Em vésperas de se assinalar mais um aniversário sobre o 25 de Abril, o Valor Local conversou com João Benavente, antigo presidente da Câmara de Azambuja, até aos anos 90, preso durante 10 dias em Alcoentre, nos tempos logo a seguir ao fim da ditadura. Não foi um dos presos sonantes do país, mas considera-se a si mesmo como um resistente do fascismo, e acredita que tem o seu lugar na história desta luta a nível regional.
Explica que o seu encarceramento partiu de uma mentira de um conterrâneo. O antigo autarca lembra que numas das suas viagens de comboio, assistiu em Vila Franca de Xira a uma situação de confronto entre alguns simpatizantes do MRPP na estação e muitas outras pessoas de Vila Franca que lhe queriam bater porque eram acusadas de andarem por cima dos telhados e afins. “Como nunca gostei de ver a força aproveitar-se da fragilidade; acho que as pessoas devem ser tão fortes com os fracos como com os fortes, levantei a voz porque estavam lá mais de cinquenta a baterem em cinco”. Na altura tinha 29 anos, e lembra que “aquilo era a força da juventude e da liberdade. Se se tinha feito o 25 de abril há onze meses atrás, era para que as pessoas pudessem expressar as suas ideias”.
As palavras de Benavente suscitaram entretanto uma situação complicada: “Naquele confronto, um indivíduo de Azambuja que vivia em Vila Franca, quando me viu começou a gritar que me conhecia; que eu era de Azambuja e filho de um latifundiário, mas o meu pai tinha a terceira classe e trabalhava no armazém do sal”.
A situação descontrolou-se, e João Benavente acabou por ser detido com outras seis pessoas. O passo seguinte foi a prisão de Alcoentre: “Fomos vítimas dos mandatos em branco assinados pelo Otelo Saraiva de Carvalho”. Já em Alcoentre as pessoas estranharam a presença de Benavente, que nunca se identificou e até o diretor da cadeia ficou apreensivo. Benavente não tem dúvidas de que foi “um preso político” nos pós 25 de Abril. Benavente relembra as dificuldades porque passou na altura com a esposa grávida de oito meses e o desconforto que a situação causou à família e amigos.
O antigo autarca refere, no entanto, que nunca mais dirigiu a palavra ao homem que o acusou em Vila Franca, e que mais recentemente numa Feira de Maio voltou a vê-lo. Cumprimentou apenas os seus irmãos, que na época tinham repudiado a atitude do mesmo, e não lhe falou ignorando-o.
O antigo presidente da Câmara Municipal de Azambuja, agora afastado de cargos políticos, salientou que nunca teve a ambição em ser presidente da autarquia, lugar que ocupou por 16 anos até integrar em 1999 as listas do PS à Assembleia da Republica, tendo sido eleito deputado pelo círculo de Lisboa.
Já quanto à Revolução de 74, João Benavente soube da revolução no comboio. Não acreditou à primeira porque tinha havido uma tentativa de golpe de Estado antes e a situação não tinha evoluído. Todavia naquela manhã, Benavente ia a caminho do emprego em Cabo Ruivo e o comboio parou. A sua preocupação era o trabalho, porque era responsável da fábrica e tinha uma série de trabalhos em curso.
Entretanto apareceu uma pessoa com um rádio “a gritar que havia uma revolução em Lisboa, que havia um golpe de Estado, mas já quase meia hora depois de o comboio estar parado”.
O comboio acabou por arrancar e pelo caminho via-se muita gente nas estacões e apeadeiros. “Saímos em Cabo Ruivo e continuava a romaria de pessoas. Cheguei à fábrica era quase dez e meia e ninguém sabia o que havíamos de fazer”. João Benavente fez parte também da primeira comissão administrativa da Junta de Freguesia de Azambuja, mas destaca que terá sido escolhido para essas funções, não se tendo proposto para o cargo.
Quanto ao facto de ter sido escolhido para a junta de Azambuja, Benavente que trabalhava como técnico industrial numa empresa de esquentadores na Póvoa de Santa Iria, vinca que foi a sua esposa que o avisou de que tinham “ido lá a casa o Casimiro Paulo dos Santos e o irmão, porque tinha havido assembleia popular no antigo celeiro dos trigos, agora EPAC, e que eu tinha sido eleito para a comissão administrativa da junta de freguesia”. O antigo autarca refere que na altura ficou preocupado, pois levantava-se todos os dias pelas cinco da manhã e chegava a casa pelas nove da noite e portanto “não tinha tempo para isso”.
João Benavente lembra que a escolha da sua candidatura foi tomada tendo em conta as suas posições políticas. O antigo autarca recorda que antes do 25 de Abril era comum falar de política no comboio a caminho do emprego. Era uma situação delicada, mas talvez porque o fruto proibido é o mais saboroso, era quase inevitável.
Miguel A. Rodrigues
24-04-2015
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