Novos e Velhos artistas partilham histórias de vida
Sílvia Agostinho/Miguel A. Rodrigues
27-04-2016 às 10:06
Nos últimos anos aumentou o número de portugueses que fazem da arte a sua profissão. Os dados são recentes, e a nossa reportagem foi ao encontro de alguns nomes da nossa região em áreas diversas. Desde os mais novos aos mais velhos, passando pelos menos e os mais experientes, fomos conhecer as motivações, os anseios, os sonhos e também as frustrações de quem já teve ou ainda persegue um lugar ao sol em profissões onde o sonho raramente combina com sucesso financeiro, e que soluções os artistas encontram para isso.
Sílvia Agostinho/Miguel A. Rodrigues
27-04-2016 às 10:06
Nos últimos anos aumentou o número de portugueses que fazem da arte a sua profissão. Os dados são recentes, e a nossa reportagem foi ao encontro de alguns nomes da nossa região em áreas diversas. Desde os mais novos aos mais velhos, passando pelos menos e os mais experientes, fomos conhecer as motivações, os anseios, os sonhos e também as frustrações de quem já teve ou ainda persegue um lugar ao sol em profissões onde o sonho raramente combina com sucesso financeiro, e que soluções os artistas encontram para isso.
“O meu trabalho encontra-se bem divulgado no Brasil e nunca tive dinheiro para ir buscar alguns prémios que lá ganhei. Fui nomeada para integrar a Academia de Artes e Letras de Buenos Aires na Argentina e não tive condições financeiras para fazer essa viagem e poder participar na cerimónia” . |
Rita Pea, a poetisa premiada mas pouco conhecida
Com 29 anos, a escritora e poetisa Rita Pea, de Aveiras de Cima, já deu nas vistas no panorama dos novos autores de poesia no nosso país. Conseguir viver apenas do seu trabalho e da sua arte seria o sonho de Rita, que não tem dúvidas em confessar que será algo muito difícil. Rita Varino, o seu nome verdadeiro, já conseguiu alcançar prémios internacionais na América Latina mas como não dispõe de condições económicas suficientes já chegou ao ponto de não conseguir ir buscar esses prémios que venceu graças ao seu talento. A escritora que escreve nua e que descobriu a vocação “durante os rebeldes 13 anos”, como gosta de afirmar é um caso de persistência de quem ama o que faz. Recentemente lançou “Nu Avesso das Palavras” na sua terra natal e apresentará em breve a obra em Setúbal e Cartaxo. “A adrenalina que começo a sentir nas veias quando leio outros poetas e quando escrevo é algo muito íntimo. Tenho-me como uma pessoa com uma curiosidade exacerbada e parti nessa descoberta”, descreve não escondendo “o estrondo” que a poesia “provocou” em si. “Comecei a escrever em todo o lado: nas paredes, nas mesas”. Eugénio de Andrade, Florbela Espanca, Miguel Torga, Herberto Hélder são apenas algumas das suas referências, bem como, Clarice Lispector, autora brasileira, com a qual se diz identificar especialmente. Adepta do verso branco (sem rima), a autora consegue encontrar qualidade num poema “desde que o mesmo provoque um sentimento e uma magia que acabe por nos deixar fascinados”. Rita Pea, cujo apelido vai buscar ao inglês na palavra ervilha e que resultou de uma brincadeira entre a mesma e uma amiga também do mundo da poesia, abraçou igualmente a dramaturgia social no projeto “Teatro Humano”, “que trabalha histórias das comunidades”. “Escrevo histórias reais das pessoas que existem nessas comunidades. Trabalhei por exemplo com bairros sociais, e com pessoas que na nossa região vivem ao lado do Tejo. O que fazemos é construir as suas raízes através de uma peça de teatro”. Um dos últimos trabalhos consistiu na adaptação de dois dos Sete Pecados Mortais, de Brecht, “a gula” e “a ira” ao cenário de crise no país e à realidade da comunidade ribeirinha de Alhandra, o que só podia resultar “num grande desafio”. Rita Pea frequenta ainda uma licenciatura em Estudos Portugueses na Universidade Nova, depois de ter deixado para trás outras duas licenciaturas na Universidade de Évora. Desde há três anos que se dedica em exclusivo à escrita ora pela dramaturgia, ora pela poesia. A autora encontra-se a escrever também uma peça dramática inspirada no passado de uma refugiada líbia atualmente em Portugal “com uma história de vida impressionante para qualquer ser humano”. Com tantas atividades, o facto de não conseguir “de todo” viver apenas da sua arte contando com ajuda financeira da família, não fez com que baixasse os braços, até porque tem noção de que está no início da carreira. “O meu trabalho encontra-se bem divulgado no Brasil e nunca tive dinheiro para ir buscar alguns prémios que lá ganhei. Fui nomeada para integrar a Academia de Artes e Letras de Buenos Aires na Argentina e não tive condições financeiras para fazer essa viagem e poder participar na cerimónia. Também faço parte de uma academia semelhante em Itália” “Temos pena”, refere conformada mas sem se deixar abater. A falta de reconhecimento do país para com as artes é transversal a todos os que produzem Cultura, na sua opinião, e isso “é um sintoma de que estamos doentes”, porque “a alma também se alimenta”. “Temos ótimos profissionais mas o nosso país não apoia a Cultura”. Os públicos na sua opinião “estão demasiadamente formatados”. “Evidentemente que tenho muita gente que me diz que não vou conseguir viver disto, que não vou conseguir comprar casa e ter uma vida independente. Dou-lhes razão. Até porque no nosso país é assim que funciona, e não há mecanismos de fuga para os artistas. É uma pena porque a nossa história é feita de grandes personalidades, e hoje há uma descrença enorme na Cultura, na Arte e na Educação. Todos nós artistas sentimos isso”. Nos meios mais pequenos, “os artistas também podiam ser melhor aproveitados pelos municípios”. “A cultura deveria ser fomentada também nas pequenas cidades ou nas pequenas vilas. Se nada for dado às pessoas elas também não vão conhecer o trabalho dos artistas. Todo o burro come palha, depende da forma como lhe dás, já dizia um amigo meu. Se uma dada pessoa que trabalhe no campo na nossa região nunca pôde assistir uma peça de teatro ou a um espetáculo de ópera, como é que pode formar o gosto”. “Assim nunca se vai criar públicos”, deduz. Rita Pea já está a escrever um novo trabalho. Desta vez na prosa, e não esconde que é com a intenção de poder vender mais, “porque está sempre na moda e facilmente alguém compra um romance”. “Espero publicá-lo no próximo ano. A história aborda a violência doméstica. Até lá vou também terminar o meu trabalho com a bailarina refugiada”. Um amigo disse-lhe um dia que quando percebesse a diferença entre literatura e mercado editorial “teria muito sucesso”. “Não sei se vai acontecer ou não. A poesia e o romance são diferentes, e acho que me exponho mais no segundo”. |

Joaquim Salvador: De artista de La Féria a animador cultural
Joaquim Salvador em criança organizava pequenos teatrinhos com os amigos em Samora Correia. O bichinho da representação nasceu consigo, e depois de frequentar um curso, as luzes dos holofotes do Teatro Politeama com Filipe la Féria significaram o apogeu da sua carreira. Fez teatro e muita televisão. Mas há mais de 10 anos que deixou de ser uma vedeta nacional, “em que era abordado constantemente na rua” para continuar a ser apenas vedeta na sua terra, onde tem a sua companhia de teatro e o trabalho como animador cultural do município. Confessa que se sente bem no novo fato, depois de ter atingido uma popularidade inesquecível em programas de televisão líderes de audiência. Na Covilhã a Câmara local até chegou a colocar na rua um outdoor com a personagem do Kiko Prancha que Joaquim Salvador interpretava na escolinha do Baião no Big Show Sic.
O ator foi também o fundador, em 1986, da Companhia de Teatro “Os Revisteiros” que de revista possui apenas o nome, já que segundo Salvador tem apresentado, ao longo dos anos, espetáculos de diverso cariz, tendo mesmo sofrido episódios de censura no seu início. A companhia tem conseguido fidelizar o público, “e nunca teve muitos problemas em conseguir captar pessoas para virem assistir às peças”, refere.
Quando começou a trabalhar com La Féria estávamos em 1995. Hoje com 45 anos, o ator refere que na altura “não tinha consciência se podia ou não viver da representação. Já era tudo muito difícil e efémero. Era apenas movido pela paixão”. O seu trajeto profissional, nessa altura, foi sempre a subir com trabalho na televisão, que não podia deixar de ser compensador financeiramente. Contudo, as frustrações muito inerentes à vida dos atores também são um dilema,– “Quando as luzes se apagam, é complicado. Depois de um período de paixão pelo que fazes, acontece que um dia já não estás no sítio certo, nem encontras a pessoa certa, e as oportunidades no meio podem acabar”. Sair da ribalta foi sendo um percurso natural a partir de certa altura – “Fui conseguindo encontrar outra estabilidade, a estar bem comigo mesmo, até porque essa vida que tinha era muito instável”. Entretanto, “o Filipe la Féria cansou-se de me convidar até ao ponto de nos afastarmos”.
“Rejeito completamente aquela ideia de que determinado autor é tão elitista e quanto menos público melhor, porque nem toda a gente percebe aquilo que eu faço, e que isso é que me dá valor”
Joaquim Salvador que é também ligado a grupos de teatro nos Açores refere que o público hoje em dia tem uma apetência maior por comédias, “um formato que entretanto se perdeu”, e recusa a diferença entre público citadino e rural. “Rejeito completamente aquela ideia feita de que determinado autor é tão elitista e quanto menos público melhor, porque nem toda a gente percebe aquilo que eu faço, e que isso é que me dá valor e por isso é que sou bom”, ilustra, concluindo: “Isso não faz minimamente parte da minha forma de estar. O espetador pode sair do meu espetáculo sem gostar, mas que pelo menos saia de lá a pensar em qualquer coisa. É essa a minha conceção”.
Ocupando uma posição privilegiada para dar uma opinião sobre como decorre a adesão às atividades culturais que se vão efetuando no concelho de Benavente, no domínio da Câmara e não só, Joaquim Salvador acredita que “as pessoas têm consciência da oferta que existe e vão aderindo, tendo em conta também o enquadramento de muitos espetáculos e exposições em espaços com história do concelho como o Palácio do infantado, ou o cinema de Benavente. Também se faz muito teatro na rua por exemplo. É muito agradável estares na Fonte dos Escudeiros e teres ali montes de pessoas a assistirem ao nosso espetáculo no verão, apesar dos mosquitos todos”; diz rindo-se ao referir-se à sua faceta de criador artístico. Fazer teatro na província pode ser também muito motivador – “Tenho amigos meus que quando têm 20 pessoas numa sala em Lisboa ficam contentes, eu com menos de 300 fico mesmo muito mal disposto. Penso que os Revisteiros ao longo dos anos com um programa diversificado onde tão depressa temos comédia de situação ou algo mais alternativo foram conseguindo fazer uma corrente, talvez porque temos uma longa história e beneficiámos de ter surgido numa altura em que a nossa ingenuidade nestas coisas acabou por vingar”.
Joaquim Salvador em criança organizava pequenos teatrinhos com os amigos em Samora Correia. O bichinho da representação nasceu consigo, e depois de frequentar um curso, as luzes dos holofotes do Teatro Politeama com Filipe la Féria significaram o apogeu da sua carreira. Fez teatro e muita televisão. Mas há mais de 10 anos que deixou de ser uma vedeta nacional, “em que era abordado constantemente na rua” para continuar a ser apenas vedeta na sua terra, onde tem a sua companhia de teatro e o trabalho como animador cultural do município. Confessa que se sente bem no novo fato, depois de ter atingido uma popularidade inesquecível em programas de televisão líderes de audiência. Na Covilhã a Câmara local até chegou a colocar na rua um outdoor com a personagem do Kiko Prancha que Joaquim Salvador interpretava na escolinha do Baião no Big Show Sic.
O ator foi também o fundador, em 1986, da Companhia de Teatro “Os Revisteiros” que de revista possui apenas o nome, já que segundo Salvador tem apresentado, ao longo dos anos, espetáculos de diverso cariz, tendo mesmo sofrido episódios de censura no seu início. A companhia tem conseguido fidelizar o público, “e nunca teve muitos problemas em conseguir captar pessoas para virem assistir às peças”, refere.
Quando começou a trabalhar com La Féria estávamos em 1995. Hoje com 45 anos, o ator refere que na altura “não tinha consciência se podia ou não viver da representação. Já era tudo muito difícil e efémero. Era apenas movido pela paixão”. O seu trajeto profissional, nessa altura, foi sempre a subir com trabalho na televisão, que não podia deixar de ser compensador financeiramente. Contudo, as frustrações muito inerentes à vida dos atores também são um dilema,– “Quando as luzes se apagam, é complicado. Depois de um período de paixão pelo que fazes, acontece que um dia já não estás no sítio certo, nem encontras a pessoa certa, e as oportunidades no meio podem acabar”. Sair da ribalta foi sendo um percurso natural a partir de certa altura – “Fui conseguindo encontrar outra estabilidade, a estar bem comigo mesmo, até porque essa vida que tinha era muito instável”. Entretanto, “o Filipe la Féria cansou-se de me convidar até ao ponto de nos afastarmos”.
“Rejeito completamente aquela ideia de que determinado autor é tão elitista e quanto menos público melhor, porque nem toda a gente percebe aquilo que eu faço, e que isso é que me dá valor”
Joaquim Salvador que é também ligado a grupos de teatro nos Açores refere que o público hoje em dia tem uma apetência maior por comédias, “um formato que entretanto se perdeu”, e recusa a diferença entre público citadino e rural. “Rejeito completamente aquela ideia feita de que determinado autor é tão elitista e quanto menos público melhor, porque nem toda a gente percebe aquilo que eu faço, e que isso é que me dá valor e por isso é que sou bom”, ilustra, concluindo: “Isso não faz minimamente parte da minha forma de estar. O espetador pode sair do meu espetáculo sem gostar, mas que pelo menos saia de lá a pensar em qualquer coisa. É essa a minha conceção”.
Ocupando uma posição privilegiada para dar uma opinião sobre como decorre a adesão às atividades culturais que se vão efetuando no concelho de Benavente, no domínio da Câmara e não só, Joaquim Salvador acredita que “as pessoas têm consciência da oferta que existe e vão aderindo, tendo em conta também o enquadramento de muitos espetáculos e exposições em espaços com história do concelho como o Palácio do infantado, ou o cinema de Benavente. Também se faz muito teatro na rua por exemplo. É muito agradável estares na Fonte dos Escudeiros e teres ali montes de pessoas a assistirem ao nosso espetáculo no verão, apesar dos mosquitos todos”; diz rindo-se ao referir-se à sua faceta de criador artístico. Fazer teatro na província pode ser também muito motivador – “Tenho amigos meus que quando têm 20 pessoas numa sala em Lisboa ficam contentes, eu com menos de 300 fico mesmo muito mal disposto. Penso que os Revisteiros ao longo dos anos com um programa diversificado onde tão depressa temos comédia de situação ou algo mais alternativo foram conseguindo fazer uma corrente, talvez porque temos uma longa história e beneficiámos de ter surgido numa altura em que a nossa ingenuidade nestas coisas acabou por vingar”.
Vasco Gargalo Viver dos cartoons não é fácil e há que ser versátil Vasco Gargalo é hoje um dos mais conhecidos cartunistas do panorama nacional. Todavia nem sempre foi assim e é o próprio que lembra as dificuldades que passou para manter a “arte” bem viva e para tentar viver dela. Gargalo que integra pela segunda vez o leque de cartunistas do Cartoon Xira diz que tudo começou quando era “miúdo” e lembra que desde essa altura que gosta de desenhar. “É uma vocação que se mantém até aos dias de hoje”. Vasco Gargalo confessa que nem sempre os tempos foram fáceis. Houve alturas em que não publicou nenhum cartoon, o que o levou a procurar emprego fora da área para sobreviver. Dos pais, refere o apoio, embora tenha ouvido sempre alguns conselhos sobre a forma que escolheu para governar a sua vida. No início do seu percurso, Gargalo chegou a ter dúvidas, mas refere que conheceu um maior impulso na escola, e através da caricatura, onde começou no fundo. Vasco recorda que o pai levava o jornal para casa e ele desenhava caricaturas das pessoas que vinham no jornal, tendo como referência Mário Zambujal, cartunista à época do jornal “A Bola”. O cartunista chegou a trabalhar em cenografia na televisão, e numa empresa de higiene e segurança. Mesmo quando teve de assumir esses trabalhos nunca deixou de desenhar. “Nunca deixei de sonhar até porque essa era e é a minha paixão”. Contudo, nem só de vocação vive o artista que passou por vários cursos para aperfeiçoar a sua técnica e completar a sua parte académica que confessa ainda não estar finalizada. No entanto, Vasco Gargalo salienta que ainda não consegue ter trabalho exclusivamente na área do cartoon, e salienta o seu trabalho em ilustração de livros, ou em trabalhos encomendados por empresas já que isso é de certa forma o garante da sua subsistência financeira. Gargalo vinca a necessidade de uma existência versátil no mundo artístico. À semelhança de outros tantos cartunistas, tem de estar preparado para os acontecimentos. Até porque, os jornais deixaram de apostar, como antes, nos cartoons e por isso as oportunidades são aproveitadas quase ao minuto. “Já me pediram um desenho em quatro horas”, refere Vasco Gargalo para quem estar informado do que se passa no país e no mundo é vital para o seu trabalho. “Gostava de sentir o frenesim de uma redação de um jornal diário. Acompanhar a vivência de uma redação, as conversas com os jornalistas e ir beber café ou fumar um cigarro aproveitando os momentos de pausa, e poder usufruir desse convívio, mas como sei que é difícil haver comprometimento a esse nível por parte da imprensa devido às dificuldades que atravessa, mantenho o meu trabalho no meu gabinete” confessa o artista que diz gostar de trabalhar sobre pressão. Aliás a vida de Gragalo é essencialmente isso, várias horas a desenhar, todos os dias, mesmo quando não tem a quem vender um cartoon. Confessa que “é raro rasgar um desenho” e que todos os dias faz mais do que um, acompanhando assim o tal “frenesim de notícias” que é essencial para a sua inspiração. Mas o trabalho em Portugal não é fácil. Embora tenha publicado vários trabalhos em revistas nacionais já que teve recentemente dois cartoons nas primeiras páginas do Sol e do I, bem como nas de um importante jornal francês, o autor diz que essa publicação não é fácil “porque os jornais também não têm dinheiro”, e recorda além disso um outro trabalho que esteve a horas de ser publicado num semanário, mas que “por falta de espaço não saiu”. Ainda assim, Vasco Gargalo está também presente no movimento “Cartoon Movement” onde publica alguns dos seus trabalhos online, e expõe igualmente todos os dias no seu blog pessoal, a maioria dos seus cartoons. Para o autor, os atentados em França à redação do “Charlie Hebdo” acabaram por significar uma viragem no mundo dos cartoons e na forma como hoje é vista essa arte. Gargalo que refere ter renascido para a arte há três anos atrás, vinca que essa viragem trouxe uma nova visibilidade à profissão que escolheu, levando-o a fazer trabalhos ainda com mais paixão. O autor confessa não estar arrependido do caminho que escolheu, mas salienta que as dificuldades ainda persistem. Ainda assim Vasco Gargalo, tem um estilo próprio, e recorrendo à metáfora, consegue impactos muito positivos no que toca ao efeito dos seus cartoons. |
“Gostava de sentir o frenesim de uma redação de um jornal diário. Acompanhar a vivência de uma redação, as conversas com os jornalistas e ir beber café ou fumar um cigarro aproveitando os momentos de pausa, e poder usufruir desse convívio” |

Paulo Brissos lança disco com recurso ao crowdfunding
É um dos casos de persistência no panorama musical português. Apesar de nunca ter alcançado um êxito estrondoso com os seus discos, Paulo Brissos, de Vila Franca de Xira, nunca deixou de ser músico e a carreira tem sido contínua, com destaque nos últimos anos para a incorporação de canções suas em bandas sonoras de telenovelas do prime time português.
A música nasceu consigo, devido também a influências familiares, e como muitos músicos fez o circuito dos bares, e apareceu no Festival da Canção. Paulo Brissos lança agora mais um disco, com recurso também às novas tecnologias com o “Crowdfunding”, que permite a angariação de meios financeiros através de uma plataforma para o efeito na internet, especialmente dirigida ao apoio de projetos da área da Cultura e da Solidariedade.
“Tenho o meu lado filosófico e sentimental que também precisa de existir, quando chegamos à conclusão de que não vale a pena iludir algo em nós que é tão forte, a opção de voltar à música foi natural”
O primeiro trabalho que lançou foi em 1993, “contudo não foi um sucesso, passou apenas em algumas rádios”. Para se ter um “êxito estrondoso” Paulo Brissos entende que também é preciso ter sorte, sendo que as rádios nem sempre acarinham os cantores portugueses nesse âmbito. “Estão muito formatadas à música anglo-saxónica, altamente produzida e é difícil que haja espaço de manobra para a música pop portuguesa. Se a nossa música não é divulgada como é que as pessoas vão conhecer?”, interroga-se.
Nos anos 80 e 90 “havia mais programas de autor na televisão e na rádio para esse efeito. Hoje o que vimos na televisão é uma palhaçada e não enaltece a música portuguesa. Muitos talentos em Portugal não dispõem do tempo de antena que mereceriam”. Em contraciclo parece estar apenas “o fado que agora conheceu uma nova notoriedade face há alguns anos atrás. O estigma do fado acabou e isso é positivo”. Na indústria portuguesa “quando nem o pop é sustentável, a erudita e a mais alternativa ficam ainda mais frágeis, e isso cria um fosso no mercado”.
Na década de 90, o lançamento de “Criação” foi um marco na sua carreira, e a balada “Serás tu” a assumir-se como um dos maiores sucessos da carreira do músico vilafranquense. Com uma carreira a chegar aos 30 anos, Paulo Brissos considera que ganhar dinheiro nesta área só mesmo “com concertos ao vivo”. As editoras ficam sempre com a fatia de leão das vendas, até porque o investimento é difícil de pagar, e para o músico alcançar dividendos financeiros com isso só mesmo quando consegue vender bem. “Mas neste momento nem as editoras ganham dinheiro”.
No seu novo trabalho intitulado “Brissos Conselheiros de Estrada”, em que através do crowdfunding o músico conseguiu alcançar uma soma na casa dos 4000 mil euros “que superou as expetativas” – com o objetivo de apoiar a divulgação e comercialização do seu trabalho – apenas contou com uma editora para a sua distribuição “mas com investimento total” seu.
“Mais uma vez está a ser difícil colocar o meu trabalho nas rádios, mas estamos a apresentar-nos nas fnac’s e a fazer concertos acústicos, para além de já termos alguns espetáculos marcados”. O trabalho está à venda na Fnac e em outras lojas do género.
Já houve tempos mesmo depois de se ter lançado no mercado, onde retornou ao circuito dos bares, ou desistiu mesmo da música, mas regressou porque entende que não vive sem a arte . “Tenho o meu lado filosófico e sentimental que também precisa de existir, quando chegamos à conclusão de que não vale a pena iludir algo em nós que é tão forte, a opção de voltar à música foi natural, e continuar por esse caminho. Se não posso ter um carro topo de gama ou uma casa melhor, faço a minha gestão e tento viver com um bocadinho menos. São opções de vida. Não funciona para toda a gente o chavão de estudar, arranjar um emprego bem pago, e ter casa própria e um bom carro. Essa imposição pode ser altamente frustrante para muitos”. Para conseguir viver da música assumiu para além da vertente de cantor, a de produtor, tendo por isso colaborado com a Plural ligada ao mercado das telenovelas.
“Ser artista é um risco, e é preciso gostar mesmo”, conclui. Paulo Brissos também não estranha o facto de haver mais portugueses com a profissão de artista – “Hoje em dia o ordenado típico é de 500 euros, ora quem tem um bocadinho mais de capacidade, escolhe fazer o que gosta. Já que é para ganhar mal ao menos envereda-se por aquilo que é a vocação e o gosto de cada um”.
“Hoje frequentar espaços de arte é sinónimo de snobismo, de que se está bem na vida, e há quem procure fugir desse estereótipo”. |
João Mário, pintor naturalista
Uma história de vida que cabe dentro de um museu “Em pequeno nunca fui um aluno de sucesso porque só pensava em fazer desenhos e bonecos”. É assim que começa a história de João Mário, um dos principais nomes portugueses da pintura naturalista. Podia ser a história de apenas mais uma criança que nasce com jeito para desenhar, mas o alenquerense “nascido em Lisboa por mero acaso”; como gosta de frisar, acabou por ir mais longe. Nas décadas de 50 e 60, o naturalismo atingiu o seu apogeu, e o glamour das exposições frequentadas por quem tinha posses na altura, permitiam-lhe viver tranquilamente da arte, algo que hoje é impossível para qualquer artista. O seu mestre foi Álvaro Duarte Almeida a quem recorreu depois de uma incursão pela Sociedade Nacional de Belas Artes onde o desenho de nus e de naturezas mortas não o seduziu. Com o seu mestre pode exercitar a sua veia artística na plenitude, e lembra-se de pintar a cidade de Lisboa e as suas paisagens ainda na zona do aeroporto “mas quando aquilo era tudo mato”. “Devo tudo ao meu mestre, que depois também veio viver para Alenquer com a família. Aqui passámos a receber os alunos vindos de Lisboa”, recorda-se. Os tempos de hoje contrastam em absoluto com os de antigamente quanto à venda de quadros. A sua primeira exposição foi em 1954, e basicamente expunha duas vezes por ano nas principais cidades do país. “Quando abria as exposições, os quadros já estavam todos vendidos, mas hoje nem pensar nisso”. João Mário é um dos principais nomes da corrente naturalista, e nas décadas de 50 e 60 as suas obras “alcançaram uma cotação muito elevada, isto sem prosápia nenhuma”. Os tempos de ouro já lá vão, e embora continue a viver da arte e do seu museu, João Mário traça um cenário negro para o mercado de venda de obras de arte no que à pintura diz respeito: “Hoje, não se vende quadros de espécie nenhuma, e por outro lado as pessoas nem sequer vão às exposições, se porventura aparecem já esfregamos as mãos de contentes, até porque, atualmente, frequentar espaços de arte é sinónimo de snobismo, de que se está bem na vida, e que determinado indivíduo tem dinheiro, e há quem procure fugir desse estereótipo”, descreve, e vai mais longe: “Quando se fala que determinado espaço é muito frequentado não é mais do que fogo-de-vista”. Por ser um dos rostos (e talvez o mais importante atualmente) do naturalismo, João Mário não hesita em referir que este género de pintura mais popular sempre foi vista como menor pelos críticos e por outras correntes de pintura. “Há o receio de dizer bem de quem tem sucesso como Salvador Dali ou Picasso que foram figuras notáveis, e é muito difícil quebrar-se essa barreira”. Os abstracionistas “normalmente têm sempre os críticos do lado deles”. Para João Mário, não deveria existir gavetas até porque e como dizia o seu amigo José Hermano Saraiva “existe a arte que fica para toda a vida e a que passa”. As paisagens são a sua predileção, mas a vila de Alenquer é a grande inspiração de João Mário, por ser “extremamente pictórica”, e onde até à data já deverá ter feito “mais de 200 ou 300 quadros” na parte mais antiga. “É algo inacreditável, mas no mesmo metro quadrado consegue-se pintar seis quadros diferentes”. A fama de Alenquer já ultrapassou fronteiras, e muitos pintores espanhóis colegas de João Mário têm vindo experimentar as possibilidades da Vila Presépio. A última exposição de João Mário deu-se em finais do ano passado, mas já não expunha há três anos, dedicando-se em exclusivo à sua Casa Museu com cerca de 800 quadros e aos vários cargos que ocupa em associações locais e na Misericórdia de Alenquer onde é provedor. O pintor confessa que conseguiu vender 12 quadros, mas sem baixar preços, “ao contrário do que fazem alguns colegas, que baixaram o valor monetário das suas obras para mais de metade, ora isso desvaloriza completamente o quadro”. As profissões artísticas sofrem em grande parte do sintoma das ditas borlas, e a pintura não é exceção. A crise terá também agudizado esta questão, e João Mário lamenta: “Quando se pede uma borla, mas ontem até se vendeu quatro ou cinco quadros e amanhã vendemos mais uns, não tem problema nenhum fazer algo de graça, caso contrário é muito difícil, até porque as pessoas precisam de comer”. E vai mais longe: “Conheço colegas que estão muito mal, que pensaram no suicídio.” Sendo de uma geração mais velha de artistas, João Mário ilustra que “há os pintores que um dia venderam muito, e que hoje já não conseguem, mas que conseguiram adaptar o seu estilo de vida; os que exerciam outras profissões e têm a sua reforma, e depois temos esses casos críticos”. Para além das artes, João Mário teve também uma passagem pela Câmara de Alenquer nos finais da ditadura, mas não se considera político, e até se lembra de um diálogo com um ministro de Marcelo Caetano que queria que se candidatasse a outra Câmara, e que se não o fizesse quando chegasse a Alenquer já não era presidente, mas João Mário não se intimidou. Só saiu da autarquia com o 25 de abril, mas diz que não guarda mágoas do seu saneamento. Os anos passaram e voltaram a convidá-lo, inclusive o PCP de Alenquer mas recusou. “Achei um disparate”, ilustra rindo-se perante o inusitado. 500 visitas por mês à Casa Museu O espaço está de portas abertas há 26 anos e nele encontra-se reunido um vasto espólio com algumas das obras mais importantes de alguns pintores portugueses e também estrangeiros, como Malhoa ou Silva Porto. À volta de 500 pessoas visitam todos os meses o espaço, talvez o único museu privado de pintura figurativa na Península Ibérica desta dimensão. No ano passado, a Câmara que assume parte das despesas com o museu diminuiu as verbas a atribuir, contudo João Mário desdramatiza conformado, e com a sua bonomia característica: “A Câmara não tem vintém, não levo a mal, aliás sou amigo deles todos”. O museu João Mário tem conhecido histórias de pessoas que por ali passaram e que apresentam um cariz quase cinematográfico como a de um menino sobredotado, o Rui, da Amadora, que um dia em excursão de tão maravilhado que ficou com o museu, que prometeu que um dia voltaria a Alenquer para agradecer os momentos proporcionados com uma prenda. “Três anos mais tarde entrou por aqui adentro e deu-me um pequeno dinossauro de plástico. Era o brinquedo mais importante para ele”, conta, referindo que mais tarde foi à Amadora à sua procura, “mas tinha ido para Bragança com a mãe”. Há também a história da menina espanhola que lhe pediu para o mestre lhe dar a mão na visita à exposição e depois escreveu no livro de visitas: “que eu para a idade estava um gajo porreiro”, ri-se. |
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