Idosos de Vila Franca contam como é a vida na cidade
Seniores encontram-se com regularidade na Comissão Unitária de Reformados, Pensionistas e Idosos de Vila Franca de Xira
Sílvia Agostinho
09-08-2016 às 11:00 O Valor Local foi conhecer um conjunto de idosos que normalmente costuma passar a tarde a jogar às cartas numa das coletividades locais – a Comissão Unitária de Reformados, Pensionistas e Idosos de Vila Franca de Xira. Entre as questões que os tendem a deixar mais vulneráveis ou expostos, e das quais falaram sem hesitação, estão o abandono dos familiares, o isolamento, a falta de saúde e de apoio vistas com grande preocupação, em que a palavra solidariedade tenta triunfar sobre os demais conceitos negativos.
Quase todos referem que conhecem situações em que alguns dos mais velhos da cidade se sentiram desprotegidos ou mesmo em risco, e apontam o caso de Frederico Neves, de 77 anos, colega do jogo de cartas. Hoje, vive num quarto alugado que a Segurança Social lhe providenciou mas nem sempre foi assim. Sendo um concelho predominantemente urbano, Vila Franca de Xira é dos que apresenta um número considerável de idosos a viverem sozinhos. Durante os primeiros seis meses de 2015, este município apresentava mesmo uma das percentagens mais altas de denúncias de idosos em situação de risco, de acordo com dados divulgados publicamente pelo Centro Distrital de Segurança Social de Lisboa. Cerca de 62 queixas respeitantes a este concelho num universo de 95 denúncias, onde também se encontravam os municípios de Arruda dos Vinhos, Alenquer e Azambuja. O idoso Frederico Neves chegou a dormir debaixo da autoestrada na Castanheira do Ribatejo, e mais tarde num prédio inacabado na zona de Santa Sofia. “Quando o conheci, tinha a roupa toda molhada. Indiquei-lhe esse prédio abandonado, sempre era melhor do que estar a dormir ao relento”, indica outro dos reformados, Júlio Formigo, de 63 anos, natural de Arruda e poeta popular. “Mas agora estou ainda mais satisfeito por ele ter encontrado uma casa”, até porque em Santa Sofia as condições também não eram as melhores – “Se lá entrasse não ficava nem um minuto”; assegura. O idoso que viveu nas ruas até conseguir alugar um quarto por 200 euros relata que hoje não pode querer mais. Consegue tomar banho quando deseja, faz as refeições, e vai passando o dia na coletividade. O dinheiro da reforma vai quase todo para a renda, por isso foi-lhe indicado um serviço de refeições gratuitas pela Segurança Social mas nem sempre recorre porque “servem os almoços já perto da três, e fui-me habituando a cozinhar sozinho”. Natural de Lisboa, há muitos anos que está em Vila Franca – “Adoro isto!”, refere. A vida hoje é mais tranquila e até participa das atividades da coletividade, e com frequência vai aos passeios organizados por entidades da cidade. Como um que houve há pouco tempo a Évora. Mas ainda se lembra bem do medo que sentia quando vivia no prédio de Santa Sofia- “Não passava frio, mas tentava nunca entrar de noite naquilo que era antes a minha casa, pois andavam sempre por ali uns drogados. Um dia tive muito medo e chamei a polícia, que veio logo. O agente disse que a Segurança Social ia encontrar uma casa para mim e assim foi. Foi há um ano e cinco meses”. Nessa altura, ainda se recorda de só conseguir tomar banho uma vez por semana e de ter outras carências. Esteve um ano nesse dito prédio. Frederico Neves nunca se casou, sempre viveu só, e a pouca família que tem já não lhe presta atenção. “Há muitos filhos que não passam cartão aos pais”, junta Heliodoro Nobre que sente que este é também um fenómeno bastante enraizado no dia-a-dia dos mais idosos de hoje – uma espécie de desprezo dos familiares. “No meu caso não me posso queixar, mas é algo que acontece”. E por isso reafirma a necessidade das instituições estarem alerta e sugere – “Há por aí tanta casa abandonada nesta cidade, que com pequenos arranjos podiam dar para meter lá pessoas mais velhas, daquelas que merecem ser ajudadas”. O próprio diz ser também um voluntário no dia-a-dia: “Se por acaso alguém da minha idade ou mais velho precisar não hesito em ajudar; como ir à farmácia ou passear o cãozinho”, destaca. “Já colaborei muito com a Misericórdia. Enviei para lá muitos velhotes e velhotas”. Este idoso assiste com muita atenção às mudanças do mundo, e acha que hoje em dia “as coisas estão piores porque não há respeito”. Nos tempos livres adora ir apanhar caracóis e tenta fazer o máximo de exercício físico que consegue pois adora a vida e a última coisa em que pensa é em ir para um lar. A diabetes é um dos seus piores pesadelos, e anda sempre assustado com a doença até porque já apanhou alguns puxões de orelha da médica. Já Júlio Formigo (em cima. esq) que também se diz adepto de caminhadas, não esconde também o seu “respeito” pela doença e quanto a atividades para os mais idosos, gostaria que a Câmara pudesse fazer passeios grátis no barco varino para os mais idosos ou em alternativa a preços mais baixos. É com orgulho que exibe a sua veia de poeta e o poema “Fui passear a Lisboa”. Quem também gosta muito de passear é Almiro Gomes (em cima. dir), 74 anos, residente há mais de 40 em Vila Franca, e presente na conversa – “Passo cá pouco tempo, viajo muito para o Minho”, refere.
Também Alfredo Rodrigues, de 81 anos, não quer pensar nisso, mas se tiver de ser regressa à sua terra natal a São Pedro do Sul, onde conhece algumas instituições tendo em vista esse fim. Está reformado há 31 anos, e os seus dias passam também pela biblioteca local: "Uma coisa notável”. “Dei os parabéns à antiga presidente da Câmara no dia da inauguração”. De manhã, conta, que lê os jornais diários e à tarde revistas e livros, “mas apenas o que consigo compreender, o que não consigo deixo de parte”.
Também este idoso se preocupa com a saúde, e por isso é um dos habituais frequentadores de espaços na cidade onde existam máquinas de manutenção – “que são uma maravilha para a parte esquelética mas também para a mental que melhorou muito”. “Há quem goste de participar em atividades desportivas de clubes e associações mas eu prefiro essas máquinas”. Há mais de 40 anos que vive em Vila Franca, mas considera que “São Pedro do Sul é melhor em tudo, principalmente no turismo por causa das termas”. Rede de apoio à vítima com apoio à terceira idade
A vereadora com o pelouro do Apoio Social no município de Vila Franca refere que a autarquia tem procurado estar atenta às principais questões que afetam a terceira idade, seja através da realização de atividades lúdicas, seja através da sinalização de casos de idosos nos quais seja necessário agir em conjunto com outras entidades. A promessa de criação de uma rede de apoio à vítima que saiu das conclusões da apresentação do diagnóstico social recentemente, deverá incluir esta franja da população. Maria de Fátima Antunes dá como exemplo, para já, o serviço de teleassistência que será reforçado entretanto, “com a inclusão das redes móveis”. Trata-se de um projeto iniciado em 2012 em articulação com as forças de segurança, também numa base do policiamento de proximidade. “Sabemos que nos meios rurais ainda funciona o espírito de vizinhança, e há sempre quem dê o alerta. Nos meios mais urbanos do concelho, tornam-se importantes as associações de reformados neste auxílio às pessoas”. Neste contexto são também importantes as ações de sensibilização decorridas no âmbito das várias associações ligadas ao idoso, relacionadas com a temática da saúde e da segurança. Neste aspeto, o fenómeno da violência contra idosos é também uma realidade no concelho, que a nova rede de apoio à vítima procurará combater. A autarquia refere que a aposta passa também por integrar os cidadãos em atividades proporcionadas pelo município como a Festa da Flor ou a Passerelle de Ouro no que se refere à problemática do isolamento.
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