São histórias na primeira pessoa de quem perdeu o marido, a amiga, o filho ou a mãe num acidente na Nacional 3. À medida que vai crescendo o movimento Plataforma Nacional 3 que pugna por uma intervenção nesta via, que a Infraestruturas de Portugal teima em adiar há vários anos, damos voz ao sofrimento e ao luto de quatro moradores em Azambuja. O troço entre o Carregado e esta vila ribatejana é considerado dos mais perigosos da estrada em causa.
Sílvia Agostinho
27-04-2018 às 11:11
Sílvia Agostinho
27-04-2018 às 11:11
Dizem que a morte de um filho é a pior perda que um ser humano pode enfrentar. Elisabeta Horta vivenciou esse momento há 11 anos atrás mas conta que é como se tivesse sido ontem. “Foi enlouquecedor e desesperante”, diz ao mesmo tempo que as lágrimas lhe caem pelo rosto. O seu filho era Pedro Salema, bombeiro de profissão, que seguia de Azambuja para Vila Nova da Rainha para cumprir mais um serviço, como tantos outros que já tinha feito. Desde os 18 anos que trabalhava na corporação local. Faleceu aos 26 anos no dia sete de agosto de 2007. “O sentimento de impotência foi enorme”.
Neste caso, o veículo dos bombeiros que era conduzido por Pedro Salema foi alvo de uma manobra perigosa por parte do camião, mas refere que lhe foram contadas “variadíssimas versões”. “Foi-me dito que o indivíduo levava os vidros fechados, não ouviu as sirenes e quando viu a ambulância no meio da estrada achou que conseguia passar à mesma”, conclui, refletindo que “qualquer pessoa tem noção do que é um carro de socorro, e ao deparar-se com uma ambulância devia parar para deixar passar. Ora com um camião todo atravessado na estrada era impossível contornar”. O pesado estava a sair do Pingo Doce, em frente à antiga Opel, um dos locais igualmente emblemáticos na Nacional 3 sempre que se fala de acidentes. Com Pedro Salema seguia outro colega que saiu ileso. Pedro Salema teve morte imediata.
Para trás ficava uma carreira dedicada aos soldados da paz. Desde muito pequeno que Pedro Salema e o seu irmão André Salema, hoje presidente dos bombeiros de Azambuja, que por viverem nas imediações do quartel, vinham brincar e contactar de perto com os bombeiros da altura. “Fugiam de casa e quem os queria ver era aqui no parque de viaturas com os bombeiros mais velhos a ensinarem-lhes coisas da profissão”. Bombeiro experiente, era também “um condutor experiente com uma condução bastante segura”. “Fizemos muitas viagens longas à minha terra”. A emergência era a área preferida deste bombeiro, “embora também tenha passado pro situações complicadas também em fogos.
O risco está em toda a parte”. Contudo “não deixa de ser terrível o facto de se morrer tão perto de casa ou do sítio onde se trabalha, principalmente quando a família tem de passar todos os dias nesse local”. “Não há dia nenhum da minha vida que não me lembre”. Desde há 11 anos, que lida com uma depressão, ao ponto de “ter passado por uma fase em que não conseguia chorar. Hoje já expresso os meus sentimentos de forma diferente mas é muito difícil”.
Para Elisabeta Horta, os condutores têm cada vez menos cuidado e “independentemente do que aconteceu ao meu filho vejo que os camionistas não são melhores. Vejo com frequência situações de grande perigo nesta estrada, como ainda ontem na rotunda da Sonae. Não fazem pisca. Estão lá no alto e é andar”. Já quanto à ação da Plataforma considera que “é benéfica no sentido em que chama a atenção para esta causa, porque embora haja cada vez mais pesados, ajudaria a que houvesse mais traços contínuos ou mais algumas rotundas, sinalização”.
Quanto ao camionista que esteve na origem do acidente, refere que nunca a procurou para um pedido de desculpas, “mas ainda bem porque prefiro não encarar com a pessoa que matou o meu filho, no fundo ele matou o meu filho”. “Sei que ele passou por uma fase psicológica difícil em resultado do acidente porque na altura ainda era jovem, mas prefiro não o conhecer. Nada do que pudesse dizer me serviria de consolo e não quero ficar com a imagem dessa pessoa na minha vida”.
Hoje em dia tenta viver um dia de cada vez: “Isolei-me mais. Antigamente era mais comunicativa, embora não em excesso, mas noto que tenho tendência a fechar-me”. Recentemente a Liga de Bombeiros entregou à família o crachá de ouro. “Não é 11 anos depois que se presta homenagem, mas não deixa de ser uma lembrança”.
A morte deste soldado da paz consternou toda a região, mas em particular todo o corpo ativo de Azambuja. À época o comandante dos voluntários de Azambuja, Pedro Cardoso, não conseguiu disfarçar a emoção de ver partir Pedro Salema. O operacional reiterou a confiança no seu grupo de trabalho, agradecendo inclusive o apoio demonstrado pela população e pelo corpo de bombeiros de Azambuja naquele momento sensível da associação.
As cerimónias fúnebres de Pedro Salema foram bastante carregadas de emoção. População, conhecidos e desconhecidos, todos quiseram prestar a sua última homenagem. Rui Pereira à época ministro da Administração Interna e os mais altos quadros da Liga estiveram presentes nas cerimónias, que marcaram a associação, que poucos anos mais tarde viria a perder outro elemento, Francisco Graça, também ele grande amigo de Pedro. Elisabeta Horta diz também que Francisco Graça foi um dos grandes ombros amigos que teve após a partida de Pedro – “Ia-me buscar de carro muitas vezes e saíamos para dar uma volta”. As fotografias de ambos estão penduradas uma ao lado da outra numa das salas da corporação.
Neste caso, o veículo dos bombeiros que era conduzido por Pedro Salema foi alvo de uma manobra perigosa por parte do camião, mas refere que lhe foram contadas “variadíssimas versões”. “Foi-me dito que o indivíduo levava os vidros fechados, não ouviu as sirenes e quando viu a ambulância no meio da estrada achou que conseguia passar à mesma”, conclui, refletindo que “qualquer pessoa tem noção do que é um carro de socorro, e ao deparar-se com uma ambulância devia parar para deixar passar. Ora com um camião todo atravessado na estrada era impossível contornar”. O pesado estava a sair do Pingo Doce, em frente à antiga Opel, um dos locais igualmente emblemáticos na Nacional 3 sempre que se fala de acidentes. Com Pedro Salema seguia outro colega que saiu ileso. Pedro Salema teve morte imediata.
Para trás ficava uma carreira dedicada aos soldados da paz. Desde muito pequeno que Pedro Salema e o seu irmão André Salema, hoje presidente dos bombeiros de Azambuja, que por viverem nas imediações do quartel, vinham brincar e contactar de perto com os bombeiros da altura. “Fugiam de casa e quem os queria ver era aqui no parque de viaturas com os bombeiros mais velhos a ensinarem-lhes coisas da profissão”. Bombeiro experiente, era também “um condutor experiente com uma condução bastante segura”. “Fizemos muitas viagens longas à minha terra”. A emergência era a área preferida deste bombeiro, “embora também tenha passado pro situações complicadas também em fogos.
O risco está em toda a parte”. Contudo “não deixa de ser terrível o facto de se morrer tão perto de casa ou do sítio onde se trabalha, principalmente quando a família tem de passar todos os dias nesse local”. “Não há dia nenhum da minha vida que não me lembre”. Desde há 11 anos, que lida com uma depressão, ao ponto de “ter passado por uma fase em que não conseguia chorar. Hoje já expresso os meus sentimentos de forma diferente mas é muito difícil”.
Para Elisabeta Horta, os condutores têm cada vez menos cuidado e “independentemente do que aconteceu ao meu filho vejo que os camionistas não são melhores. Vejo com frequência situações de grande perigo nesta estrada, como ainda ontem na rotunda da Sonae. Não fazem pisca. Estão lá no alto e é andar”. Já quanto à ação da Plataforma considera que “é benéfica no sentido em que chama a atenção para esta causa, porque embora haja cada vez mais pesados, ajudaria a que houvesse mais traços contínuos ou mais algumas rotundas, sinalização”.
Quanto ao camionista que esteve na origem do acidente, refere que nunca a procurou para um pedido de desculpas, “mas ainda bem porque prefiro não encarar com a pessoa que matou o meu filho, no fundo ele matou o meu filho”. “Sei que ele passou por uma fase psicológica difícil em resultado do acidente porque na altura ainda era jovem, mas prefiro não o conhecer. Nada do que pudesse dizer me serviria de consolo e não quero ficar com a imagem dessa pessoa na minha vida”.
Hoje em dia tenta viver um dia de cada vez: “Isolei-me mais. Antigamente era mais comunicativa, embora não em excesso, mas noto que tenho tendência a fechar-me”. Recentemente a Liga de Bombeiros entregou à família o crachá de ouro. “Não é 11 anos depois que se presta homenagem, mas não deixa de ser uma lembrança”.
A morte deste soldado da paz consternou toda a região, mas em particular todo o corpo ativo de Azambuja. À época o comandante dos voluntários de Azambuja, Pedro Cardoso, não conseguiu disfarçar a emoção de ver partir Pedro Salema. O operacional reiterou a confiança no seu grupo de trabalho, agradecendo inclusive o apoio demonstrado pela população e pelo corpo de bombeiros de Azambuja naquele momento sensível da associação.
As cerimónias fúnebres de Pedro Salema foram bastante carregadas de emoção. População, conhecidos e desconhecidos, todos quiseram prestar a sua última homenagem. Rui Pereira à época ministro da Administração Interna e os mais altos quadros da Liga estiveram presentes nas cerimónias, que marcaram a associação, que poucos anos mais tarde viria a perder outro elemento, Francisco Graça, também ele grande amigo de Pedro. Elisabeta Horta diz também que Francisco Graça foi um dos grandes ombros amigos que teve após a partida de Pedro – “Ia-me buscar de carro muitas vezes e saíamos para dar uma volta”. As fotografias de ambos estão penduradas uma ao lado da outra numa das salas da corporação.
Filipa Oliveira:
"Alcoitão foi uma escola de vida"
Tudo aconteceu na madrugada de oito de novembro de 2016. Quatro amigas de Azambuja regressavam de Lisboa. Tinham ido assistir a um concerto da fadista Carminho. O acidente foi notícia na imprensa regional e nacional. Um veículo onde seguia um homem despistou-se e foi embater violentamente no automóvel onde seguiam as quatro jovens. Uma dela, Marta Fazendas, de Alcoentre não conseguiu resistir ao choque. O acidente ocorrido na Nacional 3 junto à Jular atirou para o coma durante 10 dias Filipa Oliveira que, passado um ano e meio, ainda não conseguiu recuperar a mobilidade, deslocando-se numa scouter sempre que sai de casa. Foi com ela que nos encontrámos. É uma das três sobreviventes deste acidente que chocou Azambuja.
Com frequência saía com aquele grupo de amigas, mas devido ao acidente, não guarda quaisquer memórias daquele dia. “O acidente foi numa segunda-feira, e apenas me recordo do que aconteceu no domingo”. Na prática, “o que sei foi o que me contaram, que tínhamos ido a um concerto, e que no regresso deu-se o acidente”. O embate fez com que o veículo onde as jovens seguiam tivesse entrado nas instalações da Jular, “tendo ido parar lá abaixo de marcha atrás”. Esteve internada em Santa Maria tendo sido transportada de helicóptero. No local estiveram várias corporações de bombeiros, Cruz Vermelha, e VMER. Atenta às questões que rodeiam esta via, estava longe de imaginar que um dia o azar também lhe bateria à porta como a tantas outras pessoas que por ali circulam todos os dias, – “A questão do trânsito de pesados é um problema, assim como, o dos peões que circulam de noite e mal se veem no escuro, mas nunca pensei que um dia podia sofrer uma coisa destas”.
O facto de não se lembrar do acidente e de como tudo aconteceu, acabou por apenas ser algo positivo no início. “Não me recordar do choque em si acabou naqueles dias por ser mais fácil de ultrapassar quando fui despertada do coma. Mas depois surgem muitas perguntas que ninguém me sabia responder”. As outras duas colegas que sobreviveram ao acidente também não ficaram com memórias daquele episódio. “Isso causa-nos alguma angústia não saber o que aconteceu, tendo em conta também que perdemos uma pessoa próxima. Não chegamos a saber se tinha sofrido, se faleceu logo ou não. No início também não me queriam contar o que se tinha passado com ela”.
Quando acordou do coma, recorda que não conseguia comunicar. Ainda estava intubada e então escrevia ou apontava para letras em quadros. Hoje é com alguma boa disposição que vai enfrentando a vida, e quando lhe perguntamos das mazelas que sofreu, ri-se e sintetiza – “Aconteceu-me basicamente um bocadinho de tudo”. “Parti o externo, a omoplata, dez costelas de um lado, seis do outro, cortei a barriga com o cinto, parte do fígado, e do intestino também. O baço já lá vai”. Ainda não consegue andar “porque as pernas ficaram esmagadas”. Diz que está à espera que o organismo consiga fazer com que o osso nasça. “Já fiz enxertos na ilíaca e fui operada a uma das pernas três vezes. Mas na outra perna o espaço sem osso é maior. Falam-me que é preciso tempo, mas ninguém me dá respostas”. Ainda tem esperança de recuperar a mobilidade mas refere que nunca mais vai ser a mesma pessoa porque as lesões foram muito grandes. “Por vezes não nos damos conta de como a nossa vida muda quando algo deste género vem alterar aquilo a que estamos habituados como entrar em determinados espaços, movimentarmo-nos livremente”.
Hoje em dia passa a manhã na fisioterapia em tratamentos, mas confessa que já sente falta de uma rotina normal a nível de trabalho. Quanto ao condutor que esteve na origem do acidente, Filipa Oliveira refere que já o conhecia de vista mas que nunca houve qualquer tipo de aproximação ou pedido de desculpas.
Uma das maiores lições que retira deste acontecimento foi ao passar pelo Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, porque “estava sempre a pensar no meu caso e no porquê de me ter acontecido isto, mas ao entrar lá vi pessoas com casos piores do que o meu. Foi uma escola de vida, e isso para mim fez a diferença, porque pensei que apesar de tudo ainda consigo ser útil e não ser dependente nem dar trabalho a ninguém”. A família também fez a diferença no processo de recuperação bem como “outras pessoas que apareceram para dar apoio”. “Havia dias em que já não tinha paciência para tantas visitas mas hoje em dia dou valor a isso”. “Fez completamente a diferença”.
Quanto ao movimento cívico Plataforma Nacional 3, Filipa Oliveira considera que faz todo o sentido porque apesar de “os acidentes não acontecerem só aqui, a verdade é que há cada vez mais trânsito e perigos nesta via, também com cada vez mais carros nas bermas. A estrada não consegue responder ao aumento de tráfego. Tem de haver uma mudança. É claro que este acidente podia ter acontecido noutra estrada qualquer, mas se conseguirmos mudar algo aqui podemos sempre evitar coisas piores”. E reforça: “No sítio onde aconteceu o acidente, porventura o condutor vinha bastante à vontade porque a estrada é muito larga, se houvesse ali um separador central, seria diferente”. Filipa Oliveira tenta agora “viver um dia de cada vez” e refere que tenta dar o máximo valor às coisas, “principalmente às pessoas que nos querem bem”.
"Alcoitão foi uma escola de vida"
Tudo aconteceu na madrugada de oito de novembro de 2016. Quatro amigas de Azambuja regressavam de Lisboa. Tinham ido assistir a um concerto da fadista Carminho. O acidente foi notícia na imprensa regional e nacional. Um veículo onde seguia um homem despistou-se e foi embater violentamente no automóvel onde seguiam as quatro jovens. Uma dela, Marta Fazendas, de Alcoentre não conseguiu resistir ao choque. O acidente ocorrido na Nacional 3 junto à Jular atirou para o coma durante 10 dias Filipa Oliveira que, passado um ano e meio, ainda não conseguiu recuperar a mobilidade, deslocando-se numa scouter sempre que sai de casa. Foi com ela que nos encontrámos. É uma das três sobreviventes deste acidente que chocou Azambuja.
Com frequência saía com aquele grupo de amigas, mas devido ao acidente, não guarda quaisquer memórias daquele dia. “O acidente foi numa segunda-feira, e apenas me recordo do que aconteceu no domingo”. Na prática, “o que sei foi o que me contaram, que tínhamos ido a um concerto, e que no regresso deu-se o acidente”. O embate fez com que o veículo onde as jovens seguiam tivesse entrado nas instalações da Jular, “tendo ido parar lá abaixo de marcha atrás”. Esteve internada em Santa Maria tendo sido transportada de helicóptero. No local estiveram várias corporações de bombeiros, Cruz Vermelha, e VMER. Atenta às questões que rodeiam esta via, estava longe de imaginar que um dia o azar também lhe bateria à porta como a tantas outras pessoas que por ali circulam todos os dias, – “A questão do trânsito de pesados é um problema, assim como, o dos peões que circulam de noite e mal se veem no escuro, mas nunca pensei que um dia podia sofrer uma coisa destas”.
O facto de não se lembrar do acidente e de como tudo aconteceu, acabou por apenas ser algo positivo no início. “Não me recordar do choque em si acabou naqueles dias por ser mais fácil de ultrapassar quando fui despertada do coma. Mas depois surgem muitas perguntas que ninguém me sabia responder”. As outras duas colegas que sobreviveram ao acidente também não ficaram com memórias daquele episódio. “Isso causa-nos alguma angústia não saber o que aconteceu, tendo em conta também que perdemos uma pessoa próxima. Não chegamos a saber se tinha sofrido, se faleceu logo ou não. No início também não me queriam contar o que se tinha passado com ela”.
Quando acordou do coma, recorda que não conseguia comunicar. Ainda estava intubada e então escrevia ou apontava para letras em quadros. Hoje é com alguma boa disposição que vai enfrentando a vida, e quando lhe perguntamos das mazelas que sofreu, ri-se e sintetiza – “Aconteceu-me basicamente um bocadinho de tudo”. “Parti o externo, a omoplata, dez costelas de um lado, seis do outro, cortei a barriga com o cinto, parte do fígado, e do intestino também. O baço já lá vai”. Ainda não consegue andar “porque as pernas ficaram esmagadas”. Diz que está à espera que o organismo consiga fazer com que o osso nasça. “Já fiz enxertos na ilíaca e fui operada a uma das pernas três vezes. Mas na outra perna o espaço sem osso é maior. Falam-me que é preciso tempo, mas ninguém me dá respostas”. Ainda tem esperança de recuperar a mobilidade mas refere que nunca mais vai ser a mesma pessoa porque as lesões foram muito grandes. “Por vezes não nos damos conta de como a nossa vida muda quando algo deste género vem alterar aquilo a que estamos habituados como entrar em determinados espaços, movimentarmo-nos livremente”.
Hoje em dia passa a manhã na fisioterapia em tratamentos, mas confessa que já sente falta de uma rotina normal a nível de trabalho. Quanto ao condutor que esteve na origem do acidente, Filipa Oliveira refere que já o conhecia de vista mas que nunca houve qualquer tipo de aproximação ou pedido de desculpas.
Uma das maiores lições que retira deste acontecimento foi ao passar pelo Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, porque “estava sempre a pensar no meu caso e no porquê de me ter acontecido isto, mas ao entrar lá vi pessoas com casos piores do que o meu. Foi uma escola de vida, e isso para mim fez a diferença, porque pensei que apesar de tudo ainda consigo ser útil e não ser dependente nem dar trabalho a ninguém”. A família também fez a diferença no processo de recuperação bem como “outras pessoas que apareceram para dar apoio”. “Havia dias em que já não tinha paciência para tantas visitas mas hoje em dia dou valor a isso”. “Fez completamente a diferença”.
Quanto ao movimento cívico Plataforma Nacional 3, Filipa Oliveira considera que faz todo o sentido porque apesar de “os acidentes não acontecerem só aqui, a verdade é que há cada vez mais trânsito e perigos nesta via, também com cada vez mais carros nas bermas. A estrada não consegue responder ao aumento de tráfego. Tem de haver uma mudança. É claro que este acidente podia ter acontecido noutra estrada qualquer, mas se conseguirmos mudar algo aqui podemos sempre evitar coisas piores”. E reforça: “No sítio onde aconteceu o acidente, porventura o condutor vinha bastante à vontade porque a estrada é muito larga, se houvesse ali um separador central, seria diferente”. Filipa Oliveira tenta agora “viver um dia de cada vez” e refere que tenta dar o máximo valor às coisas, “principalmente às pessoas que nos querem bem”.
Reportagem em vídeo (Clique na seta para assistir às entrevistas ) |
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Pedro Félix:
"Nacional 3 é um estreito corredor que se transforma em sentença de morte"
O início do ano de 2016 foi marcado pela notícia que menos se espera ouvir. Num acidente de automóvel, ao anoitecer, e após chocar com um pesado que estava na berma, a mãe de Pedro Félix, residente também em Azambuja, perdeu a vida. Tudo aconteceu num instante, e o pai que ia a conduzir acabou por ficar sem a memória daqueles segundos fatídicos. Esta foi mais uma vítima de um clássico nesta via, o parqueamento de pesados na escapatória pela ausência de estacionamento para o efeito. Neste caso, o camionista estaria a jantar num restaurante em Vila Nova da Rainha e fez o de sempre, deixar o veículo ali bem perto, apesar de o estacionamento ser proibido.
Tinha acabado de chegar a casa quando recebeu um telefonema de um desconhecido que através do telefone do pai de Pedro Félix, tinha conseguido o seu número. “Disse-me que era uma situação complicada e pediu-me para que fosse até lá”. Quando chegou ao local, os bombeiros já lá estavam. “Foi uma experiência muito traumática que deixou marcas e continuará a deixar não só em mim, como no meu pai, no meu irmão, em toda a minha família”, refere.
Até hoje, e mesmo não se sabendo o que se passou, “certamente se a galera do camião não estivesse naquele local, possivelmente o meu pai conseguiria voltar à estrada depois do desvio, ou eventualmente parar com segurança na berma”. “Não sabemos se o meu pai se teria distraído ou se o acidente foi provocado pela ovalização da estrada”. A mãe de Pedro Félix, com 67 anos, ainda foi transportada de helicóptero para o hospital de Vila Franca de Xira, mas “nunca ficou claro se a sua morte tinha sido ou não imediata após o embate”. O pai que foi o sobrevivente deste acidente rumou ao hospital “bastante abalado e ainda em estado de choque”. “Demorou algum tempo a recuperar das mazelas físicas com um problema de coluna, mas ainda mais tempo a recuperar das questões psicológicas”.
Psicólogo de profissão, Pedro Félix diz que viver uma situação destas “não é mais fácil nem é mais difícil do que no resto das pessoas” que na vida tenham passado por uma experiência de perder um ente próximo, até porque “não conseguimos ser simultaneamente observador e objeto, apesar de ter as minhas estratégias para conseguir ter aqui algum equilíbrio mental, tal como todas as outras pessoas”. “Independentemente de conhecer os processos de luto, enquanto psicólogo passei por todas as fases normais. Foi muito complicado para mim, também enquanto pai ao ter de explicar ao meu filho que na altura tinha três anos”. Passados dois anos e poucos meses, reflete que “é um acontecimento que nos acompanha, embora recuperemos, fica a saudade”. Refere que não recorreu a nenhum colega, “mas antes aos amigos e familiares”.
A solidariedade da população foi também importante, “até porque a minha mãe era uma pessoa muito querida na comunidade”. “Tivemos várias demonstrações de apoio e de carinho”. A falta de condições na Nacional 3 acabou “por vir ainda mais ao de cima com este triste acontecimento do qual não gostaria de estar a falar na primeira pessoa”. Na sua opinião, o movimento Plataforma Nacional 3 “é de extrema importância”. Face ao que todos os dias acontece nesta via “tem de partir de nós cidadãos, a capacidade de nos mobilizarmos junto das entidades competentes que têm a obrigação de nos garantir o nosso bem-estar e qualidade de vida e segurança, que não existe nestas localidades junto à Nacional 3, como é o caso de Azambuja”. “Há horas em que a Nacional 3 se transforma num estreito corredor porque apesar de termos uma berma bastante generosa, a mesma está ocupada com camiões, e transforma-se numa sentença de morte. Mas temos ainda a ovalização da via, o trânsito de pesados, o acesso dos pesados à via, a ausência de separador central.”
"Nacional 3 é um estreito corredor que se transforma em sentença de morte"
O início do ano de 2016 foi marcado pela notícia que menos se espera ouvir. Num acidente de automóvel, ao anoitecer, e após chocar com um pesado que estava na berma, a mãe de Pedro Félix, residente também em Azambuja, perdeu a vida. Tudo aconteceu num instante, e o pai que ia a conduzir acabou por ficar sem a memória daqueles segundos fatídicos. Esta foi mais uma vítima de um clássico nesta via, o parqueamento de pesados na escapatória pela ausência de estacionamento para o efeito. Neste caso, o camionista estaria a jantar num restaurante em Vila Nova da Rainha e fez o de sempre, deixar o veículo ali bem perto, apesar de o estacionamento ser proibido.
Tinha acabado de chegar a casa quando recebeu um telefonema de um desconhecido que através do telefone do pai de Pedro Félix, tinha conseguido o seu número. “Disse-me que era uma situação complicada e pediu-me para que fosse até lá”. Quando chegou ao local, os bombeiros já lá estavam. “Foi uma experiência muito traumática que deixou marcas e continuará a deixar não só em mim, como no meu pai, no meu irmão, em toda a minha família”, refere.
Até hoje, e mesmo não se sabendo o que se passou, “certamente se a galera do camião não estivesse naquele local, possivelmente o meu pai conseguiria voltar à estrada depois do desvio, ou eventualmente parar com segurança na berma”. “Não sabemos se o meu pai se teria distraído ou se o acidente foi provocado pela ovalização da estrada”. A mãe de Pedro Félix, com 67 anos, ainda foi transportada de helicóptero para o hospital de Vila Franca de Xira, mas “nunca ficou claro se a sua morte tinha sido ou não imediata após o embate”. O pai que foi o sobrevivente deste acidente rumou ao hospital “bastante abalado e ainda em estado de choque”. “Demorou algum tempo a recuperar das mazelas físicas com um problema de coluna, mas ainda mais tempo a recuperar das questões psicológicas”.
Psicólogo de profissão, Pedro Félix diz que viver uma situação destas “não é mais fácil nem é mais difícil do que no resto das pessoas” que na vida tenham passado por uma experiência de perder um ente próximo, até porque “não conseguimos ser simultaneamente observador e objeto, apesar de ter as minhas estratégias para conseguir ter aqui algum equilíbrio mental, tal como todas as outras pessoas”. “Independentemente de conhecer os processos de luto, enquanto psicólogo passei por todas as fases normais. Foi muito complicado para mim, também enquanto pai ao ter de explicar ao meu filho que na altura tinha três anos”. Passados dois anos e poucos meses, reflete que “é um acontecimento que nos acompanha, embora recuperemos, fica a saudade”. Refere que não recorreu a nenhum colega, “mas antes aos amigos e familiares”.
A solidariedade da população foi também importante, “até porque a minha mãe era uma pessoa muito querida na comunidade”. “Tivemos várias demonstrações de apoio e de carinho”. A falta de condições na Nacional 3 acabou “por vir ainda mais ao de cima com este triste acontecimento do qual não gostaria de estar a falar na primeira pessoa”. Na sua opinião, o movimento Plataforma Nacional 3 “é de extrema importância”. Face ao que todos os dias acontece nesta via “tem de partir de nós cidadãos, a capacidade de nos mobilizarmos junto das entidades competentes que têm a obrigação de nos garantir o nosso bem-estar e qualidade de vida e segurança, que não existe nestas localidades junto à Nacional 3, como é o caso de Azambuja”. “Há horas em que a Nacional 3 se transforma num estreito corredor porque apesar de termos uma berma bastante generosa, a mesma está ocupada com camiões, e transforma-se numa sentença de morte. Mas temos ainda a ovalização da via, o trânsito de pesados, o acesso dos pesados à via, a ausência de separador central.”
Teresa Silva:
"Tiraram-me o chão debaixo dos pés"
De todos os acidentes que recordamos neste trabalho, é o mais recente. Em novembro do ano passado um homem que todos os dias rumava ao trabalho na Modis, muitas vezes de bicicleta, foi abalroado por um veículo ligeiro que não prestou auxílio. A viúva, Teresa Silva, é uma mãe com três filhos para criar, que aufere 640 euros por mês, que aguarda pela pensão de viuvez que lhe tem sido negada porque ainda não conseguiu reunir uma série de documentos como a autópsia porque lhe dizem que como o distrito de Lisboa é muito vasto ainda não foi possível. “A Segurança Social descarta-se para a seguradora do trabalho, que alega com a autópsia”, diz.
Desde o acidente que aconteceu há cinco meses que Teresa Silva tenta viver um dia de cada vez. O marido de Teresa tinha 33 anos, e segundo a mesma era uma pessoa atenta às condições de segurança. Apesar de não levar colete refletor, a bicicleta estava equipada com luzes à frente e atrás, “e houve testemunhas que puderam constatar isso mesmo”. O acidente deu-se junto às bombas da Galp. Há muitos anos que fazia aquele percurso à noite, umas vezes de carro outras de bicicleta. O homem que alegadamente esteve na origem do acidente é de Vila Nova da Rainha e seguiria com 0,56 gr de álcool no sangue acima do permitido por lei. O facto de não ter prestado auxílio é o que mais entristece esta viúva de 39 anos. “Porque acidentes todos podemos ter. Já me quiseram mostrar a cara dele no facebook mas tenho recusado. Prefiro não saber quem é”.
Naquela noite de 22 de novembro, “veio jantar a casa para depois voltar ao emprego, e como saiu relativamente cedo, foi de bicicleta. Despediu-se de mim bem-disposto e na brincadeira como muitas vezes acontecia. Do acidente pouco sei, telefonaram-me à meia-noite e dez minutos do hospital de São José. Disseram-me que tinha sido atropelado por um carro, e que o estado era muito grave”. “O meu marido ia sempre na berma, era extremamente cuidadoso. Há cerca de 12 anos que estava acostumado a regularmente usar a bicicleta nos trajetos”, lembra.
Ao saber do acidente e quando lhe disseram que estava em São José pensou logo que seria grave, mas queria acreditar que “chegava lá e ele estaria consciente”. Contudo e tendo em conta que foi falando com várias pessoas até chegar a Lisboa foi-se dando conta de que era mais grave, “porque perdeu logo massa encefálica na estrada”. “Vi o meu marido ligado às máquinas, com a cabeça ligada. Ainda esperei um milagre mas não aconteceu. A médica veio ter comigo, abanou a cabeça, e disse-me que as células dele estavam a morrer, que não havia nada a fazer. Disseram-me que teve 14 paragens cardiorrespiratórias e que tinha ficado mesmo em muito mau estado”. “Tiraram-me o chão debaixo dos pés por completo”.
Foi uma história de amor que durou 14 anos. “Uma vida toda que mudou, planos que não se cumpriram, muitos sonhos e alegrias que ficaram por viver, um Natal que veio logo a seguir e que não foi Natal”. Nos dias seguintes, “foi o estar à espera que ele entrasse em casa com o chinfrim da bicicleta. Tenho muitas saudades dele. Faz-me muita falta e também aos filhos”.
Não fora a polícia vir em sentido contrário na mesma altura em que ocorreu o acidente e ter visto faíscas a saírem debaixo do carro, hoje as circunstâncias sobre como ocorrera o mesmo podiam não ser conhecidas, visto que o alegado culpado não prestou auxílio. “Foi preso e posto em liberdade poucas horas depois, apesar de ter fugido a alta velocidade, segundo me disseram testemunhas. Fugiu com a bicicleta debaixo do carro. Os motivos que o levaram a isso só ele saberá”. Às autoridades terá dito que o marido de Teresa Silva “surgiu como um vulto e que se atravessou à sua frente, que estava vestido todo de escuro, o que é mentira”. Disse também que “tinha sido na rotunda da Avipronto, mas não foi, deu-se sim mais atrás. Nunca disse por que se pôs em fuga”. Teresa Silva espera que um dia “haja um pedido de desculpas porque virou a minha vida do avesso, e deixou uma família completamente destruída”. “Dizem-me que esse senhor continua a beber. Não sei se é verdade ou não. Mas fugir e deixar o meu marido na valeta deveria pesar-lhe a consciência”.
Quando a Plataforma Cívica Nacional 3 lançou a petição que se destinava a recolher assinaturas para que este tema subisse a discussão na Assembleia da Republica, ainda antes da fatalidade que aconteceu à sua família, Teresa Silva não hesitou em assinar e comentou com o marido – “Nunca se sabe se não podemos ser nós a ter um acidente. Estava longe de imaginar o que ia acontecer. Esta estrada é bastante perigosa. Na Ericeira (onde tem família), por exemplo a estrada é bastante movimentada e tem pistas para ciclistas e peões. Aqui circulam dezenas de pessoas que vêm da Avipronto, que mal se veem. Não se vê preocupação com os peões. O meu marido chegou a ir colocar-me ao trabalho de carro porque tinha medo que atravessasse a estrada quando fosse de comboio”.
Teresa Silva trabalha também numa empresa de logística na zona industrial em frente à Sonae onde o marido exercia a função de administrativo. Onde trabalha têm-lhe dado “bastante apoio”, facilitando a nível de horários, também com apoio financeiro com o funeral. A Sonae apoiou através da Cruz Vermelha.
O caso foi encaminhado para o Ministério Público que também aguarda pela autópsia no sentido do processo avançar. “Gostava que fosse feita justiça, mas regra geral estes casos nunca dão em nada”, e vai mais longe: “Gostaria que o senhor se visse esta entrevista que pelo menos parasse de beber quando conduz, porque qualquer dia pode voltar a acontecer o mesmo, talvez nessa altura não tenha tanta sorte”. Teresa Silva desconhece se a pessoa em causa continua a ter carta ou não, mas dizem-lhe que continua a conduzir.
"Tiraram-me o chão debaixo dos pés"
De todos os acidentes que recordamos neste trabalho, é o mais recente. Em novembro do ano passado um homem que todos os dias rumava ao trabalho na Modis, muitas vezes de bicicleta, foi abalroado por um veículo ligeiro que não prestou auxílio. A viúva, Teresa Silva, é uma mãe com três filhos para criar, que aufere 640 euros por mês, que aguarda pela pensão de viuvez que lhe tem sido negada porque ainda não conseguiu reunir uma série de documentos como a autópsia porque lhe dizem que como o distrito de Lisboa é muito vasto ainda não foi possível. “A Segurança Social descarta-se para a seguradora do trabalho, que alega com a autópsia”, diz.
Desde o acidente que aconteceu há cinco meses que Teresa Silva tenta viver um dia de cada vez. O marido de Teresa tinha 33 anos, e segundo a mesma era uma pessoa atenta às condições de segurança. Apesar de não levar colete refletor, a bicicleta estava equipada com luzes à frente e atrás, “e houve testemunhas que puderam constatar isso mesmo”. O acidente deu-se junto às bombas da Galp. Há muitos anos que fazia aquele percurso à noite, umas vezes de carro outras de bicicleta. O homem que alegadamente esteve na origem do acidente é de Vila Nova da Rainha e seguiria com 0,56 gr de álcool no sangue acima do permitido por lei. O facto de não ter prestado auxílio é o que mais entristece esta viúva de 39 anos. “Porque acidentes todos podemos ter. Já me quiseram mostrar a cara dele no facebook mas tenho recusado. Prefiro não saber quem é”.
Naquela noite de 22 de novembro, “veio jantar a casa para depois voltar ao emprego, e como saiu relativamente cedo, foi de bicicleta. Despediu-se de mim bem-disposto e na brincadeira como muitas vezes acontecia. Do acidente pouco sei, telefonaram-me à meia-noite e dez minutos do hospital de São José. Disseram-me que tinha sido atropelado por um carro, e que o estado era muito grave”. “O meu marido ia sempre na berma, era extremamente cuidadoso. Há cerca de 12 anos que estava acostumado a regularmente usar a bicicleta nos trajetos”, lembra.
Ao saber do acidente e quando lhe disseram que estava em São José pensou logo que seria grave, mas queria acreditar que “chegava lá e ele estaria consciente”. Contudo e tendo em conta que foi falando com várias pessoas até chegar a Lisboa foi-se dando conta de que era mais grave, “porque perdeu logo massa encefálica na estrada”. “Vi o meu marido ligado às máquinas, com a cabeça ligada. Ainda esperei um milagre mas não aconteceu. A médica veio ter comigo, abanou a cabeça, e disse-me que as células dele estavam a morrer, que não havia nada a fazer. Disseram-me que teve 14 paragens cardiorrespiratórias e que tinha ficado mesmo em muito mau estado”. “Tiraram-me o chão debaixo dos pés por completo”.
Foi uma história de amor que durou 14 anos. “Uma vida toda que mudou, planos que não se cumpriram, muitos sonhos e alegrias que ficaram por viver, um Natal que veio logo a seguir e que não foi Natal”. Nos dias seguintes, “foi o estar à espera que ele entrasse em casa com o chinfrim da bicicleta. Tenho muitas saudades dele. Faz-me muita falta e também aos filhos”.
Não fora a polícia vir em sentido contrário na mesma altura em que ocorreu o acidente e ter visto faíscas a saírem debaixo do carro, hoje as circunstâncias sobre como ocorrera o mesmo podiam não ser conhecidas, visto que o alegado culpado não prestou auxílio. “Foi preso e posto em liberdade poucas horas depois, apesar de ter fugido a alta velocidade, segundo me disseram testemunhas. Fugiu com a bicicleta debaixo do carro. Os motivos que o levaram a isso só ele saberá”. Às autoridades terá dito que o marido de Teresa Silva “surgiu como um vulto e que se atravessou à sua frente, que estava vestido todo de escuro, o que é mentira”. Disse também que “tinha sido na rotunda da Avipronto, mas não foi, deu-se sim mais atrás. Nunca disse por que se pôs em fuga”. Teresa Silva espera que um dia “haja um pedido de desculpas porque virou a minha vida do avesso, e deixou uma família completamente destruída”. “Dizem-me que esse senhor continua a beber. Não sei se é verdade ou não. Mas fugir e deixar o meu marido na valeta deveria pesar-lhe a consciência”.
Quando a Plataforma Cívica Nacional 3 lançou a petição que se destinava a recolher assinaturas para que este tema subisse a discussão na Assembleia da Republica, ainda antes da fatalidade que aconteceu à sua família, Teresa Silva não hesitou em assinar e comentou com o marido – “Nunca se sabe se não podemos ser nós a ter um acidente. Estava longe de imaginar o que ia acontecer. Esta estrada é bastante perigosa. Na Ericeira (onde tem família), por exemplo a estrada é bastante movimentada e tem pistas para ciclistas e peões. Aqui circulam dezenas de pessoas que vêm da Avipronto, que mal se veem. Não se vê preocupação com os peões. O meu marido chegou a ir colocar-me ao trabalho de carro porque tinha medo que atravessasse a estrada quando fosse de comboio”.
Teresa Silva trabalha também numa empresa de logística na zona industrial em frente à Sonae onde o marido exercia a função de administrativo. Onde trabalha têm-lhe dado “bastante apoio”, facilitando a nível de horários, também com apoio financeiro com o funeral. A Sonae apoiou através da Cruz Vermelha.
O caso foi encaminhado para o Ministério Público que também aguarda pela autópsia no sentido do processo avançar. “Gostava que fosse feita justiça, mas regra geral estes casos nunca dão em nada”, e vai mais longe: “Gostaria que o senhor se visse esta entrevista que pelo menos parasse de beber quando conduz, porque qualquer dia pode voltar a acontecer o mesmo, talvez nessa altura não tenha tanta sorte”. Teresa Silva desconhece se a pessoa em causa continua a ter carta ou não, mas dizem-lhe que continua a conduzir.
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