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Combate às Alterações Climáticas 
O que já estamos a fazer na região!

Sílvia Agostinho
19-02-2020 às 16:05

A realidade das alterações climáticas ainda parece para muitos um chavão pouco nítido. O fenómeno que já se encontra estudado reflete-se a diversos níveis, e incide sobre a vida humana e as diferentes atividades. Vamos debruçar-nos neste trabalho em algumas delas, e perceber até que ponto os municípios da região se estão a preparar face ao impacte cada vez maior das alterações climáticas.

Em traços gerais, e face aos cenários projetados para um intervalo de tempo de algumas décadas, o fenómeno prevê, entre outras possibilidades, o aumento dos dias com precipitação intensa, o aumento de eventos meteorológicos extremo de ventos fortes e tempestades, aumento do número de dias com ondas de calor, aumento da frequência dos dias muito quentes, aumento da frequência das noites tropicais e diminuição generalizada da precipitação total anual.

Olhámos neste trabalho para o rio Tejo e a atividade económica ali desenvolvida, nomeadamente, a pesca e as oscilações que tem sofrido. A subida do nível médio da água do mar é uma consequência que terá os seus impactes futuros na configuração do estuário do Tejo. Se em parte as alterações climáticas já possuem o seu reflexo, a atividade humana com a diminuição dos caudais em Espanha ou a construção do açude de Abrantes têm causado os seus impactes.
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“Costumo dizer que o Tejo é um monstro no bom sentido, consegue sofrer o que de mal lhe fazem e ainda regenerar-se, porque se assim não fosse já só tinha o nome, não era rio”, diz o pescador da aldeia avieira do Porto da Palha, João Lobo.

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​Este ano, a pesca da lampreia prevê-se fraca, “mas não quero fazer previsões”. Contudo “o rio se estivesse com menos poluição, dava peixe para toda a gente, mas com as descargas poluentes é difícil”. E é perentório quanto ao açude – “É dar ali umas cargas de dinamite, porque só veio piorar o estado do rio, e se fizeram aquilo para fins turísticos, como é que se consegue se está todo poluído pelas celuloses. O presidente da República gosta de dar mergulhos em todo o lado, e que eu saiba ainda não foi lá”.

Há cada vez menos água no Tejo, um fenómeno também decorrente das alterações climáticas, com períodos de seca e a crescente poluição. “O rio está muito desequilibrado, o peixe continua a passar nas alturas próprias como a lampreia ou o robalo, mas há cada vez menos”. Os caudais ecológicos “não são respeitados”. “Vocês sabem que eu vivo da natureza. O ministro do Ambiente não percebe nada daquilo que é o trabalho dele. Espanha tem os caudais ecológicos para enviar. O rio está todo seco em algumas zonas. No verão, Espanha enviou água, mas Portugal não apanhou nem um litro.” Filipe Ribeiro, biólogo e investigador do MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa acrescenta que o transvase de Espanha para o Tejo e Segura “retira uma grande quantidade ao caudal natural do rio e isso faz com que acabemos por ter menos água disponível, tendo em conta que cada vez tem chovido menos, e acaba por existir maior incerteza”. A cunha salina do rio está a aumentar e com isso aumenta a proliferação de espécies como o robalo, menos pronunciada até há algum tempo. “Temos uma espécie de invasão marinha atendendo à falta de água. Este efeito antes verificava-se em zonas de Vila Franca ou Póvoa e agora acontece mais a norte”.

Novas espécies têm invadido o Tejo como o siluro “que é uma espécie predadora, que se alimenta de outros peixes, e que mais parecem burros, porque apresentam um peso desmesurado” demonstra João Lobo. “Uma prima minha das Caneiras apanhou um enorme, nem conseguia metê-lo no barco”. Trata-se de uma espécie que pode chegar aos 50 quilos, e que foi introduzida por estrangeiros no Tejo, que facilmente se adaptou ao rio. “Um cientista quis fazer uma experiência e sinceramente a mim não me agrada que esse peixe ande por aí. Na América, a espécie já levou lagos à extinção” diz João Lobo. O lúcioperca é outra espécie invasora exótica e recente, “mas excelente para se comer, é um espetáculo”.

A redução da variabilidade de caudal do Tejo, quando antigamente inundava todos os anos, tem contribuído para a abundância de novas faunas fluviais em detrimento de outras. Foram espécies introduzidas pelo homem para fins ornamentais ou desportivos “que acabam por ter maior resistência e serem mais abundantes”. São espécies mais resistentes à poluição e à falta de oxigénio associada, bem como à temperatura, e à própria salinidade da água. “Dominam as comunidades existentes e hoje o Tejo tem esta realidade de possuir mais exemplares de espécies exóticas do que nativas”, relata o investigador. São espécies filhas das alterações climáticas. O siluro que foi introduzido na parte espanhola do rio, “acaba por ser mais abundante no troço principal do Tejo em Portugal”. Com a perda da variabilidade natural, uma espécie endémica do rio como é o caso da boga da lezíria que apenas se encontrava na parte da ribeira de Muge e no afluente do rio Trancão tem vindo a desaparecer. “A pressão humana, com a poluição e os transvases, associada às alterações climáticas, contribuem para a perda de diluição do rio e os efeitos são sintoma de ambas as causas”.

A praga dos jacintos bem presente no Rio Sorraia é outro acontecimento ligado ao fenómeno das alterações climáticas, já no Tejo “o rio é muito forte e acaba por expulsar essa vegetação que não chega a ser praga”, constata o pescador. “Temos marés de quatro metros, e só assim conseguimos andar à pesca. Este rio anda sempre em movimento, com muita oxigenação, apesar de toda a destruição”.  Embora considere que a zona de Azambuja e de Vila Franca é a mais controlada. “Para cima há muito trabalho e a poluição não ajuda com as empresas criminosas poluentes”, diz o pescador.

​O biólogo Filipe Ribeiro olha para o Tejo com alguma preocupação e acrescenta que o projeto Tejo que prevê a construção de quatro açudes de baixa altura no baixo Tejo entre  Azambuja e a Golegã, seguidos de dois açudes de média altura entre Almourol e Abrantes, munidos de eclusas para barcos e escadas de peixes, com o objetivo de criar uma espécie “estrada” de água contínua de Lisboa a Abrantes, tendo em conta que o rio já não apresenta os caudais de outrora, é algo que não está a ser encarado com bons olhos pela comunidade científica. “Basicamente vai-se perder o sável, a enguia e a lampreia bem como toda a acultura avieira associada. A agricultura que tem uma enorme demanda pela água tem de fazer uma adaptação das suas culturas para que seja menos exigente. Neste contexto de alterações climáticas, a solução fácil é ir por barragens e açudes, mas não se pensa na mudança de comportamentos nem pela adaptação, com colheitas menos exigentes”, conclui o biólogo.
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Municípios da Lezíria já possuem estratégia de adaptação às alterações climáticas

Os municípios que fazem parte da Comunidade Intermunicipal da Lezíria do Tejo (CIMLT) já têm em mãos, cada um deles, a sua Estratégia Municipal de Adaptação às Alterações Climáticas (EMAAC). O objetivo passa por desenvolver competências, projetos e estratégias no fundo nas mais diversas áreas de atuação das câmaras municipais face às alterações climática. Da agricultura, passando pela biodiversidade, recursos hídricos, economia, energia, florestas, saúde, segurança de pessoas e bens, até aos transportes e comunicações e zonas ribeirinhas, a CIMLT apresenta um estudo em que analisa os vários indicadores face ao presente e ao que se projeta no futuro.

São ainda apresentadas algumas medidas práticas,  quase chave na mão, para cada um dos concelhos, até com alguma dotação orçamental a pensar nos impactes e nas vulnerabilidades que as alterações climáticas acarretam.
No concelho de Benavente, os quadros de seca têm tido o seu impacte na lezíria ribatejana, mas há outros limiares críticos ultrapassados, nomeadamente, quando falamos em perda de fauna, com foram os diversos episódios de peixes mortos no Sorraia, mas também estão identificadas situações de contaminação de águas. Algumas das ações preconizadas para se levar a cabo no curto, médio, e longo prazo, naquele concelho, passam pela renaturalização dos ecossistemas ribeirinhos com requalificação da galerias ripícolas e linhas de água com limpeza e reabilitação das margens, e introdução de vegetação autóctone. O estudo da CIMLT prevê ainda plantação de mais árvores autóctones em meio urbano, mas também intensificar as ações de sensibilização sobre eficiente uso de recursos: água, solos, energia, e qualidade do ar junto de agricultores, comunidade escolar, profissionais da saúde e comunidade em geral. Ainda para o concelho de Benavente preconiza-se a adoção de projetos de hortas comunitárias, a criação de estruturas de retenção para aproveitamento da água das piscinas, a aquisição de mais veículos e tecnologias relacionados com o combate a incêndios por parte da Proteção Civil, e no capítulo das inundações em meio urbano: fazer-se a limpeza dos locais considerados como pontos negros, nomeadamente, na zona entre a Nutricereal Foods e o estaleiro da Câmara, bem como Jardim dos Álamos e Reservatório das Acácias.

No caso do concelho do Cartaxo, a seca e o aumento número de pragas como a mosca branca são algumas das vulnerabilidades identificadas. É clássica ainda a submersão de estradas com cortes de vias e rombos no dique de Valada com a população a ficar sem acesso à energia elétrica. Algumas das medidas preconizadas para este concelho passam pela requalificação das linhas de água; em articulação quer com a Agência Portuguesa do Ambiente, quer com proprietários privados. O município deve, ainda, e no médio prazo, arborizar eixos urbanos do concelho, criar corredores verdes, fazer a adequada manutenção da gestão das faixas de combustível; melhorar a rede de drenagem, monitorizar a qualidade do ar, e adaptar medidas de eficiência energética nos edifícios.

O fenómeno da seca transversal aos municípios da CIMLT também tem provocado os seus efeitos no concelho de Salvaterra de Magos, e também aqui é recomendada a requalificação das linhas de água, manutenção das faixas de combustível, mas também a manutenção da Mata Nacional do Escaroupim em articulação com o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas.

No caso de Azambuja, os efeitos da seca têm tido impacte na colheita do tomate com  temperaturas elevadas que levam ao amadurecimento do fruto dois meses antes da época. A mosca branca também aqui é uma realidade.
Novos espaços verdes, requalificação de linhas de água, manutenção da Mata Nacional de Virtudes, reabilitação estrutural dos diques no Tejo e do açude na Vala Real de Azambuja, monitorização da qualidade do ar, eficiência energética, promoção de grupos de trabalho para o estudo e melhoria da gestão da água e promoção da sua eficiência no regadio da Lezíria do Tejo são algumas das medidas para este concelho. 
​Vila Franca quer elevar o Tejo a “praça pública” de lazer e mobilidade
 
A Câmara Municipal de Vila Franca de Xira integrada na Área Metropolitana de Lisboa (AML), assinou, no final do ano passado, o compromisso público de adotar medidas para minimizar os efeitos das alterações climáticas na região. O Plano Metropolitano de Adaptação às Alterações Climáticas apresentado pela AML (PMAAC-AML), de acordo com a Câmara, vai permitir estabelecer o nível de prioridade de adaptação atual para o horizonte 2020-2040 e os principais riscos climáticos. Vários fatores de risco foram analisados à escala metropolitana, designadamente a subida do nível do mar, secas, cheias e calor extremo.
 
A autarquia diz estar focada em alguns eixos prioritários tendo em conta o fenómeno como as situações de seca, as cheias e inundações associadas às cheias estuarinas, e a subida do nível média das águas do mar. Um estudo do Centro de Estudos e Geografia e Ordenamento do Território sustenta que cerca de 7843 indivíduos residem em zona inundável e afetada pela subida do nível médio das águas do mar no concelho de Vila Franca, e 5507 edifícios estejam também expostos a esta consequência. Aliás segundo um estudo relacionado com esta temática também Azambuja e Benavente são outros dos concelhos que poderão sofrer fortemente a subida do nível médio da água dos oceanos.
 
Para fazer face às principais vulnerabilidades identificadas ao nível de eventos extremos de temperatura, redução de precipitação e secas, estão delineados alguns projetos que procuram fomentar a proteção ambiental, a produção e o consumo sustentáveis, a redução do impacto do calor urbano e a preservação da biodiversidade.
 
O Ecobairro na Póvoa de Santa Iria é um desses projetos com a requalificação dos espaços exteriores de modo numa lógica natural e ecológica, e que passa pelas hortas urbanas no espaço público com 123 talhões. Contempla ainda a implementação de medidas sustentáveis na gestão dos espaços exteriores e na recolha de resíduos urbanos (redução de consumos de água, através da utilização de espécies com menores necessidades hídricas, painéis solares para a gestão do sistema de rega); e o programa “Eco-famílias”  que pretende ensinar como reduzir os consumos de eletricidade e de água a nível doméstico, bem como melhorar os hábitos de mobilidade e de encaminhamento de resíduos.
 
Neste capítulo das alterações climáticas, a autarquia tem dado privilégio a corredores ecológicos em detrimento dos tradicionais canteiros em zonas verdes e com pouca expressividade. Sendo assim foi realizada uma intervenção de requalificação e arborização na principal artéria de circulação, na Nacional 10, entre Alverca do Ribatejo e Póvoa de Santa Iria com adoção de espécies vegetais mais resilientes às alterações climáticas; e adoção de espécies vegetais autóctones e com reduzidas necessidades hídricas.
 
A fim de dar resposta aos riscos climáticos de eventos extremos de precipitação, está equacionado um corredor azul intermunicipal com a requalificação da frente ribeirinha do concelho que aponta para a renaturalização das linhas de água e sobretudo elevar o Tejo enquanto “praça pública” e da identidade vilafranquense como espaço de lazer, cultura e mobilidade. Criação de ciclovias, caminhos pedonais, e aplicação de soluções técnicas de engenharia natural em taludes e linhas de água são algumas das medidas.

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No capítulo das linhas de água, a Câmara pretende continuar a requalificar a frente ribeirinha, manter zonas tampão para zonas sensíveis e naturais como é o caso do leito de cheia, restaurar habitats ribeirinhos, preservar a biodiversidade.
 
Estão previstas intervenções na Ribeira dos Caniços; Ribera da Verdelha; Rio Crós-Crós; Rio da Silveira; Ribeira de Santo António; Ribeira de Santa Sofia; Rio Grande da Pipa. Aumento da capacidade de escoamento das redes de drenagem; ordenamento de “áreas urbanas sensíveis”; criação de novas áreas de recreio ativo; reabilitação de infraestruturas da rede de drenagem de águas residuais; execução de rede separativa de drenagem; renaturalização de troços de ribeiras urbanas com intervenções de engenharia natural são outras das medidas.
 
 Já no que respeita às infraestruturas existentes ou a construir na proximidade do rio Tejo, como é o caso da recente urbanização “Vila Rio” na Póvoa de Santa Iria, que por se encontrar em zona ribeirinha sujeita a inundações,  tem sido alvo de críticas, o município argumenta que que no âmbito da última revisão do Plano Diretor Municipal, foi realizado um estudo hidráulico e hidrológico pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil, que identificou todas as áreas inundáveis do concelho e que já teve em consideração a subida expetável do nível das águas do mar. No âmbito desta revisão do PDM e em função dele, ficaram delimitadas as zonas não inundáveis e por isso mesmo passíveis de edificação. No cumprimento estrito do PDM, “a Câmara Municipal apenas tem vindo a licenciar novas construções nas áreas não identificadas como inundáveis, como é o caso da Urbanização mencionada na Póvoa de Santa Iria”.
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​Alenquer é laboratório vivo da descarbonização

A região Oeste também já apresentou o seu Plano Intermunicipal de Adaptação às Alterações Climáticas (OESTE PIAAC). Contém cartografia de risco para as principais vulnerabilidades climáticas e medidas de adaptação tendo em atenção uma visão de futuro para a região que abrange algumas medidas também para os municípios de Alenquer e Arruda dos Vinhos, (os que estão na área de abrangência do nosso jornal). No caso de Alenquer, o PIIAC preconiza medidas como a conservação do solo e linhas de água, criação de uma rede municipal de conservação da natureza (rede Custódia), mas também compilação de informação sobre biodiversidade existente- Montejunto/Canhão Cársico de Ota; controlo da contaminação do meio hídrico por descargas difusas como é o caso de algumas indústrias da atividade suinícola. Alenquer deve ainda estender a rede separativa de captação e drenagem de águas pluviais e domésticas. Já no caso de Arruda a atenção recai sobre a ampliação da reserva de depósitos de água para abastecimento público, ou ainda a implementação de técnicas e práticas agrícolas de conservação e proteção dos solos.

Pedro Folgado, presidente da Câmara de Alenquer e da Oestecim, refere que o plano passa muito pela sensibilização, e nesse sentido foi criada uma mascote, a “Maria” que vai passar pelas escolas e não só com o objetivo de elucidar para a temática. A Oestecim procurará ainda a captação de verbas a nível comunitário para aplicação nos territórios. A descarbonização e a eficiência energética são apenas algumas das medidas. A região vai ficar dotada de um dos maiores parques de luzes led na iluminação pública do mundo, espalhada pela totalidade dos 12 municípios.
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O município de Alenquer foi um dos escolhidos, entre várias candidaturas, para a criação de um Laboratório Vivo para a Descarbonização com financiamento do Fundo Ambiental do Governo. Através de soluções tecnológicas, que aumentem a eficiência e reduzam o consumo de energia, pretende-se melhorar a qualidade de vida dos cidadãos e das comunidades.
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Neste sentido, teve início uma experiência que passa pela redução de CO2 na vila de Alenquer com menos paragens dos autocarros no interior da vila. Os autocarros deixaram de circular na rua Sacadura Cabral e na rua Triana. “Vamos avaliar o empenho de cada um neste processo. Todos falam em serem amigos do ambiente, mas ver até que ponto é que isso acontece na vida de cada um é algo que vamos querer observar. Vamos insistindo com as pessoas para que mudem os seus hábitos”, refere Pedro Folgado.
A iluminação dos edifícios públicos com luzes LED, sistemas de rega com redução de caudal e o incentivo ao uso de veículos elétricos, são algumas das outras medidas no âmbito do Laboratório Vivo já desenvolvidas ou em desenvolvimento. A Câmara quer ainda implementar o aquecimento e a refrigeração na biblioteca através de recursos hídricos, “mas esse processo ainda está a ser estudado com a Universidade de Évora”. Por outro lado, quer-se apostar no estacionamento gratuito para veículos elétricos. Estão ainda a ser montados carregadores elétricos na vila. 

Arruda vai perguntar aos munícipes o que querem para o futuro tendo em conta as alterações climáticas

A Câmara Municipal de Arruda dos Vinhos tem em marcha um grande inquérito à população tendo como pano de fundo as alterações climáticas em colaboração com a Universidade Nova de Lisboa. Esse protocolo com a instituição académica visa, segundo o presidente da Câmara de Arruda, André Rijo, fazer o estudo com base num inquérito, e a partir daí organizar no futuro uma convenção com a apresentação dos resultados com painéis temáticos para a construção de um documento estratégico, atendendo ao plano que já existe a nível da Comunidade Intermunicipal do Oeste (Oestecim).
O objetivo é que o documento que venha a ser criado tenha um valor vinculativo para as próximas décadas no município, “que una o setor social e empresarial como elementos chave”.

Porventura pouco familiarizada com o conceito de alterações climáticas, a população que é chamada a pronunciar-se  poderá ter algumas dificuldades em conseguir dar as achegas necessárias. O presidente da Câmara refere que o tema está a ser trabalhado em fóruns locais como o Conselho Municipal da Educação, juntas de freguesia, movimento associativo. Por outro lado, cada agregado familiar vai receber um inquérito junto com a fatura da água com envelope RSF para remeter as respostas para o município. O inquérito também será disponibilizado online. “Este é um tema central e todos devemos estar conscientes da urgência no seu debate”.
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André Rijo identifica desde logo alguns setores por onde a mudança deve passar como o domínio agrícola e a adoção de medidas de conservação dos solos, a eficiência energética, a gestão dos recursos hídricos, o uso do transporte coletivo como meio preferencial de deslocação “e em parte é o que já estamos a fazer no seio da Oestecim com o plano de apoio à redução tarifária”.
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Alterações climáticas é o maior desafio do setor dos vinhos

O setor da vinha e do vinho é dos mais sensíveis ao fenómeno das alterações climáticas. O Valor Local esteve na Sociedade Agrícola Casal do Conde, em Porto de Muge, Cartaxo, uma das produtoras da região dos Vinhos do Tejo.
Verónica Pereira, enóloga há cerca de sete anos, tem assistido a diversas transformações sempre que se fala nos impactes das alterações climáticas. É sabido que os vinhos estão cada vez mais alcoólicos e as vindimas fazem-se mais cedo. A maturação das uvas já não tem o mesmo ritmo de antigamente, e os processos para se fazer melhor vinho também têm de acompanhar a revolução climatérica em curso neste setor, com constantes adaptações.

“Temos vindo a assistir a um desfasamento entre a maturação alcoólica que é a carga em açúcar das uvas, e a maturação fenólica relacionada com componentes como os taninos (caule dos cachos)”. Ambas não acontecem ao mesmo tempo como seria suposto e isso dá azo “a vinhos mais vegetais, mais verdes”, refere a enóloga. “No fundo estamos perante um desequilíbrio”. O calor influencia esses comportamentos da vinha. “Nota-se um antecipar das culturas com maturações cada vez mais rápidas. A vindima este ano começou no início de agosto. Há 30 anos começava-se no final de setembro.”
O calor e a falta de água conseguem ter efeitos gigantescos do dia para a noite nestas culturas. “No ano passado, comecei a fazer controlos de maturação em julho, com 10,5º, 11º, e pensei que as uvas conseguiriam aguentar bem até aos 13,5º; 14º até que a vindima começasse. De repente houve uma semana com temperaturas de 45º e as uvas dispararam logo para os 15º ”. Verónica Pereira recorda, ainda, que o escaldão de há dois anos causou graves prejuízos na vinha.

Para fazer face a estas imprevisibilidades há medidas que podem ser adotadas, a começar por “desfolhas menos intensas”. Esta técnica consiste na retirada de parras à volta da videira para deixar entrar melhor o calor para uma maturação mais homogénea dos frutos, de forma a se conseguir mais circulação de ar no sentido de se evitar o desenvolvimento de um ambiente mais húmido e propício aos fungos”. “Se calhar vamos ter de proteger mais os frutos com mais cobertura vegetal tendo em conta os escaldões e a subida vertiginosa das temperaturas de um momento para o outro”.

Com as alterações climáticas a influenciarem a maturação das uvas, cabe à posteriori ao enólogo todo um trabalho de laboratório com vista à obtenção de um resultado que seja equilibrado. “Hoje já temos muita tecnologia sem recurso a produtos químicos, e que pode passar pela mistura de vinhos, a eletrodiálise que consegue estabilizar o vinho a nível das proteínas e da acidez. Podemos, no caso dos brancos, retirar as proteínas com bentonite. É possível, ainda, operar uma estabilização tartárica que pode ser realizada pelo frio, e levar o vinho a uma temperatura fria com vista à formação de uns cristais e que saem através de filtração”. Usar mais frio e mais eletrodiálise é o futuro neste equilíbrio “o que é caro porque esse processo elétrico tem de ser contratado, não temos aqui na quinta”.
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Para contornar o fenómeno das alterações climáticas, os vitivinicultores, na sua opinião, devem preservar cada vez mais as castas autóctones, porque são “as que têm mais potencial se um dia isto mudar mesmo a sério”. “Não podemos ter aqui no Tejo só Castelão e Fernão Pires, mas que isto seja a base. No fundo é como se nós emigrássemos para a Rússia. Teríamos mais dificuldade de nos adaptarmos ao frio em comparação com quem lá vive desde sempre, o mesmo se passa com a natureza e com as castas”. “As castas são como as pessoas. Podem ir para qualquer lado, e tanto podem dar-se bem como mal”. Fixar azoto nos campos com técnicas de arrelvamento nas entrelinhas da vinha é também outra hipótese pois permite diminuir o fenómeno da erosão. Acompanhar este fenómeno é um desafio diário e no fundo recheado de alguma imprevisibilidade com os enólogos a terem de mostrar o que valem para garantir a qualidade dos néctares.


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