Valor Local
  • OUVIR RÁDIO
  • EDIÇÃO IMPRESSA
  • ESTATUTO
  • CONTATOS
    • FICHA TECNICA
    • ONDE ESTAMOS
  • PUBLICIDADE
  • VALOR LOCAL TV
  • PODCASTS

Opinião Augusto Moita: "A Morte Anunciada e o Morrer"

"Uns acabam com toda a dignidade em féretros e honras fúnebres prestadas por familiares e amigos; outros acabam indignamente nus e em gélidos “sepulcros” de formol!"
01-04-2018 às 18:53
Imagem
Caros leitores! 
Não pretendendo ser mórbido nem tão pouco ferir susceptibilidades, decidi nesta crónica, escrever sobre a morte, impulsionado pelo recente falecimento de um ente-querido e também pela leitura de um livro que intitularía de: «Crónica de uma morte anunciada» (apropriando-me do título de um livro do escritor colombiano, Gabriel Garcia Márquez), e que abaixo, referencio.  

Diz a sabedoria popular que “quem não morre novo, de velho não escapa”!
Esta é a única certeza que temos, pois é uma inevitabilidade da existência humana!
Como preâmbulo, digo-vos que, em medicina, o conceito científico de morte rege-se, naturalmente, por vários critérios, sendo que, o mais comum, é o da morte cerebral. Critério absolutamente irrelevante face ao sentimento de perplexidade, impotência, dor e angústia do homem, perante o seu fim. Esta consciência pessoal sobre a morte ou o fim da vida, surge com o passar dos anos, agudiza-se na entrada da terceira idade e subjuga o pensamento quando já “velhinhos” recuperam algumas das boas memórias numa vã tentativa de se agarrarem à vida que inexoravelmente terminará “a breve trecho”; ou ainda, quando surge com o evoluir de uma doença grave, tomando uma forma depressiva, desesperante e impotente ou quando pacificamente, sem desesperança e com abnegada aceitação e resignação. Mas há também, os que se agarram à vida, porquanto “enquanto há vida, há esperança”  e na lucidez, o pensamento nos ente-queridos e o sofrimento que lhes causaria a sua morte.

Neste contexto, há um extraordinário exemplo de uma vontade indómita de viver e de lutar contra uma morte que fora anunciada e, que se compagina no testemunho notável, de Joaquim António Ramos, no seu livro “A Ressurreição segundo Mister Cohen” cuja leitura recomendo vivamente aos meus leitores. Já o escritor José Cardoso Pires (1997) chamou “morte branca” à vida sem memória, após acidente vascular cerebral.

Mas se, os que em vida, e como diz o poeta: “E aqueles que por obras valerosas/Se vão da morte libertando” (Luis de Camões), foram amados e amaram e, tiveram uma vida repleta de desejos e realizações múltiplas; outros há, que estranhamente, na sua morte não deixam qualquer “legado”, nem dor, nem saudade nos outros; são pessoas que  simplesmente deixam de existir à face da terra, como se nunca tivessem sido “gente” (sem identidade) ou estado em qualquer lugar (onde viver), que fenecem, confirmando uma morte que há muito tinha “ocorrido na sociedade” ou que estava há muito anunciada.

Refiro-me concretamente a todos os “mortos-vivos” (desculpem-me a expressão) - os sem memórias, os dementes, os que vivem em estado vegetativo, os que estão em estado terminal, os dependentes de tudo e de todos, etc. - mas, particularmente os indigentes, os sem-abrigo (que são desprezados/ostracizados). Estes, quando “morrem clinicamente” há muito que já se “encontravam mortos”, seja no interior de si mesmos, seja na falta de identidade própria, e/ou na recordação de qualquer ente-querido e, cujos corpos (despojos humanos) acabam numa laje de um qualquer Instituto de Medicina Legal, para mais tarde servirem de atração principal no proscénio de um qualquer hospital, para gáudio de imberbes estudantes de medicina.           
 
A morte, é naturalmente, o reflexo da vida que a antecede. Uns acabam com toda a dignidade em féretros e honras fúnebres prestadas por familiares e amigos; outros acabam indignamente nus e em gélidos “sepulcros” de formol!

A morte de alguém, leva indelevelmente consigo, não só a sua identidade mas também a dos seus, transportando o nome de uma família. Os outros, os indigentes, os sem identidade, não só não serão reclamados para um funeral condigno, como permanecerão nos corredores inóspitos de uma qualquer morgue, aguardando a vez dos seus corpos serem esventrados, vilipendiados e exibidos.  
Mas...e apesar de tudo isto, não há pior perda: a mais dolorosa, ignóbil, incompreensível, revoltante, inaceitável  e que questionará a nossa fé, do que a de um filho!  
​
Igualmente triste e sórdido é o que acontece aos idosos que perdem os seus cônjuges e que com eles se deixam “morrer também”, numa existência doravante inócua, solitária e dramática, passando a “viver” esperançosos que o “dia do juízo final” ocorra “amanhã”.
Que me perdõem os leitores a dramaticidade desta crónica!
​
Até à próxima e boas leituras.      


Comentários

Já conheço o prof. Augusto Moita, e sei que tem uma grande qualidade de escrita e de pensamento. Naturalmente que gostei.
Cumprimentos

José Lorenzo
Cartaxo
02/04/2018 20:48

    A sua opinião conta:

Submeter
PUB
Imagem
Imagem

Outras Notícias

Imagem
Escola da Quinta dos Gatos a necessitar de intervenção urgente
Imagem
Vila Museu do Vinho, em Aveiras de Cima, é candidata às 7 Maravilhas à Mesa

Imagem
Jornadas da Educação em Arruda com a presença de personalidades ​do ensino

Leia também 

Picture

As Marcas da Nossa Saudade

Os anos 50 do século passado foram em Portugal uma década de ouro no que a marcas diz respeito. Um pouco por todo o país floresceram muitas empresas que ainda hoje estão no ativo, ou pelo menos no nosso imaginário
Picture

Processo legionella- "Aquela fábrica está muito degradada"

Três anos passados do surto de legionella, e depois do processo ter-se tornado público ouvimos testemunhas privilegiadas daqueles dias que abalaram o concelho de Vila Franca de Xira e o país.
Picture

50 Anos das Cheias - As memórias de uma tragédia nunca apagadas

Na madrugada de 25 para 26 de novembro chuvas torrenciais inundam a região de Lisboa. Na primeira pessoa apresentamos os relatos de quem viveu esta tragédia por dentro e ainda tem uma história para contar 50 anos depois.

Jornal Valor Local @ 2013


Telefone:

263048895

Email

valorlocal@valorlocal.pt
  • OUVIR RÁDIO
  • EDIÇÃO IMPRESSA
  • ESTATUTO
  • CONTATOS
    • FICHA TECNICA
    • ONDE ESTAMOS
  • PUBLICIDADE
  • VALOR LOCAL TV
  • PODCASTS