina: “Esses coitados se calhar nem 100 mil euros vão ver”. Ramos refere que a transferência da infraestrutura sempre foi demasiado óbvia: “Os interesses escondidos do grupo Espírito Santo”

Melhor sorte parece ter tido Paulo Caldas, antigo autarca do Cartaxo, que afirma, ao contrário dos seus colegas, na altura, que o Governo contratualizou a entrega de 3 milhões de euros a cada Câmara da CIMLT para os seus projetos, que no caso do Cartaxo, refere Caldas, ao Valor Local, se destinou “às áreas empresariais, equipamentos sociais”. “Depois ainda consegui 1,5 milhões para a esquadra da PSP e cinco milhões para a EB 2,3 do Cartaxo.”

Já no caso de Rio Maior, o antigo presidente, Silvino Sequeira, lembra que a recuperação da escola secundária foi efetuada, bem como, a vinda da Escola Superior de Desporto, entre outros projetos que foram concretizados. “Na altura das compensações devia ter sido concebido um mini programa operacional porque dava a sensação de que esse plano era para calar a boca aos mais reivindicativos. Entretanto saí da Câmara a meio do processo, mas sei que houve um aumento de componente comunitário de 10 milhões para investimentos para os quatro municípios”.

Um dos rostos bastante ativos durante o processo do aeroporto da Ota foi António Carneiro, da extinta Região de Turismo do Oeste, que defende que os municípios da região deveriam, neste momento, estar a pugnar pela concretização da Ota como fazendo parte do plano “Portela +1” e de algum modo suplantar as esperanças do Montijo ou Alverca nessa corrida. E também ele se lembra bem das conversa com os governantes. E vai mais longe nas ligações entre o Governo de Sócrates e a ligação ao Grupo Espírito Santo – “O ministro Manuel Pinho foi funcionário do BES, portanto está a ver. O Grupo Espírito Santo até se deu ao luxo de cortar 500 sobreiros e se for um de nós que corte uma árvore dessas vamos presos, e a eles nada lhes aconteceu por isso”.


Imagem
Ota viveu anos no limbo do aeroporto
ImagemNeste local esteve prevista habitação
Empresários da opção Ota ainda recordam os prejuízos

O concelho de Alenquer já quase se esqueceu do aeroporto. Com o fim das medidas restritivas, aos poucos o impacte que a infraestrutura poderia causar a nível económico foi-se esfumando mas, ainda assim, há empresários que continuam a sentir na pele os seus efeitos, como é o caso da promotora que construíu o Varandas del Rei à entrada de Alenquer tendo em vista o crescimento da população naquele concelho, mas que hoje permanece completamente ao deus dará, com todos os 72 apartamentos para venda.

Um dos empresários que mais sofreu os impactes das medidas preventivas da Ota foi Mário Pereira Cartaxo que chegou a ter em projeto uma urbanização na zona de Casal Pinheiro, no limite entre o concelho de Azambuja e Alenquer. “Fui um dos grandes visados, tive alvarás de construção, com a venda em projeto. Cheguei a começar as infraestruturas, já com casas vendidas. Meti os primeiros projetos na Câmara que os aprovou, mas a ANA não deu o aval, alegando que estavam na linha do corredor de aterragem. O projeto esteve em banho-maria 10 anos”, refere, relembrando que só conseguiu salvar o negócio propondo antes a construção de armazéns para o local, e consequente abandono do projeto de habitação. “Tive entretanto de mudar os arruamentos e passeios, que passaram a ser mais largos com a diminuição de lotes”, relembra. Todavia, “fez-se com este projeto algo giro e com bom aspeto”, embora lamente que o projeto para habitação tenha ficado pelo caminho.

“Perdi muito dinheiro em juros porque tinha crédito para aquisição do terreno. E com a morosidade do processo acabei por atirar muito dinheiro para a rua só para pagar juros. Ainda disseram que podíamos ser indemnizados mas com certa gente o que hoje é verdade, amanhã é mentira”, desabafa para evidenciar que não deixou de ser prejudicado, mas é da opinião de que os empresários foram pouco unidos, pois após o fim do aeroporto na Ota devia ter sido criada uma comissão para representar os construtores e proprietários prejudicados, de modo a que se exigisse o pagamento das indemnizações às quais tingam direito. “Ainda cheguei a telefonar a um colega meu do ramo também prejudicado mas ele não teve para se chatear com isso”, conclui conformado.

Sílvia Agostinho
27-10-2014

Aeroporto de Ota… atalhos e retalhos…

O concelho de Azambuja tem feito depender, quase sempre, de factores externos o seu caminho para o desenvolvimento. Lusolândia, campos de golfe, cidade das novelas, entre muitas outras “miragens” das quais a mais importante e que maior influência teve no imaginário e na prática de autarquias, associações locais, investidores, etc., foi sem sombra de dúvida o “aeroporto de Ota”. Durante algumas décadas (dos anos 60 até 2008) alguns constrangimentos à construção na área de influência onde seria implantada aquela infra-estrutura, condicionaram investimentos empresariais e particulares e criaram condições para manobras imobiliárias especulativas com particular incidência no eixo Aveiras de Cima/Alcoentre. A apresentação pública do projecto em 2006, trazendo consigo a construção de uma cidade aeroportuária que abrangeria o nosso concelho, parecia indiciar que finalmente as alavancas para o desenvolvimento de toda esta região estavam ao alcance… na verdade essa ilusão durou apenas até Janeiro de 2008 quando foi anunciado o abandono de Ota e a escolha de Alcochete como localização final. Na guerra entre consórcios bancários, mais uma vez Azambuja perdeu.

No entanto não retirámos as ilações devidas e subimos a escada das “compensações pela deslocalização do aeroporto”…! As autarquias do Oeste acordaram com o governo um conjunto de compensações – que no nosso caso atingiam à volta de 400 milhões de euros – em infra-estruturas que alavancassem o desenvolvimento que se esfumava com a mudança de localização. Hoje, infelizmente, sabemos que essas contrapartidas nunca passaram do papel e que teria sido melhor negociar um pacote menos ambicioso mas que se traduzisse em incentivos reais à fixação de empresas nas áreas afectadas e na promoção de planos de acompanhamento para a capacidade económica implantada e para o desenvolvimento do potencial humano e cultural.

É importante hoje olhar esse tempo e traduzir a frustração em projectos novos. Desde logo com a obrigação por parte das autarquias do Oeste, e Azambuja por maioria de razão, não deixarem de fazer sentir ao governo que durante meio século o desenvolvimento de uma região esteve num limbo onde oportunidades foram perdidas e que a compensação terá de ser feita através já não de “betão” mas primordialmente de incentivos económicos, sociais e culturais. Essa constatação não pode impedir autarquias e associações locais de ter um olhar diferente para o seu território e para as condições novas projectadas pela profunda crise económica que se vive…! Nestes tempos é cada vez mais evidente que, num mundo cultural e economicamente globalizado, resistem melhor aqueles que conseguirem, através de boas práticas, traçar caminhos de “proximidade” em termos económicos e sociais num determinado espaço de desenvolvimento integrado. O investimento, o desenvolvimento, não se atrai por oferecer intenções mas pela demonstração prática que neste espaço, no concelho de Azambuja, abandonámos a “miragem” de depender de factores externos e passámos, em primeira instância, a olhar para o nosso potencial e a valorizá-lo. O caminho é mais longo mas tem o enorme benefício de não ser feito de “atalhos e retalhos…”!

Acisma




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Comentários

Não é preciso ser muito clarividente para perceber qual a origem do Editorial da Acisma. Na altura, de facto eu e o Álvaro Pedro é que andámos a bater com os "costados " pelos Ministérios e a sermos quase enxovalhados quando púnhamos em questão todo o processo pela não definição do financiamento. Mas enfim, e sem querer contrariar a opinião da Acisma, sempre digo que não vivemos numa sociedade estatizada e que é o mercado que define as coisas.
Quanto ao que o Cartaxo conseguiu, foi exactamente o que nós conseguimos e não teve a ver com compensações nenhumas mas com verbas que foram atribuídas, através da CIM-LT a todos os Município que a integram - em Azambuja, por exemplo, fizemos as Escolas de Alcoentre e Boavida Canada com essas verbas



Seg 27-10-2014 
Joaquim Ramos




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