Distracções e álcool ceifam vidas nas estradas da região

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ImagemEntroncamento de Vila Nova da Rainha
A Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR) divulga por estes dias os números da sinistralidade em Portugal no ano de 2013. O Valor Local dá conta dessa realidade nas estradas da região, com quadros fornecidos pela ANSR à nossa redacção, (pode consultar na página 15 aqui )e ouve os diversos agentes ligados à segurança e prevenção rodoviária. Há menos mortos mas a realidade dos feridos graves e leves é quase desconhecida. Os municípios reclamam mais intervenção da Estradas de Portugal que no entender dos autarcas continua a marcar passo.

A Estrada Nacional 3 entre Vila Nova da Rainha e o Cartaxo é a via mais perigosa do concelho de Azambuja. O perigo aumentou depois do crescimento da zona industrial entre Vila Nova da Rainha e Azambuja.

Com efeito segundo Pedro Cardoso, Comandante Municipal Operacional do Município de Azambuja, há locais já referenciados como “pontos negros” e que merecem por parte das autoridades (bombeiros e protecção civil municipal) uma atenção especial.

O troço entre Vila Nova da Rainha e Azambuja já merecia “um traço continuo entre as duas freguesias. As viragens à esquerda por parte dos pesados que ali circulam têm motivado muitos acidentes de viação”. Alguns desses sinistros poderiam mesmo ser evitados, se por parte dos condutores houvesse “mais civismo” e se todas as regras da estrada fossem cumpridas. Ainda assim, Cardoso destaca que a construção das rotundas, veio diminuir o número acidentes.

O nosso jornal perguntou à Estradas de Portugal (EP) sobre a importância do traço contínuo e do separador, naquele troço, a qual respondeu: “Está prevista uma inspecção de segurança rodoviária a este troço da Nacional 3 durante no terceiro trimestre deste ano. Nessa inspecção serão analisadas as condições de segurança e de circulação deste troço e identificadas potenciais medidas de melhoria”.

Na estrada Nacional 3, ainda no mesmo troço, há outras localizações a ter em conta. Pedro Cardoso vinca que muitos “pontos negros” não são reconhecidos pela Estradas de Portugal. (A designação oficial refere-se a um lanço de estrada com o máximo de 200 metros de extensão, no qual se registou, pelo menos 5 acidentes com vítimas, no ano em análise, e cuja soma de indicadores de gravidade é superior a 20). Esta é uma definição vista como muito redutora por muitos dos intervenientes nestas coisas da sinistralidade rodoviária. A curva em frente à fábrica Jular, dado o seu grau de inclinação e falta de visibilidade; aa entrada para a estrada de campo em Vila Nova da Rainha, e a travessia de Azambuja junto à estação da CP. Pedro Cardoso são vistas como perigosas, e Pedro Cardoso aconselha que, nesta altura, há que ter em conta a campanha do tomate que vai trazer mais tráfego à Sugal, e que a circulação de tractores, costuma, invariavelmente, sujar a via, o que leva a que esta se torne, especialmente, perigosa.

Outro dos pontos negros é o IC2. Este é o local onde há mais registo de ocorrências relacionado com feridos graves e mortos. O itinerário complementar que liga Alcoentre a Rio Maior, está agora sob o olhar atento dos Bombeiros Voluntários de Alcoentre. Segundo informações recolhidas pelo Valor Local, tem havido mais acidentes entre pesados, dos quais resultaram mortos. Neste caso a configuração da via, sem separador central, aliada às velocidades ali praticadas, poderão estar na origem de muitos dos acidentes.

Eifel Garcia, comandante dos bombeiros de Alcoentre, fala ainda da autoestrada do norte em Aveiras de Cima, entre os quilómetros 40 e 41. Segundo o responsável, as câmaras da Brisa, entidade que explora a auto-estrada, “não conseguem apanhar aquele ponto, que fica numa curva, e por isso é um local onde acontecem alguns acidentes.”

O responsável salienta que este local que fica perto da área de serviço de Aveiras de Cima, apresenta um grau de perigosidade que vai até ao quilómetro 48 mas “as câmaras não o captam de nenhum dos lados”. “A estrada faz uma espécie de ‘S’ e as dificuldades em captar as imagens em tempo real são mais evidentes, por isso, é que as carrinhas da Brisa, andam sempre a fazer percursos naquela extensão em causa”.

Também a Estrada nacional 366 é uma preocupação para os bombeiros. O troço entre Aveiras e Alcoentre que foi intervencionado recentemente acaba, ainda assim, por representar muito perigo. O operacional destaca que alguns acidentes aconteceram e que poderiam ter sido evitados se a Estradas de Portugal tivesse colocado um traço contínuo entre Aveiras e o acesso à Companhia Logística de Combustíveis. Eifel Garcia destaca que na zona industrial, nomeadamente, nos acessos a “Vale Tábuas” ou a algumas empresas como a Jodel, em que as viaturas têm de virar à esquerda, deram-se acidentes, alguns até com alguma gravidade.

Para o vice-presidente da Câmara Municipal de Azambuja, Silvino Lúcio a falta de um organismo que possa servir de interligação entre os municípios e as diversas entidades que gerem as estradas do país tem sido um dos problemas. O responsável pelo pelouro da Protecção Civil vinca que antigamente “as coisas não corriam mal de todo, pois a articulação era feita através de uma comissão no extinto Governo Civil.”

Agora, a situação é mais difícil. O vice-Presidente destaca que a autarquia espera agora “eternidades” por respostas dirigidas à Estradas de Portugal seja por causa de uma pintura na via ou a colocação de uma simples lâmpada. A EP diz, no entanto, que assume todas as suas responsabilidades relativamente aos troços sob sua jurisdição.

No dia-a-dia, “vale à autarquia a informação prestada pelos corpos de bombeiros de Azambuja e Alcoentre, e núcleo da Cruz Vermelha de Aveiras de Cima”. “Esse conhecimento tem sido uma mais-valia”, mas ainda assim, Silvino Lúcio destaca que muitas das situações reportadas têm sido resolvidas com atraso. “Escreve-se e aguarda-se” salienta o autarca ao sintetizar a relação entre as duas entidades. Também questionámos a EP sobre a falta de diálogo de que se queixa esta e outras autarquias, mas a Estradas de Portugal não respondeu à pergunta, alegando, informalmente, que não se revia na exposição das Câmaras.

Dádivas de sangue precisam-se

Quando os acidentes acontecem, as dádivas de sangue são o oxigénio que segura muitos dos acidentados à vida. Os stocks de sangue estão a descer no país. O hospital de Vila Franca de Xira tem um curso uma campanha, e no caso de Azambuja, o grupo de dadores benévolos do concelho, viu diminuírem, nos últimos anos, as dádivas, de 267, 75 litros, em 2010, para 204,30 litros em 2013. Segundo Augusto Moita, presidente da associação, “está enraizada na sociedade a ideia de que os acidentes só acontecem aos outros mas as instituições e os hospitais têm a obrigação de reverter esse quadro”.


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IC 2 tem sido palco de acidentes entre pesados
ImagemFernando Pedro Moutinho
ANSR

Intransigência é palavra de ordem

 A “utopia” a prosseguir é um dia “chegarmos a 0 mortos e a 0 feridos”, é desta forma que Fernando Pedro Moutinho, vice-presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), se refere aos objectivos daquela entidade para prevenir mais acidentes na estrada. Portugal fez alguns progressos nos últimos anos, mas esta é uma estrada ainda com muitos quilómetros. Em síntese, o nosso país, neste campo, e em comparação com outros países da União Europeia saiu da cauda da Europa e agora está sensivelmente colado aos dez primeiros, mas não chega. Em 2013, morreram 517 pessoas nas estradas portuguesas, dados em que o óbito se registou no local, sendo de esperar que suba para 640 tendo em conta a média dos últimos anos. Já em 2014, até 22 de Junho contavam-se 197 mortos.

Segundo o responsável, ao Valor Local, muitos factores, no entanto, têm contribuído para que o número de mortos nas estradas tenha diminuído de 1500 em 2001, para pouco mais de meio milhar no ano passado, “desde mais sensibilização, melhoria das infra-estruturas, aperto da fiscalização, veículos mais seguros”. No entanto, Moutinho está consciente de que houve menos viagens, e menor consumo de combustível devido à crise. “Nesse aspecto, de saudar esse comportamento mais económico e por consequência mais seguro, mas a interpretação dos números é mais lata e consistente”.

As mortes devido ao álcool entre os jovens é um dos dados gritantes. “Portugal é dos países que mais álcool consome, e agora com a nova moda dos cocktails com substâncias psicotrópicas temos de estar ainda mais focados neste combate, e repreender fortemente”; e deu a conhecer quadros onde as estatísticas são especialmente negras ao fim de semana. As mortes na estrada são a principal causa de óbito na faixa etária dos 16 aos 24 anos, superando de longe factores como doenças. “Temos de lutar contra a adrenalina que faz parte da idade, e fomentar campanhas de sensibilização”. Já quanto à descida da taxa de alcoolémia, Moutinho acredita que não é possível ir ainda mais longe, já que 0,2 g/litro de sangue é um valor já bastante exigente, e “significa quase zero”.

A ANSR diz estar também atenta a um outro comportamento de risco, talvez mais escondido quando se fala em acidentes na estrada, como o dos peões e ciclistas que circulam à noite em zonas de completo breu sem colete reflector. “Isto acontece sobretudo em sítios rurais, e temos em preparação uma campanha para a importância não só dos coletes, mas também obrigar à venda de um kit de iluminação obrigatória pelas lojas de bicicletas, que ainda é opcional. A lei obriga a que as bicicletas devam ter este material”. O responsável refere, ainda, que os ciclistas devem gozar dos direitos que lhes foram dados pelo novo Código da Estrada, mas “comportamentos como os que vemos em que são os primeiros a passar os semáforos vermelhos, com auriculares nos ouvidos têm de acabar. Vão ser mandados parar e terão de pagar multa”.

Fernando Pedro Moutinho, foi convidado da concelhia do PSD para uma apresentação, decorrida em Alverca, dos mais recentes dados sobre sinistralidade rodoviária, deu a conhecer os pontos negros no concelho de Vila Franca de Xira – EN 10, km 127 em Alverca; bem como o 128 no centro da cidade. A A1 na ligação entre Alverca e Vila Franca também há dados preocupantes (ver quadro). Só no ano de 2012, morreram nas estradas deste concelho oito pessoas, registaram-se 16 feridos graves e 383 leves, num total de 407 vítimas.

ImagemCurva do Pinheirão no concelho de Alenquer
 
Menos inspecções automóveis

A inspecção automóvel é parte fundamental da segurança rodoviária, mas nos últimos anos muitos condutores têm tentado driblar essa necessidade. Nuno Barroso, gerente do centro de inspecções Numil, em Azambuja, refere que “desde 2009 que as inspecções  têm vindo a cair à média de seis por cento ao ano e em 2014 começa a sentir-se uma ligeira recuperação de dois por cento face ao período de Janeiro a Junho de 2013”. “Para termos uma ideia realista e em números do que é hoje a nossa realidade, em 2014 fazemos na Numil em média menos 600 inspecções por mês do que em 2009.”

O empresário não tem dúvidas: a crise está na origem destes factos. “As famílias que tinham dois veículos fizeram parar pelo menos um, de modo a embaratecer custos”. “Da mesma forma se extrapola esta conclusão para os carros pesados de empresas que ao reduzirem a sua actividade não têm necessidade de manter e custear as suas frotas na totalidade”.

A maioria dos chumbos verificados neste centro de inspecção automóvel relaciona-se em primeiro lugar com as luzes; seguem-se os chumbos quanto a órgãos de direcção (desalinhamento/folgas), seguindo-se as folgas nos órgãos de suspensão, e em quarto lugar anomalias nas emissões de gases.

O empresário tenta afastar o bicho papão das inspecções e sublinha: “Acreditamos que a nossa actividade tem um expressão fundamental na prevenção e segurança rodoviária. Essa é a razão da nossa existência pelo conjunto de itens por nós analisados e verificados que torna a circulação de veículos e pessoas mais seguro no contexto rodoviário.”

Municípios da região pedem mais intervenção à Estradas de Portugal

No caso de Alenquer a sinuosidade das vias que atravessam o concelho é quase um emblema do mesmo, tornando alguns pontos especialmente graves e dignos das cautelas do mais experiente condutor. De acordo com a Câmara Municipal, os casos mais alarmantes encontram-se em estradas nacionais (IC2, EN115-3, EN115-4, N9), locais cuja intervenção é da competência da EP. Nesses casos, responde o executivo, “tem vindo a promover reuniões com a referida entidade, pugnando pela rápida resolução desses casos e apresentando ideias e soluções para os mesmos”

No entanto, e à semelhança de Azambuja, Alenquer também enfrenta uma auto-estrada de dificuldades no diálogo com a entidade e na necessidade de correcções no terreno – “Em alguns casos a EP tem alegado constrangimentos financeiros como justificação na demora da resolução de muitas situações”, nomeadamente repintura de estradas. Também Fernando Pedro Moutinho, da ANSR, está consciente desta questão que não é nova – “A Estradas de Portugal foge a marcar passadeiras em estradas nacionais. A auatrquia diz que mesmo que quisesse fazer alguma coisa nas estradas nacionais, teria de esperar por “pareceres prévios dessa entidade”.

Segundo Fernando Pedro Moutinho, a generalidade dos municípios, deveria pugnar também pela melhoria da iluminação pública. Neste aspecto  Alenquer refere que “a situação não é a ideal mas é a possível. O município está sempre disponível a proceder a ajustes. Sublinhe-se no entanto, que os locais onde a visibilidade noturna é mais fraca correspondem, na sua generalidade, a zonas fora dos aglomerados urbanos e como se compreende é financeiramente insustentável manter todas as vias e troços iluminados. Para além da iluminação, estão a ser estudadas opções adicionais como a colocação de sinalética.”

Troço particularmente difícil em Alenquer é o da Nacional 1/IC 2 nas denominadas curvas do Pinheirão (KM40) e da Chipita (KM44) na ligação Cheganças-Marés, e onde morreram seis pessoas nos últimos seis anos (ver quadro). Este trajecto não é considerado ponto negro pela EP. Hugo Bastos, residente em Abrigada, que passa, habitualmente, nesta via quer de automóvel quer de mota diz tratar-se de “uma estrada complicada, em que basta uma distracção ou excesso de velocidade para ocorrerem acidentes, apesar do piso ser bom”. “Na minha opinião, a estrada entre Alenquer e Olhalvo é mais difícil para os automobilistas devido ao trânsito e qualidade do asfalto”.

No concelho do Cartaxo, o presidente da Câmara também concentra as suas atenções na Nacional 3 que liga aquela cidade a Azambuja, especialmente na zona de Cruz do Campo. Pedro Ribeiro falou disso mesmo à Estradas de Portugal numa reunião recente, pedindo uma vistoria técnica e medidas correctivas no piso e sinalização, de modo a que se possa combater a sinistralidade neste trajecto. Conforme se pode verificar no quadro alusivo a esta via, no concelho do Cartaxo, são muitos os acidentes verificados com vítimas anualmente, fazendo desta uma das vias mais preocupantes da região.

Este presidente não aponta defeitos à Estradas de Portugal, ao contrário de outros autarcas. “Já me reuni várias vezes com a entidade que sempre mostrou muita receptividade. Por vezes, as coisas não correm como desejaríamos, porque a EP também se debate com problemas financeiros e tem de existir alguma margem de tolerância, mas sabemos que não são indiferentes aos problemas”.

Sinistralidade em Salvaterra de Magos rima com rotunda de Marinhais, onde os acidentes no quilómetro 54 a 55 da Nacional 118 acontecem com muita regularidade e onde todos os anos alguém perde a vida neste troço. Hélder Esménio, presidente da Câmara de Salvaterra, já contactou a EP no âmbito de um projecto de engenharia em curso da entidade para requalificação da Nacional 118 entre Samora Correia e Almeirim. “Na reunião que tivemos, pedimos para que dessem tratamento à bifurcação da Nacional 114-3 com a 118, em Salvaterra, bem como à Rua dos Ramalhais/Rua do Furo na intersecção com a 118 em Marinhais, ao cruzamento de Marinhais, e à Rua do Cartaxeiro também na 118, onde acontecem acidentes rodoviários. Apelamos também à questão da Ponte Dona Amélia. Apenas mostraram disponibilidade para já no cruzamento de Marinhais, sendo que nas restantes localizações os números não eram justificativos”.

A EP diz que o cruzamento de Marinhais não é "ponto negro". O entroncamento em causa actualmente regulado por semáforos, tem “uma rotunda prevista cujo projeto de execução está em curso estimando-se a sua conclusão no início de 2015.”

Esménio sugeriu, ainda, rotundas na Estrada do Furo e na do Cartaxeiro, a expensas do município. “Estamos a aguardar resposta, ficaremos tristes se a nossa intenção não figurar no estudo de engenharia que estão a delinear, sobretudo quando queremos pagar essas obras”. O autarca lamenta, por outro lado, que ao pedir a repintura de passadeiras na Nacional 367 em Marinhais, considerada urgente, a EP tenha dito que não o faria para já. “A pequenez e a incapacidade daquele organismo é de tal ordem que, há seis anos, que as placas situadas no cruzamento de Salvaterra, na intersecção com a Nacional 114-3, estão pintadas de preto, e ninguém sabe se há-de virar à esquerda ou para a direita quando chega à nossa sede de concelho. Vamos pedir mais uma vez para que substituam as placas, ou que pelo menos nos possam dar autorização para o fazermos”.

Já no caso do concelho de Benavente, a Nacional 118 é também a principal preocupação. Neste momento, entre Samora e Benavente está a ser construída uma rotunda na zona industrial de Vale Tripeiro, ponto crítico no concelho. O presidente do município, Carlos Coutinho, também aguarda pelo estudo de engenharia da Estradas de Portugal que prevê mais quatro rotundas, no âmbito da prevenção rodoviária, no troço que compreende a zona chamada de “Triângulo das Palmeiras” na entrada da sede de concelho, até à rotunda em curso em Vale Tripeiro. “São intervenções fundamentais mas não temos indicação quanto a prazos, apenas nos pediram a nossa opinião por parte da EP, também não conhecemos os custos”.

O município de Benavente ficou com os custos da iluminação que seriam da EP no caso da nova rotunda em curso, “mas não vamos permitir condescender muito além disso porque são responsabilidades daquele organismo”.

A EP acrescenta que “o projecto de execução da beneficiação da EN118 entre Alcochete e Samora Correia encontra-se em curso. No entanto, face à sensibilidade da zona em termos de segurança rodoviária, leva a que estejam a ser estudados vários cenários de intervenção, os quais encontram-se condicionados pelas restrições orçamentais impostas à EP”. “Por esse facto, encontra-se em análise a possibilidade de efetuar no decurso do presente ano e durante o início de 2015, uma intervenção ao nível da segurança rodoviária com a implementação de medidas de baixo custo, ficando a intervenção mais abrangente para 2016/2017.” 


“Condutores acham-se reis e senhores na estrada”

Excesso de confiança, e falta de civismo ainda contam muito no que toca a acidentes. Esta é a opinião de António José Matos, instrutor de condução e proprietário do grupo de Escolas de Condução Matos, um dos mais representativos da região nesta área.

O empresário é contundente ao referir-se à típica mentalidade dos condutores portugueses, pautada “pela cobardia e pela falta de civismo, que no interior de um carro se sentem reis e senhores”. Modo de estar que só pode resultar em acontecimentos pouco positivos, como os acidentes. António José Matos diz que 90 por cento dos acidentes se deve a falha humana, e que “a renovação da carta aos 50 anos resulta de um acto totalmente administrativo para que o Estado arrecade mais umas receitas”. Na sua opinião, a insistência nas inspecções obrigatórias é também mais uma forma de negócio, apesar da sua importância. Neste sentido lamenta que a componente técnica e cívica que deveria ser a mais importante, fique totalmente esquecida, “porque conduzir é um acto social e não individual”.

Muitos acidentes com carros em bom estado, sucedem-se porque “à falta de civismo soma-se o álcool, porque até uma pequena quantidade de álcool afecta imenso a visão estereoscópica, dando a sensação de que os outros veículos estão mais longe e que circulam mais devagar, quando não é essa a realidade”.

Na opinião de António José Matos, a construção de rotundas tem sido benéfica porque acabam por “diminuir bastante os níveis de sinistralidade, tendo em conta que grande parte dos acidentes dá-se em zonas de conflito como os entroncamentos ou cruzamentos”.

Todavia e sobre o novo código da estrada que obriga a circular nas rotundas a começar pela faixa mais à esquerda, o técnico refere que essa regra “é um perfeito disparate”, “Só se pode concluir que quem tem o poder não tem o saber, e nesta situação da circulação rodoviária essa solução é o caminho mais curto para potenciar a sinistralidade”. “Esta nova lei das rotundas foi publicada simultaneamente com a das novas regras para os velocípedes, mas até hoje, já houve o dobro dos acidentes com bicicletas”, conclui.

Quanto à formação de novos condutores, Matos lembra que no seu grupo tentam “fazer o melhor, mas é muito complicado, tendo em conta as exigências e os custos”. O facto existir muita concorrência entre escolas de condução, “torna difícil dar uma boa formação quando imperam, quase e somente, as regras de mercado”.

“Os alunos quando passam no exame fazem tudo como deve ser, mas à medida que se vão embrenhando na selva da condução do dia-a-dia, ficam iguais aos outros”, desabafa Matos.

Todavia, há sempre reprovações, que estão ligadas a várias factores, desde logo a pressão que o exame em si acarreta, mas há outros exemplos, “como não parar no stop, não ceder passagem a outros veículos ou pessoas, não sinalizar as manobras correctamente, não circular devidamente nas rotundas, , deixar o veiculo ir abaixo por inabilidade mais de três vezes seguidas”.

“Morre-se menos mas há mais gente em cadeira de rodas”

Foi há 10 anos que bastou, apenas, uma distracção de um camionista para mudar para sempre a vida de Manuela Ralha, que se tornou numa das mais conhecidas activistas dos direitos das pessoas em cadeiras de rodas, entre outras frentes ligadas à deficiência.

Em plena recta da Central de Cervejas, num dia de Euro 2004, fazia mais um percurso de rotina, e enquanto aguardava pela luz verde do semáforo na fila, foi surpreendida pelo embate de um camião em excesso de velocidade, cerca de 70 quilómetros/hora. “Só consegui puxar o travão de mão para não ficar entalada entre o camião e o carro da frente, onde seguia uma criança, se embatesse o menino podia ter ficado em mau estado”. “Bati várias vezes com a cabeça no volante, estive meia hora à espera dos bombeiros e polícia”. Na altura, achou que não tinha sido grave, teve tempo de ligar ao marido, mas como os bombeiros acabaram por não chegar tão cedo quanto o desejável, entrou em paragem cárdio-respiratória.

Uma vez nas urgências não lhe conseguiram fazer o diagnóstico certo, mandaram-na para casa com um ben-u-ron, mas não fala em negligência. “Foi-me dito anos mais tarde por um neurocirurgião que se tratou de um tipo de lesão rara, talvez pudesse ter outro tipo de evolução se tratada de outra forma, mas nunca sabemos se podia ou não ser diferente”. Inicialmente, a paralisia afectou-a apenas até aos joelhos, mas desde o primeiro dia que o acidente também afectou as normais necessidades fisiológicas a nível do esfíncter, sendo que a fase da cadeira de rodas veio posteriormente. No entanto, as sequelas do acidente não ficaram por aqui, e já começou a sentir alguma incapacidade nos membros superiores e teme ficar tetraplégica, “mas é um dia de cada vez”. Já ouviu muitas opiniões médicas e sabe que nada há a fazer.

Hoje com 47 anos, a sua maneira de ver as questões da sinistralidade rodoviária também mudou naturalmente. “Vim a conhecer muitos amigos em cadeiras de rodas, alguns que seguiam em motos e tiveram acidentes por culpa própria; e outros devido a comportamentos de terceiros”. Manuela Ralha não olha com optimismo para os números da sinistralidade, porque se é verdade que o número de mortos diminuiu, “em boa parte porque se conseguem milagres nos hospitais”, “ainda não se olha de frente para os feridos”. “Na altura fui registada como ferido leve, porque não tinha sangue, e como eu há muita gente a atravessar situações de vida complicadíssimas devido a acidentes na estrada, e não há estudos sobre as lesões com que ficamos”. Manuela Ralha não tem dúvidas – “Morre-se menos mas há mais gente em cadeira de rodas”. “Não se fala das pessoas que ficaram com a vida amputada” por causa de acidentes em que não tiveram culpa.

“Há cada vez mais desnorte por parte dos condutores, há muito egoísmo, conduzem como se tivessem uma arma nas mãos. Nada aconteceu a quem me pôs numa cadeira; nunca mais me perguntou se eu estava bem ou não!”

Manuela Ralha travou também uma luta na justiça por uma indemnização condizente com o estado em que ficou, as despesas relacionadas com a falta de mobilidade, bem como o facto de se ter visto impossibilitada de desempenhar a sua profissão de professora. O seguro queria dar-lhe, inicialmente, 100 mil euros. “Tendo em conta o ordenado 1000 e tal euros por mês na minha profissão, que deixei de auferir, mais carro adaptado, adapatação da minha casa, medicamentos e toda uma parafernália de material para o meu estado, mais acompanhamento permanente de uma pessoa, consultas médicas, bem como cadeira de rodas eléctrica que custa a quantia de 12 mil euros não chegava tudo somando para o resto dos anos da minha vida”. Prolongou o processo, e conseguiu com a indemnização uma quantia mais condizente com o seu caso. “Nos outros países, o Governo dá primeiro a indemnização ao acidentado e depois resolve o caso com a seguradora”, acrescenta.

“Muitas vezes oferecem valores sequer perto do que é justo, sem ter em conta a dignidade da pessoa. Com a indemnização do seguro consegui encontrar um automóvel adapatado à minha incapacidade, bem como, uma cadeira eléctrica. Vou conseguir ter mais independência, porque antes do acidente tinha uma vida bastante activa. Estudei todos estes anos as questões da deficiência, foi também assim que consegui alguma sanidade”.

Manuela Ralha gostava de encontrar uma ocupação profissional mas reconhece que será muito difícil obter uma oportunidade.  É presidente da Associação Mithós, ligada à deficiência, e pertence também a outros grupos do género. Faz um trabalho de voluntariado e, na última reunião de Câmara de Vila Franca de Xira, viu o seu trabalho reconhecido em prol daqueles cidadãos. A autarquia concedeu à Mithós uma sede em Vila Franca, onde Manuela Ralha e outros sócios poderão desempenhar de outra forma o seu trabalho na defesa das pessoas com deficiência.


A força de vontade vence tudo!

Paulo Pedro era até há sete anos atrás um desportista de mão cheia. Residente no Carregado, freguesia de Alenquer, conta que a sua vida mudou no dia em que caiu de uma ribanceira na sua bicicleta. O acidente que o levou a estar em coma durante mês e meio, deu-se numa curva mal sinalizada a que se seguiu uma ribanceira acentuada. A deficiente sinalização de uma curva acabou por ditar a má sorte.

Foi traçado a Paulo Pedro um prognóstico bastante reservado. Ficou em coma “em estado vegetativo”. “À minha família, os médicos não davam esperanças nenhumas”. Aliás segundo Paulo Pedro os médicos duvidavam mesmo que sobrevivesse. Primeiro comecei a andar de muletas que, para os médicos de cá, eram para o resto da vida”. Mas Paulo Pedro conseguiu superar todas as barreiras e receios com um internamento intensivo em Cuba.

Paulo Pedro treinou todos os dias. Fez vários exercícios físicos, cerca de sete horas diárias, que aliados à sua força de vontade, permitiram que recuperasse a mobilidade. Hoje, já não usa muletas e a sua vida é quase normal. Ficou afectado contudo de uma vista, e não consegue ter o máximo de concentração possível ao nível de raciocínio e tarefas mentais, como tal acabou por se reformar por invalidez. Os dias passa-os na internet e sempre que pode anda de bicicleta em estradas com pouco movimento, “porque o bichinho continua”.

Para trás, este verdadeiro sobrevivente deixou uma empresa bem sucedida, que caiu com a sua ausência, e ganhou uma reforma “forçada”. Tudo o que ambicionava era uma vida o mais normal possível, algo que, agora, está muito mais longe de acontecer, tendo em conta as mazelas que este acidente lhe deixou, e que impossibilitam que tenha um emprego onde o esforço físico e intelectual seja necessário.


Sílvia Agostinho
Miguel António Rodrigues
19-07-2014

Jornal Valor Local @ 2013


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