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Roteiro pelos Mercados da Região:
Entre a Decadência e a Renovação
Os casos de Manique do Intendente, Alenquer,
​Vila Franca de Xira e Salvaterra de Magos


São espaços que vão caindo em desuso mas com uma grande vontade de regeneração. Noutras zonas do país, os mercados têm vindo a ser ressuscitados à custa de conceitos diferenciadores, que já começam a ser aplicados em algumas das nossas praças. Entre a decadência e a regeneração fomos conhecer quatro exemplos neste roteiro.

Sílvia Agostinho
12-12-2018 às 18:18


​Quem chega ao pequeno espaço onde menos de meia dúzia de bancas se organizam no denominado mercado diário de Manique tem a sensação de que está num qualquer país do terceiro mundo tal a falta de condições gritante. Este é um cenário que não é nada novo.
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Comerciantes e população desesperam há décadas por uma mudança neste estado de coisas. Até há pouco tempo, o peixeiro de serviço lavava o peixe num balde. Foi o executivo da atual junta que providenciou um lava louças.  Eterna promessa dos sucessivos governos da Câmara Municipal de Azambuja, a obra tem conhecido muitos solavancos. A dada altura, Joaquim Ramos, anterior presidente, em 2012, anunciava na comunicação social da época que não tinha verbas e já não era prioridade. Luís de Sousa, presidente de Câmara desde 2013, construiu a parte da alvenaria e telhado no anterior mandato do mercado novo, mas a obra não tem conhecido avanços. Fica uns metros mais acima na mesma rua do atual mercado. José Avelino, presidente da União de Freguesias de Manique do Intendente, Maçussa e Vila Nova de São Pedro diz que recebeu a garantia de que será para o ano, mas é ver para crer. A primeira fase da obra aconteceu em 2014, deveria ter sido retomada em 2016, mas tem sido sucessivamente adiada. 
Ao Valor Local, o presidente da Câmara de Azambuja, Luís de Sousa refere que na sua totalidade este é um investimento que ronda os 300 mil euros. Explica o interregno com constrangimentos legais que “forçaram a interrupção da obra”. Em 2016 podia ter sido retomada mas não o foi apesar de inscrita em Orçamento. Agora, avança que pretende lançar o concurso em janeiro de 2019.
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Os comerciantes que há muitos anos estão nesta praça têm dificuldades em falar com a nossa reportagem, e alegam que estão demasiado ocupados para prestar declarações que mesmo assim vamos conseguindo arrancar. O mal-estar percebe-se – Estão fartos da falta de condições. Jorge, vendedor de peixe, (foto abaixo) no local, diz mesmo que “isto é uma vergonha”. Há 40 anos que faz negócio no local. “Puseram ali um lava louças, mas isto tem poucas melhoras. É tudo do pior”. Foi o atual presidente de junta, José Avelino, que providenciou, bem como o arranjo do chão apenas em cimento, mas onde até há poucos anos havia buracos “e as pessoas caiam”.

Mas o novo edifício, maior e que está de acordo com as normas em vigor, também não agrada. Por ficar junto a uma escola primária que muito diz às gentes da terra, o desagrado é generalizado. Depois é nos dito que não há estacionamento suficiente junto ao novo edifício. A ideia pode ser boa, mas o local mal escolhido. É este o sentimento. Mas Jorge também não deposita grandes esperanças – “Duvido que alguma vez aquilo vá para a frente. O dinheiro que gastaram naquela porcaria, tinham arranjado isto aqui, posto um telhado e ainda sobrava dinheiro”. O espaço do mercado diário atual apenas possui um pequeno telheiro que nem chega para as bancas todas. Estas apresentam sinais evidentes de sujidade entranhada. Por isso os comerciantes levam os produtos dentro de caixas. As paredes já foram brancas. Rita, uma cliente de uma vendedora de frutas e vegetais, diz mesmo – “Desde que eu saí da junta que nunca mais se caiou isto que mais parece que estamos dentro de um curral de cavalos”. E quanto ao mercado novo – “Morro e não o vejo”. Mas o novo edifício também para esta moradora de Manique não interessa – “É um mamarracho que ali está, uma verdadeira aberração”. Uma outra cliente, Ana Paula, até sugere – “Podiam fazer o mercado dentro da escola, sempre aproveitavam o espaço que é tão simbólico e importante para a população e que está ali parado entregue às teias de aranha”. Dizemos que as regras para este tipo de espaços comerciais estão cada vez mais exigentes e possivelmente não se coadunariam com um edifício de uma antiga escola primária, mas mesmo assim a população não desarma – “O mercado não devia ser ali. Há outros terrenos. Talvez se arranjassem este servisse. A terra tem cada vez menos gente não era preciso tanto. E a nossa escola que é tão bonita”, vociferam as várias clientes com quem nos encontrámos. Outro comerciante do mercado, Pedro Correia, também não está nada satisfeito – “Não sei se chego a ir para lá porque vendo mais no porta-a-porta”. “O preço da banca será mais caro e o estacionamento é reduzido”, acrescenta.




As condições higiénico-sanitárias são as mais sofríveis possível, e José Avelino deixa escapar – “Calhou nunca cá ter vindo uma inspeção da ASAE”. Apesar de estarmos numa freguesia rural e desertificada, verifica-se que o mercado até tem clientes, porque na aldeia não há supermercados e há sempre quem queira vir comprar a este espaço. José Avelino diz que também em Maçussa, os vendedores conseguem fazer negócio, “porque nestas localidades não há nada, para além de umas pequenas mercearias”. 



Mercado de Vila Franca de Xira - Fecho do hospital antigo fez diminuir clientela
 

Rumamos depois ao Mercado de Vila Franca de Xira, que entre 2000 e 2006 viu recuperado o seu património azulejar. O edifício foi inaugurado em 1929 e é bem conhecido pela sua arquitetura e pelos painéis de azulejos que o revestem. Foram encomendados pela Câmara Municipal à Fábrica de Louças de Sacavém entre 1929 e 1933. No interior, já foi por diversas vezes alvo de remodelação. Mas também aqui a decadência acabou por se instalar, visível no número de bancas vazias.  

Constância Costa, vendedora de azeitonas, veio para o mercado de Vila Franca, e confirma que a maior parte dos clientes consegue-se aos fins-de-semana. A falta de estacionamento não ajuda ao movimento. “De semana estamos parados, ao sábado mexe mais”. Por outro lado, aquilo que considera ser “a decadência do comércio de Vila Franca de Xira não ajuda”. “E desde que fechou o hospital velho ainda é pior, porque quando estava a funcionar notava-se mais afluência”. O mercado pode ser mais dinamizado, na sua opinião, como já acontece nos mercados da Ribeira e de Campo de Ourique, em Lisboa, com “bancas de comes e bebes”, e aberto à noite, entre outras atividades. Até porque “hoje tem outras condições, cada banca tem água e luz, e antigamente era uma pia para vários comerciantes, infelizmente ainda está muito fraco para o negócio”.

Augusto Levezinho gere um pequeno café no mercado e aproveitou o facto de em frente algumas bancas permanecerem vazias para estender a esplanada, onde todos os dias, nos assegura, o proprietário do estabelecimento, um grupo de senhoras passa as manhãs a beber café e a conviver. Há mais de 40 anos que Augusto Levezinho vende neste mercado e recorda os tempos áureos quando “a malta de Lisboa vinha aqui comprar carne porque tinha fama de ser a melhor da região”, e lembra-se da quantidade de talhos que se podia encontrar no espaço em causa. O movimento até há meia dúzia de anos era melhor “porque a malta vinha do hospital velho e passava aqui”. “Espero que com a nova unidade de cuidados continuados (que vai nascer no mesmo local) isto melhore, porque Vila Franca não tem gente. A partir de uma certa hora vê-se mais gatos do que pessoas. Lojas de chineses é que não faltam”, desabafa. Hoje diz que apenas mantém o café porque tem postos de trabalho e porque prefere estar ocupado. “Não tenho feitio para estar no largo da Câmara a ver os carros passar”.  

“Calhou a minha mãe não ter dado à luz aqui por sorte”, é assim que Luísa Letra (foto acima) se refere a uma vida inteira passada no mercado de Vila Franca de Xira, onde diz, chegou a dormir dentro de caixas de fruta. Com 57 anos, brincou, correu, e quis a vida que seguisse o negócio da família. É uma das peixeiras do mercado. Mantém clientes de uma vida, e alguns já são do tempo da mãe. “Temos um atendimento mais personalizado ao cliente, e fazemos amizades”. Por outro lado, a oferta acaba por ser mais diversificada em comparação com as grandes superfícies, nomeadamente, com a venda de peixe do rio, como o sável. Admite que nem sempre é fácil às pessoas virem aos mercados, porque as grandes superfícies fazem muitas promoções, os horários do mercado, confessa, também condicionam as deslocações, por isso de semana “quem vem até cá são sobretudo os reformados”. “O pequeno comércio vai tentando sobreviver e por vezes a alimentação não é prioridade para as gerações mais novas, que preferem comprar feito e recorrer ao fast food”.

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Custódia Poeiras vende há mais de 40 anos em Vila Franca
Mas ainda há mais  resistentes como Custódia Poeiras, vendedora de frutas e legumes, que está na praça há mais de 40 anos, e que foi conhecendo as obras profundas em diversas ocasiões- “Era tudo muito diferente”. Dos tempos de antigamente, recorda quando o número de clientes era superior – “Não havia chineses nem grandes Continentes!”. Todos os dias podemos encontrar esta vendedora no mercado de Vila Franca. Desde manhã cedo até às três da tarde. No seu caso, considera que não valeria a pena estender o horário no sentido de conseguir chegar aos clientes que só conseguem ir às compras depois do horário de saída do emprego. Tem os seus clientes fixos, e que “preferem nitidamente a fruta de boa qualidade, portuguesa”. A que vende é proveniente na sua maioria de Alcobaça.
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Nova banca de peixe veio dar mais movimento à praça
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Comerciante compara mercado de Alenquer ao Forte de Peniche
Mercado de Alenquer- Comerciantes desesperam pelas obras

Também a passar por dias menos felizes, está o mercado municipal de Alenquer. Quando se entra no local, o ar triste dos que fazem da venda de bens, ali, a sua atividade é indisfarçável. Clientes são muito poucos, sendo notório que o espaço suplica por obras. Era assim o quadro em 2014 quando ali realizámos uma primeira abordagem ao local. Apesar de a espaços, o mercado conhecer alguma animação sobretudo em época de natal, e também graças ao projeto de venda de cabazes hortícolas todas as sextas-feiras, o panorama está longe de ser o ideal para os comerciantes.

“Ao sábado mexe um pouco mais, mas de semana é muito fraquinho”, refere José Mateus, 56 anos, que herdou a banca, pois a mãe também já vendia no local. A clientela é sobretudo fixa. Já quanto às obras “dizem que é para o ano”. É necessário, sobretudo, um telhado novo “porque de inverno chove cá dentro, e de verão faz um calor que não se consegue aguentar”, refere. A banca deste vendedor é mesmo por baixo da claraboia, e por isso “torna-se insuportável”. Apesar de “já se verem uns casais novos às compras na praça, houve uma altura em que não se vendia peixe no mercado, e nesse tempo era o cúmulo com isto tudo às moscas, agora veio para cá uma rapariguita vender esse produto, e já melhorou um pouco”. Mas vai mais longe nas críticas – “No inverno, sobretudo é uma tortura tão grande até parece que estamos na antiga prisão do Forte de Peniche. De verão, os produtos parece que ficam cozidos, tudo queimado”.
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O mercado de Alenquer tem quase 70 anos. Leila Almeida desde março que se encontra no mercado a vender peixe. Faz um balanço positivo, embora “não tenha um grande movimento”. A vendedora refere que o apreciador de peixe prefere ir ao mercado fazer as suas compras em detrimento das grandes superfícies, “onde apresar de ser mais barato, a qualidade não é a mesma”. Os fornecedores são de Peniche. Lurdes Soares é cliente, e diz que compreende que os preços do pescado possam ser mais caros no mercado porque a qualidade é outra, apenas lamenta a falta de obras no local – “Passa-se aqui muito frio, imagino o que estas pessoas enfrentam todos os dias, e durante tantas horas”. Leila Almeida também acha que já é tempo de obras. “Os melhoramentos são urgentes. Esta praça é mesmo muito gelada”.
Segundo Paulo Franco, vereador com o pelouro do mercado municipal, a Câmara Municipal de Alenquer identificou esta como obra prioritária, visando não só a requalificação do edifício mas a reanimação do espaço na sua totalidade no âmbito de um quadro comunitário que integra ainda um conjunto mais vasto de obras no território do município. O projeto já vem do mandato passado mas ainda não deu o pontapé de saída. A autarquia refere que pretende dar a conhecer o que está em vista aos vendedores que anseiam por um mercado de cara lavada há demasiado tempo. 


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Vendedores de peixe à espera de melhores dias no mercado de Salvaterra
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Jorge Caseiro está satisfeito com o negócio
Mercado de Salvaterra – Comerciantes criticam planta do espaço

Já o mercado de Salvaterra foi completamente renovado nos últimos anos. Fez 12 anos em 2018. Apesar de um aspeto moderno e funcional também não agrada a todos. Dizem os vendedores de peixe que a configuração não é a melhor. “Quem vende deste lado não vê para a parte de lá, por isso quem entra no mercado não consegue ver tudo de uma só vez, devia dar para ter uma visão sobre todas as bancas, como é no mercado de Vila Franca”, diz Edmar Henriques. À semelhança dos demais mercados, de semana o movimento é fraco. A Câmara de Salvaterra tem a funcionar desde o passado mandato, o programa “Praça com Vida” com atividades diversas ao fim de semana, desde gastronomia, música, ginástica, e com isso tenta captar mais clientes e munícipes para o espaço. Dizem os comerciantes que ao fim de semana, o movimento é diferente. “De semana isto anda em baixo de forma”.

​Por outro lado, “e numa terra tão pequena como esta o que não falta para aí são supermercados”, queixam-se. No dia da nossa reportagem, a banca exibia apenas umas parcas postas de bacalhau – “Porque vende-se pouco e não vale a pena o trabalho de andar a carregar e descarregar mercadoria”, refere a vendedora Maria Relvas. Quando “vêm cá as festas da Câmara (atividades dinamizadas ao fim de semana) vende-se um bocadito mais”. Já outro comerciante acrescenta – “Quem sofrer dos nervos pode vir para cá que isto é um sossego”, graceja para se referir à falta de clientes. Há bancas que só estão ocupadas ao fim-de-semana, e o marido de Maria Relvas conclui, rindo-se – “Ao menos enquanto um gajo anda aqui, distrai-se”. Para esta geração de comerciantes, vender na praça acaba também por um ser um complemento para a reforma. “Agora vem aí o mês do bacalhau, vai melhorar”, diz Maria Relvas.

Já o vendedor de frutas e legumes, Jorge Caseiro, diz que o muro que divide as duas partes do mercado não é problema, e que não tem razões de queixa quanto às vendas. “Felizmente temos clientes, mesmo de semana”, sente-se otimista, e nem a concorrência feroz dos supermercados lhe faz mossa, e diz mesmo que conseguiu muitos clientes nas gerações mais novas. Vende sobretudo fruta oriunda de Alcobaça, e nota que há uma clientela com poder de compra que procura os produtos portugueses e dá importância “ao atendimento personalizado”. “Fixo os nomes de todos os clientes”, refere.

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