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Opinião Joaquim Ramos
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02-07-2019 às 21:04
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É uma guerra antiga, esta do combate às pragas na agricultura e nas florestas. É antigo este combate, como o é também o dos apologistas da guerra através de meios químicos contra os que defendem meios biológicos, e vice-versa.
Lembro-me de ter assistido, há anos, à defesa duma tese de doutoramento no Instituto Superior de Agronomia, cujo tema era precisamente as vantagens da luta biológica em relação às armas químicas, onde se incluem os glifosatos. A defensora da tese defendia com unhas e dentes as vantagens para o meio ambiente de se travar os males que atacavam o sobreiro através de agentes biológicos, isto é, de desenvolver plantas que fossem, elas próprias, atacar os fungos e outras maleitas que atacam as árvores da cortiça. Esteve para aí meia hora a divagar sobre o assunto, tentando explicar a série de procedimentos e reações que a introdução duma espécie de bactéria benigna junto das raízes do sobreiro provocava, por forma a que o montado ficasse livre do mal que o atacava. O professor arguente ouvia com toda a atenção e paciência a explicação da doutoranda e quando ela acabou, respondeu-lhe: “Muito bem, minha senhora, foi muito lógica e convincente a sua explicação. Mas eu, se quisesse salvar o montado, agarrava nas suas bactérias de luta biológica e deitava-as para o lixo, e aplicava uma solução química de calda bordalesa no tronco!”. É antiga e encarniçada esta disputa entre os defensores de uma e doutra mezinha. Mas, na verdade, temos assistido ao longo dos tempos a uma evolução desta batalha que se traduz no desenvolvimento cada vez maior de agentes biológicos de desinfestação em detrimento dos agentes químicos e, mesmo quando é imperiosa a utilização destes últimos, o desenvolvimento de métodos e produtos cada vez menos agressivos para o ser humano e para o ambiente em geral. Desde tempos imemoriais que a humanidade é posta perante este dilema: por um lado, dispor de alimentos suficientes para uma população cada vez maior e que, nos últimos cem anos, tem crescido duma forma exponencial. Por outro lado, respeitar os ciclos naturais e a harmonia ecológica. Por volta do ano de 1800 a população mundial atingia mil milhões de habitantes. No ano 2000 éramos 6 mil milhões, isto é, a gente que cohabita na Terra sextuplicou em 200 anos, numa taxa de crescimento que nunca antes se tinha verificado. Estima-se que em 2020 estejamos a bater os 8 mil milhões. Naturalmente que os governos e as organizações internacionais têm que dar resposta à crescente procura de alimentos que esta explosão demográfica impõe. O recurso à sobreexploração das capacidades naturais da Terra através duma agricultura e atividades afins mais intensivas e com maior produtividade exige, também, que seja intensificado o combate às pragas agrícolas e que se recorra a operações agrícolas químicas, como a monda, com todas as implicações que de tal uso decorrem. Felizmente, do meu ponto de vista, a investigação sobre estas matérias e as crescentes preocupações com o ambiente tem conduzido a práticas agrícolas mais consentâneas com a sustentabilidade dos ecossistemas. Um bom indicador dessa minimização, que se tem perseguido, dos efeitos colaterais de práticas agrícolas agressivas é bem patente no caso das cegonhas, em Portugal. Creio que será do tempo de alguns dos leitores a quase extinção das cegonhas na paisagem portuguesa. Esse processo ficou-se a dever ao facto de os pesticidas utilizados provocarem a morte dos principais vetores de alimentação desta espécie: rãs, cobras, ratos e outros pequenos animais que pululam por searas e arrozais. O desenvolvimento de formas de combate às pragas agrícolas menos agressivas e mais dirigidas veio inverter esse processo e hoje em dia as cegonhas, que já encontram alimento, são elas próprias quase uma praga. Naturalmente que se espera que a investigação científica e o interesse da humanidade em geral se sobreponham aos interesses das grandes companhias produtoras de pesticidas e agentes químicos, nos quais se incluem os glifosatos ainda hoje tão utilizados na agricultura, particularmente na extensiva, como se pratica na nossa lezíria. O que se espera de universidades, centros de investigação e organismos públicos é que sejam desenvolvidos processos de luta que demonstrem ser inócuos quer para o ambiente quer para a saúde pública. Quer-me parecer que esse será um processo que passa sempre pelo aperfeiçoamento de métodos biológicos em detrimento de processos de manipulação química. |
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Já agora, mudando de assunto e tocando no tema apenas pela rama – teria pano para outra crónica – não é possível dar umas doses de glifosatos a todas as comissões e grupos de desburocratização, simplex, reforma administrativa, modernização e simplificação de métodos e processos que têm sido criados ao longo dos anos? É que basta ir tratar de qualquer coisa num organismo público ou numa empresa de serviço público, estilo EDP, para perceber como se complicaram os processos, como somos emaranhados numa teia de burocracia para tratar dum assunto que é vital para o nosso quotidiano, como a quantidade de papel que somos obrigados a preencher, submeter ou depositar quadriplicou nos últimos vinte anos. Oh senhores que mandam, criem um Complex; como nós reagimos normalmente ao contrário do que se espera, pode ser que as coisas se simplifiquem…
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