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Quem são os Novos Artesãos
Sílvia Agostinho/Miguel A. Rodrigues
25-09-2018 às 11:55

São cada vez mais as pessoas que se dedicam ao artesanato. Muitos são desempregados em busca de mais uma fonte de rendimento ou fazem-no apenas por prazer pessoal, outros encaram-no como um hobbie depois de mais um dia de trabalho. Fomos conhecer quatro casos de quem abraçou mais ou menos tarde esta paixão inesperada, e não faz dela a sua profissão. Longe vai o tempo do estereótipo de quem se dedicava desde tenra idade ao artesanato para ajudar ao sustento da família e depois dava continuidade à tradição familiar. Hoje os novos artesãos têm página no facebook e um mundo de potencialidades a descobrir.

Raúl Oliveira é um artesão de mão cheia. Já na reforma, o artífice conta que aos poucos vai trabalhando nas suas obras numa oficina no Forte da Casa, concelho de Vila Franca de Xira. A oficina é repartida com uma garagem no prédio onde habita e que aos poucos se foi tornando numa espécie de refúgio do dia-a-dia.

Reformado da marinha, depois de ter estado nos fuzileiros, Raúl Oliveira conta ao Valor Local que “o mar” lhe está no sangue e que isso faz toda a diferença, pois é essa paixão que coloca nos seus trabalhos e que o leva a fazer com minúcia todos os pormenores e artefactos que compõem um barco feito à escala.

Raúl Oliveira exibe com orgulho um “Mississípi”. Um barco tipicamente americano feito em madeira e que ostenta todos os pormenores de um barco verdadeiro. A peça ocupa parcialmente uma mesa na entrada da pequena garagem onde Raúl Oliveira mostra os seus trabalhos, as suas ferramentas, e até um barco que não era da sua autoria, mas que foi encontrado no lixo e que quer agora recuperar.

Noutra prateleira do espaço, o artesão mostra um barco que já vendeu há alguns anos mas que precisa de uma pequena reparação. Uma reparação que estará para breve, para depois mostrar no Salão do Artesanato de Vila Franca de Xira em que participa há vários anos.
Ao Valor Local, o artesão lembra que desde miúdo já gostava de trabalhos manuais. Depois veio a escola e a marinha, onde aprimorou o seu interesse e claro a técnica, sempre muito importante nestes casos.

Pese embora o facto de Raúl Oliveira ter preferência por embarcações com velas, também já fez outras peças. Os presépios são uma alternativa em madeira “com muita saída” mas o que gosta mesmo é dos barcos, lembrando que os primeiros que fez foram em casca de pinheiro. Depois com a continuação dos anos foi desenvolvendo a técnica cada vez mais “aperfeiçoada”.

Raúl Oliveira faz os seus trabalhos à escala, como já referimos, mas a minúcia do projeto é tanta que o artesão tem mesmo plantas à escala e fotografias de vários pontos da embarcação que quer reproduzir.

Com pouco tempo para outras feiras, considera que o salão do artesanato é a montra ideal para vender os seus produtos. Embora tenha também facebook, considera que as redes sociais são importantes para a publicidade, mas não tanto para vender.
Em mãos, Raul Oliveira tem um pequeno “tesouro” de Vila Franca de Xira. Trata-se do barco varino “Liberdade” que não é mais nem menos do que a embarcação típica do Tejo pertença da Câmara Municipal, e feito com todos os pormenores, muitos deles nem os vemos quando entramos no barco, mas que estão perfeitos na réplica do artesão.

Raúl Oliveira destaca os pormenores da embarcação. Com esta réplica, já são três os “varinos” construídos por si. Ao lado da sua bancada de trabalho, o artesão aponta para uma pequena mesa onde estão os artefactos que faltam colocar no barco que até já está eletrificado com leds.
As bóias, os mastros, e até o toldo do barco são feitos por si e prontos a encaixar neste “Varino” que está em execução desde janeiro. O barco está quase ponto. O casco já está montado e agora “falta pintar as decorações” que são feitas à mão. É todo um  trabalho de “relojoeiro” e de pormenor.

Raúl Oliveira conta, nesta altura, apenas com a ajuda da esposa. A filha que no passado deu um jeito nas pinturas está fora, assim como o filho. Por isso o artesão refere que as pinturas feitas por si não são tão perfeitas como as da filha, mas que tenta ir aperfeiçoando aos poucos.
No entanto, o artesão tem a ajuda da esposa - “que faz os trabalhos de costura”. “Eu desenho e ela cose as velas, porque isso não consigo fazer”.

Com preços a rondar os três mil euros, no caso do barco “Mississípi” e do “Varino”, o artesão diz não ter grandes problemas na hora da venda. Contudo tendo em conta o número de horas e a paixão que aplica no seu trabalho, refere que esse valor quase que não é justo. Ainda assim, Raul vai-se entretendo no dia-a-dia com as suas réplicas e com isso vai passando o gosto pelos barcos e pelo mar a todos quantos veem as suas peças.



O artesanato chegou depois dos 50 para casal do Carregado

Eugénia Ponte, 64 anos, e Fernando Ferreira, 62 anos, moradores no concelho de Alenquer, são um casal que apenas abraçou o artesanato há poucos anos. Se era uma vocação estava bem escondida. Eugénia conta-nos que foi neste tipo de atividade que os dois desempregados conseguiram alguns “trocos” para ajudar a pagar as despesas. Eugénia Ponte trabalha preferencialmente em biscuit e dá largas à imaginação criando figuras que encantam a sua “neta emprestada” e Fernando prefere as madeiras. Através da divulgação online em blogues e no facebook foram conhecendo outros entusiastas e clientes do artesanto. Com eles, diz Eugénia, travou uma relação “cordial e honesta” que diz ser o seu ponto de honra.

O artesanato, conforme nos conta, foi o melhor que aconteceu a este casal. “Ficava feliz quando via o meu marido entusiasmado, sempre a imaginar novas coisas e todos os dias quando chegava a casa não era recebida com uma cara chateada porque tinha passado mais um dia a ver televisão. Mas assistia, antes, à evolução de uma nova peça ou constatava que já estava acabada e pronta a ser fotografada e colocada para venda.” Foi também já tarde que começou a escrever e a editar os seus primeiros livros. Com 52 anos, hoje tem 64. Tem já uma coleção de obras dedicadas ao universo infantojuvenil, romance e poesia. “Como era informática de profissão, e tinha um trabalho demasiadamente técnico, senti esta necessidade de abraçar algo mais criativo”.

O casal dedicou-se em conjunto ao artesanato, e Fernando Ferreira mostra uma pequena arca que fez para a neta quando nasceu, cor-de-rosa, com desenhos infantis. Maria Eugénia ia escrevendo e fazendo as suas peças em biscuit. Incentivaram-se mutuamente. Fernando Ferreira tem orgulho de dois suportes que fez para cápsulas de café em madeira, ainda no tempo em que só era conhecido o suporte em acrílico de uma marca conhecida no mercado. “Fiz uma pesquisa e cheguei à conclusão que não existia nada, e comecei a fazer. Até cheguei a mostrar às marcas mas sem sucesso. Depois assisti a várias imitações. Hoje os suportes para cápsulas estão muito vulgarizados e existem os de todo o tipo”. Desde que se dedica a estes trabalhos que muitos clientes lhe pediram suportes para as cápsulas que foram surgindo no mercado.
Paralelamente, Eugénia Ponte também se dedicou aos presépios com uma parceira de negócio, em que à artesã cabia pintar as peças e à sócia a sua venda. Numa das ocasiões chegaram a presentear a antiga primeira-dama, Maria Cavaco Silva, com um desses presépios. “Há muita gente que gosta de fazer coleções de presépios”, diz. A artesã recorda que terá pintado mais de 300 presépios que depois foram vendidos.
Foi, ainda, num workshop, após se reformar, que aprimorou a técnica do biscuit. As encomendas têm surgido a bom ritmo ao longo dos anos, e recorda que um dos desafios foi o de reproduzir numa peça, através de uma fotografia, um cão de uma cliente. “Ainda estava a tirar o curso mas lancei-me no desafio”.
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Neste momento, Eugénia Ponte está dedicada a mais um livro que será lançado em breve com base nas “tiradas” do neto, uma criança muito espevitada e a autora considera que “vai sair algo muito giro”. O livro terá também um acompanhamento dos textos por parte de uma psicóloga. Na capa dos seus livros surgem muitas vezes imagens em biscuit que reproduzem o seu trabalho como artesã, o que acaba por ser uma junção dos dois hobbies.  Financeiramente não se pode dizer que se “ganhe uma fortuna com estas ocupações mas sempre aparecem alguns trocos”.




Nova vida aos materiais por Ana Amadeu

 Ana Amadeu, de Samora Correia, há muito que se dedica a ser artesã nas horas vagas. Na sua casa podemos encontrar os mais diversos objetos transformados em obras de arte através da recolha de materiais do dia-a-dia. Desde peças feitas com conchinhas, sementes de papoilas, caroços dos eucaliptos, entre muitos outros. Garrafas de plástico são reaproveitadas e nelas esculpidas flores como se do vidro se tratasse através da pirogravura. Frequenta feiras de artesanato mas só quando pode, e desde há seis anos para cá.

Multifacetada trabalha desde bordados, tecidos, metal, madeira, entre outros. Para si “é uma necessidade” este tipo de ocupação já que lhe permite libertar-se um pouco das rotinas do dia-a-dia. Já expôs o seu trabalho um pouco por toda a parte, nomeadamente, num restaurante em Arruda dos Vinhos, mas refere que não se considera “uma produtora artesanal regular”.

Atenta ao seu redor, vai sempre tendo ideias para uma peça qualquer que há-de surgir. A influência para estas artes veio da família com os pais. Com facilidade usa um berbequim ou um serrote.

À medida que vai falando do seu trabalho, mostra também mais alguns exemplos de reaproveitamentos com arranjos de flores por exemplo. “Começo a fazer coroas em que o vime ajuda a dar corpo ao que pretendo, e assim vou aproveitando flores que iam deitar fora usando, por exemplo, também veludo”. Quando vai à praia também aproveita para recolher conchinhas ou até outros materiais. Salta à vista o trabalho que faz com caixa de ovos que até servem para compor quadros através da modificação dos materiais. Cascas de nozes também fazem um quadro e neste caso fez sentido para a artista fazer uma composição deste tipo. São trabalhos que levam alguns dias pela exigência das técnicas utilizadas.

Ultimamente virou-se também para a execução de presépios e vemos alguns espalhados pela sua casa, e que também já marcaram presença em exposições, dotados dos vários elementos: o pastor, os anjinhos, o menino, os pais, etc. A peça é toda envernizada e nela podemos ver alguns apliques dos ditos materiais reaproveitados como as conchas.
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Quando se pergunta o que mais estranho aproveitou para as suas peças tem dificuldade em se lembrar. Quando vende alguma peça admite ser difícil dizer-lhe adeus e com desfazer-se dela. Talvez por isso agora não se dedique tanto à vertente comercial, revela-nos.



Lina Pedro e a arte dos chapéus

Lina Pedro, 47 anos, do Carregado, confessa que se iniciou nestas lides há apenas escassos meses. Tudo começou nas festas de Vila Nova da Rainha, concelho de Azambuja, onde esteve presente numa função de acompanhante de uma amiga que expôs produtos na feira de artesanato integrada nos festejos da localidade em causa. Desempregada há 20 meses, nunca lhe passou pela cabeça dedicar-se à arte de adornar chapéus e tem relutância em se definir como artesã. Certo é que encomendas não têm faltado e no último mês o seu trabalho está em exposição numa ala de um restaurante em Arruda dos Vinhos.

Lina é da opinião de que muitas pessoas, nos últimos anos, descobriram este tipo de faceta porque as condições económicas não são as melhores. A crise por assim dizer trouxe o engenho e a arte a muitos destes novos artesãos, que desta forma vão arranjando mais uns trocos ou até mesmo uma forma de passarem os dias em tempos de desemprego. No seu caso assim é. Antes trabalhava em contabilidade como administrativa.

Durante a feira de artesanato em Vila Nova da Rainha percebeu que a maioria dos artesãos “precisava de desenrascar uns trocos”.  Muitos têm “uma página no facebook tal como eu que serve para apresentação dos produtos”. A amiga artesã desafiou-a para os chapéus e depois de umas compras, Lina deitou mãos à obra. Todos os chapéus são adquiridos em armazéns de revenda mas os adornos que são o fator diferencial são criados, cosidos e pintados à mão por Lina Pedro. Flores, fitas, rendas e tecidos dão vida aos chapéus. “Adoro expressar-me e dar vida com muitas cores a esta forma de artesanato”. E assim nasceu a Confraria do Chapéu com página no facebook.

Embora Portugal não seja um país onde as mulheres, as principais clientes de Lina, tenham por hábito o uso de chapéu. Há quem goste de usar esta peça em cerimónias específicas, e a Lina já foi lançado o desafio de combinar sapatos e vestidos com chapéus. “Já me apareceu o caso de uma pessoa que tinha um vestido laranja e cosi à mão num chapéu umas flores pintadas por mim dessa cor”. Ligada também à escrita e à poesia, Lina faz também muitos chapéus para colegas. Diz que é hábito em cerimónias de lançamento e apresentação de livros, os escritores surgirem de chapéu e não o tirarem, e portanto acaba por ser mais um nicho de potenciais clientes para si que em muitos casos são também amigos. “Continuo a dizer que isto é meramente uma ocupação, continuo à procura de um trabalho”.

E nem todos sabem usar um chapéu- “Fica melhor se houver um qualquer detalhe no cabelo como uma trança por exemplo, e não se deve colocar o chapéu pela cabeça abaixo, mas suavemente e com elegância, fica logo diferente”, diz, exemplificando para a nossa reportagem.
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