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Opinião Joaquim Ramos: "As escolas do Plano Centenário"

Obriga a verdade a que se diga que as Ditaduras também fazem coisas bem feitas. O problema é que por cada atitude benéfica cometem cinquenta tropelias e atentados à dignidade humana.
26-02-2018 às 17:39
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Hoje, o tema da edição do ValorLocal leva-me a que escreva sobre o assunto: as escolas do Plano Centenário.

Nunca andei numa escola do Plano Centenário. Fiz a instrução primária na única escola que havia, então, em Azambuja e arredores. Aquela escola na Rua Direita (como era conhecida na altura a Rua Eng. Moniz da Maia) que foi misericórdia antes de ser escola e hoje é a Biblioteca Municipal. Uma biblioteca que não foi iniciada por mim, mas que tive a sorte de inaugurar. Fiz a cerimónia de inauguração na mesma sala onde, mais de quarenta anos antes, eu aprendi a ler e a contar, a decorar os rios e as serras de Portugal, as linhas de caminho de ferro, e levei várias doses de reguadas do Professor Mota, primeiro, e da sua esposa, depois.

Aquele edifício agora cor de rosa foi sempre um marco determinante nas diversas funções que desempenhou. Um exemplo de solidariedade e misericórdia, quando vocacionada a causas de apoio social. O local por onde gerações de azambujenses, indígenas e casaleiros, aprenderam esses três pilares da civilização que são ler, escrever e contar. Nas salas por onde cantei o Hino Nacional, por baixo dum crucifixo e do olhar paternal da fotografia do Doutor Salazar, passaram a minha mãe, a minha avó, os meus bisavós e por aí fora.

Qualquer intervenção de fundo numa escola do Plano Centenário. Talvez porque a intenção dos diversos Ministros que passaram pela Educação fosse acabar com o tipo de escola que as Centenárias simbolizavam. Ou porque a filosofia reinante na área da Educação seja a de massificá-la e despersonalizá-la, tornando-a mais técnica que humana, e não o ensino de proximidade e disciplina que as escolas do Plano Centenário representam- o que deu no mesmo: a sua extinção.

Obriga a verdade a que se diga que as Ditaduras também fazem coisas bem feitas. O problema é que por cada atitude benéfica cometem cinquenta tropelias e atentados à dignidade humana.
O programa das Escolas Centenário foi um plano bem pensado e executado, delineado com uma finalidade nobre que cumpriu: democratizar um pouco mais o acesso a letras e números.
É curioso como um regime projetou e pôs em marcha um plano que ia de encontro aos princípios que esse mesmo regime combatia ferozmente noutros contextos.

As escolas centenárias combatiam o analfabetismo crónico do País, que era uma coisa que dava muito jeito a uma Ditadura. Gente que não sabe ler nem escrever não enche a cabeça com ideias revolucionárias que perpassam por panfletos mais ou menos clandestinos.

As escolas centenárias obedeciam todas ao mesmo projeto – ou ao mesmo tipo de projeto -, o que cheira assim a coisa de comunista, programa à União Soviética, uma série de construções todas iguais a espalhar por esse País fora, tipo Bairro Operário da cintura de Lisboa. E não consta doutras obras públicas esta opção arquitetónica tipo republica de leste.

As escolas centenárias eram iguais para todos. Não havia uma Escola Centenária para ricos e uma Escola Centenária para pobres. Não. Era igual para todos, o filho do agrário com o filho do agricultor, o do médico com o do pescador. Conviviam e aprendiam nas mesmas salas ou brincavam debaixo das arcadas que as caracterizavam ricos e pobres, numa promiscuidade social incompatível com a rígida fronteira de classes sociais que o Estado Novo promovia e formatava. Só não podia era haver mistura de sexos, meninas com meninos – o Estado Novo podia dar a sua escorregadela nos rígidos princípios de estratificação social que defendia com bufos e polícias. Mas nessas coisas que podem levemente cheirar a sexo e pecado, a Igreja é que mandava, e misturar sexos era coisa que não agradava a Sua Eminência o Cardeal Cerejeira.

Foi um bom plano, o das Escolas do Plano Centenário. Ainda por cima, no plano arquitetónico, e no meu ponto de vista, são belas construções.

Mas a verdade é que a filosofia que se introduziu na área da Educação provocou que deixassem de servir e foram sendo encerradas e abandonadas. Duvido que haja hoje qualquer escola do Plano Centenário a funcionar como Escola.

As Autarquias, a quem tinha sido atribuída a propriedade das escolas, ficaram com a responsabilidade de manter em pé uma estrutura que não tinha função e, como casa desabitada é casa abandonada, foram-lhes dando, e bem, outras finalidades – no nosso caso, atribuídas a Associações ou Coletividades. Outros Municípios deram-lhes outras utilidades e algumas até foram vendidas para habitação. Eu cá acho muito bem, desde que conste da venda a obrigatoriedade de manter a traça.

Olhem, eu, por exemplo, não me importava nada de morar na Escola do Plano Centenário dos Casais de Britos. Já viram a beleza daquele edifício? Já repararam que dela se vê até ao sul do Tejo?



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