O Abril do nosso descontentamento…
Por Daniel Claro
Há 41 anos um jovem que tinha “devorado” os excertos do livro “Portugal e o Futuro” escrito por António Spínola e publicados no então “revolucionário” jornal Expresso, acordava para a esperança de um outro tempo. Aquela manhã do “aqui Posto de Comando do Movimento…” lançava-o para a aventura de uma vida inteira. Partilhou sorrisos e esperança, gritou palavras de ordem ridículas como cartas de amor sabendo que o amor nunca é ridículo. Andou mundo, muito mundo… foi camponês sem o ser, criou jornais e participou neles com a caneta prenhe de tinta vermelha e tornou-se irmão de todos e todas que sorriam, sem perceber bem porquê, sabendo apenas que podiam livremente sorrir para o futuro. Mas foi então que vivendo todas as ilusões, a geração desse jovem quis cortar caminho, na sua ingenuidade tornou-se presa de interesses com experiência de todos os “mundos” e sucumbiu à facilidade de promessas de “Europas” transformadas em “Mecas” de bem estar sem esforço e sem cidadania….! E esse jovem viu-se perdido num tempo já sem tempo de uma geração que se perdeu e traiu o futuro. Cometeu erros, muitos erros, correu “de cá para lá e de lá para cá” na busca de um equilíbrio que já não existia.
Foi derrotado… derrotou-se! Mas a derrota contém em si ensinamentos, fermento de um “pão” que é preciso voltar a “amassar” com carinho e persistência na certeza que disso depende a vida. A nossa, dos nosso filhos e dos nosso netos… e é por isso que temos de ter consciência que…. este não é um qualquer Abril… este não é mais um Abril da Revolução do Cravos, da Democracia, em que olhávamos o passado e o interpretávamos de acordo com as nossas ideologias, as nossas expectativas, os nossos fracassos ou as nossas vitórias! Hoje este é outro Abril, o Abril do nosso descontentamento em que medimos a regressão nos padrões mínimos de vida em termos civilizacionais e em termos de desenvolvimento humano. Este é o Abril do desemprego, da discussão sobre os limiares de pobreza, da indignidade que nos é imposta por um governo que há muito tempo ultrapassou os limites da lei e da honra! Um governo que para ser eleito proclamou, a memória não pode ser curta, que sabia ao que vinha, conhecia a situação e que não arranjaria desculpas.
Ao invés disso, todos os dias há desculpas, confusão, malabarismos, mentiras e um revanchismo social que atinge sempre os mesmos! E tudo em nome que “os portugueses gastaram demais e viviam acima das suas possibilidades”! Traduzindo: tínhamos melhores serviços de saúde, educação e segurança social… no fundo, aquilo que distingue os países civilizados! E em torno disto foram construindo uma teia, que aproveitando o pântano político resultante do socratismo, nos procura todos os dias convencer da “verdade da mentira”! Na verdade, este país gastou realmente demais e sobretudo desgastou-se demais. Desgastou-se demais quando permitiu a destruição do seu aparelho produtivo, na construção naval, na metalomecânica, na indústria de bens transaccionáveis, na agricultura… em suma, em todos os sectores que economicamente definiam a soberania nacional.
E sim, gastou demais em auto-estradas para satisfazer as construtoras do “regime”, em parcerias público-privadas para satisfazer os gestores e as famílias financeiras do “regime”, em obras e políticas com propósitos eleitorais que conquistaram para os partidos do “arco do poder”, nas câmaras e na administração central, sucessivas maiorias… mas também na propaganda de um excessivo consumismo patrocinado para dar uma falsa sensação de bem estar que impedisse as pessoas de olhar de frente o que se passava. Ao mesmo tempo dava-se rédea solta ao sistema financeiro que com omissão criminosa da regulação do Banco de Portugal entrou em esquemas de risco e até em burlas como os BPN, BES e BPP, por onde fundamentalmente se escoou e escoa o dinheiro que eles dizem que nós gastámos. Porque, e mais uma vez invoco a memória colectiva, os ordenados em Portugal sempre foram bastante abaixo dos padrões europeus, as assimetrias entre os mais ricos e pobres sempre foram das mais elevadas da OCDE! Que a memória não seja curta e releve quem realmente gastou e sobretudo quem ganhou demais! Mas a culpa não morre solteira, Cavaco Silva idealizou e construiu este “regime” onde PSD, PS e a bengala CDS se foram revezando na destruição de um país e na ida a um pote onde parecia que o mel nunca mais acabava.
E chegámos hoje aqui… 25 de Abril de 2015… com um governo que em poucos anos destruiu o que restava da nossa economia (temos a 4.ª pior economia do mundo…), protegeu os bancos e aumentou exponencialmente a dívida pública portuguesa que atinge agora 130% da riqueza produzida. Impõe-se mudar este caminho, encontrar outras soluções! Esse é o desafio que se coloca hoje: a construção de uma alternativa que rompa com o descrença, com o conformismo, mobilize uma maioria social e sobretudo saiba discutir, aprofundar e apresentar aos portugueses, um plano estratégico novo para a nossa economia, relevando as nossas mais-valias e tendo como base o desenvolvimento económico, a dignificação do trabalho e do emprego (ao contrário do que muitos dizem não é a riqueza que produz trabalho mas o trabalho que produz riqueza e isso faz toda a diferença…) e a protecção a uma vida que mereça ser vivida na juventude ou na velhice. Precisamos hoje em Abril, de uma transformação social profunda a todos os níveis, de uma Revolução!
E citando Miguel Portas, falecido há três anos, “as revoluções não se fazem com heróis mas sim com as pessoas comuns” e numa outra frase, “nunca desisti de nada”…! Hoje, recuperando a cidadania, precisamos dizer: “as Revoluções fazem-se com pessoas comuns que não desistem de nada”! Seja em Abril ou Setembro, num qualquer dia, de qualquer mês, de qualquer ano! Lá nos encontraremos um destes dias….!
(Adaptado de uma intervenção feita numa sessão solene do 25 de Abril… que mantém hoje ainda maior actualidade…)
26-04-2015
Por Daniel Claro
Há 41 anos um jovem que tinha “devorado” os excertos do livro “Portugal e o Futuro” escrito por António Spínola e publicados no então “revolucionário” jornal Expresso, acordava para a esperança de um outro tempo. Aquela manhã do “aqui Posto de Comando do Movimento…” lançava-o para a aventura de uma vida inteira. Partilhou sorrisos e esperança, gritou palavras de ordem ridículas como cartas de amor sabendo que o amor nunca é ridículo. Andou mundo, muito mundo… foi camponês sem o ser, criou jornais e participou neles com a caneta prenhe de tinta vermelha e tornou-se irmão de todos e todas que sorriam, sem perceber bem porquê, sabendo apenas que podiam livremente sorrir para o futuro. Mas foi então que vivendo todas as ilusões, a geração desse jovem quis cortar caminho, na sua ingenuidade tornou-se presa de interesses com experiência de todos os “mundos” e sucumbiu à facilidade de promessas de “Europas” transformadas em “Mecas” de bem estar sem esforço e sem cidadania….! E esse jovem viu-se perdido num tempo já sem tempo de uma geração que se perdeu e traiu o futuro. Cometeu erros, muitos erros, correu “de cá para lá e de lá para cá” na busca de um equilíbrio que já não existia.
Foi derrotado… derrotou-se! Mas a derrota contém em si ensinamentos, fermento de um “pão” que é preciso voltar a “amassar” com carinho e persistência na certeza que disso depende a vida. A nossa, dos nosso filhos e dos nosso netos… e é por isso que temos de ter consciência que…. este não é um qualquer Abril… este não é mais um Abril da Revolução do Cravos, da Democracia, em que olhávamos o passado e o interpretávamos de acordo com as nossas ideologias, as nossas expectativas, os nossos fracassos ou as nossas vitórias! Hoje este é outro Abril, o Abril do nosso descontentamento em que medimos a regressão nos padrões mínimos de vida em termos civilizacionais e em termos de desenvolvimento humano. Este é o Abril do desemprego, da discussão sobre os limiares de pobreza, da indignidade que nos é imposta por um governo que há muito tempo ultrapassou os limites da lei e da honra! Um governo que para ser eleito proclamou, a memória não pode ser curta, que sabia ao que vinha, conhecia a situação e que não arranjaria desculpas.
Ao invés disso, todos os dias há desculpas, confusão, malabarismos, mentiras e um revanchismo social que atinge sempre os mesmos! E tudo em nome que “os portugueses gastaram demais e viviam acima das suas possibilidades”! Traduzindo: tínhamos melhores serviços de saúde, educação e segurança social… no fundo, aquilo que distingue os países civilizados! E em torno disto foram construindo uma teia, que aproveitando o pântano político resultante do socratismo, nos procura todos os dias convencer da “verdade da mentira”! Na verdade, este país gastou realmente demais e sobretudo desgastou-se demais. Desgastou-se demais quando permitiu a destruição do seu aparelho produtivo, na construção naval, na metalomecânica, na indústria de bens transaccionáveis, na agricultura… em suma, em todos os sectores que economicamente definiam a soberania nacional.
E sim, gastou demais em auto-estradas para satisfazer as construtoras do “regime”, em parcerias público-privadas para satisfazer os gestores e as famílias financeiras do “regime”, em obras e políticas com propósitos eleitorais que conquistaram para os partidos do “arco do poder”, nas câmaras e na administração central, sucessivas maiorias… mas também na propaganda de um excessivo consumismo patrocinado para dar uma falsa sensação de bem estar que impedisse as pessoas de olhar de frente o que se passava. Ao mesmo tempo dava-se rédea solta ao sistema financeiro que com omissão criminosa da regulação do Banco de Portugal entrou em esquemas de risco e até em burlas como os BPN, BES e BPP, por onde fundamentalmente se escoou e escoa o dinheiro que eles dizem que nós gastámos. Porque, e mais uma vez invoco a memória colectiva, os ordenados em Portugal sempre foram bastante abaixo dos padrões europeus, as assimetrias entre os mais ricos e pobres sempre foram das mais elevadas da OCDE! Que a memória não seja curta e releve quem realmente gastou e sobretudo quem ganhou demais! Mas a culpa não morre solteira, Cavaco Silva idealizou e construiu este “regime” onde PSD, PS e a bengala CDS se foram revezando na destruição de um país e na ida a um pote onde parecia que o mel nunca mais acabava.
E chegámos hoje aqui… 25 de Abril de 2015… com um governo que em poucos anos destruiu o que restava da nossa economia (temos a 4.ª pior economia do mundo…), protegeu os bancos e aumentou exponencialmente a dívida pública portuguesa que atinge agora 130% da riqueza produzida. Impõe-se mudar este caminho, encontrar outras soluções! Esse é o desafio que se coloca hoje: a construção de uma alternativa que rompa com o descrença, com o conformismo, mobilize uma maioria social e sobretudo saiba discutir, aprofundar e apresentar aos portugueses, um plano estratégico novo para a nossa economia, relevando as nossas mais-valias e tendo como base o desenvolvimento económico, a dignificação do trabalho e do emprego (ao contrário do que muitos dizem não é a riqueza que produz trabalho mas o trabalho que produz riqueza e isso faz toda a diferença…) e a protecção a uma vida que mereça ser vivida na juventude ou na velhice. Precisamos hoje em Abril, de uma transformação social profunda a todos os níveis, de uma Revolução!
E citando Miguel Portas, falecido há três anos, “as revoluções não se fazem com heróis mas sim com as pessoas comuns” e numa outra frase, “nunca desisti de nada”…! Hoje, recuperando a cidadania, precisamos dizer: “as Revoluções fazem-se com pessoas comuns que não desistem de nada”! Seja em Abril ou Setembro, num qualquer dia, de qualquer mês, de qualquer ano! Lá nos encontraremos um destes dias….!
(Adaptado de uma intervenção feita numa sessão solene do 25 de Abril… que mantém hoje ainda maior actualidade…)
26-04-2015
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