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Opinião João Santos: "Política, redes sociais e efeito câmara de eco"

"Isto leva o ser humano a exagerar as diferenças entre o 'nós e os outros', a ser cada vez mais intolerante e a extremar posições. É este o quadro geral das sociedades contemporâneas, muito particularmente no âmbito político."
07-08-2020 às 17:18
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Atualmente, nos espaços de comunicação criados pelas redes sociais, vamos assistindo a intervenientes políticos que orquestram o pânico moral e incitam ao descontentamento social.

Com o avanço da era tecnológica, o ambiente de comunicação no “espaço” público é agora caótico e até anárquico. Nesta nova ordem de comunicação, parece valer tudo.

É importante ter presente que a violência não ocorre apenas a partir da força física. A violência também tem expressão escrita, gráfica e oral. Por vezes, até mais expressão e intensidade. É com estas formas de agressão que temos convivido nos últimos tempos e que têm vindo a alimentar, de forma irracional, os ódios que vão dividindo a sociedade. É um “ambiente selvático”, desprovido de regras.

No universo dos conteúdos gráficos e multimédia não há reservas, nem limites, destratando-se pessoas, culturas e identidades. Todos os que são parte ativa desta conjuntura devem colocar as mãos na consciência quando veem acontecer as manifestações de ódio a que temos assistido nos últimos tempos e que, em algumas ocasiões, assumem dimensão de tragédia.

Infelizmente, tenho poucas dúvidas de que as narrativas e os discursos odiosos, que instigam à discórdia e à insatisfação, vieram para ficar; correspondem a um dos grandes problemas do cenário político da atualidade, sendo as redes sociais o instrumento preferencialmente utilizado para o efeito.

Todavia, também não é menos certo que a natureza peculiar de boa parte da política atual resulta da forma irrefletida como a sociedade em geral absorve a informação que lhe chega através dos espaços de comunicação online. Parece que as suspeições acerca da credibilidade das instituições, as notícias falsas, os boatos e as insinuações preenchem o “vazio” na vida de muitos daqueles que usam as redes sociais. Os agentes políticos que utilizam a pobre estratégia da maledicência, fazem-no porque há efetivamente predisposição do público-alvo para o “consumo” de informação com estas características. É o pensamento crítico (ou a ausência dele) em equação.

Tal como acontecia nas culturas humanas ancestrais, também os utilizadores das redes sociais, na atualidade, interagem mais com quem partilha as suas opiniões e condutas.

Muito foi já escrito sobre o “efeito câmara de eco” (echo-chamber effect), descrição metafórica que nos ajuda a compreender a propensão do ser humano para se cercar de pontos de vista com os quais tem prévia concordância e a distanciar-se daqueles que expressam opiniões opostas.

Isto leva o Ser humano a exagerar as diferenças entre o “nós e os outros”, a ser cada vez mais intolerante e a extremar posições. É este o quadro geral das sociedades contemporâneas, muito particularmente no âmbito político.

Alterar posições ou permitir que novas circunstâncias introduzam nuances nas nossas convicções ou crenças, mesmo nas que firmemente defendemos, é essencial para evitar a polarização que perverte grande parte de nossa política. Não há nada de irracional em mudar de ideias. Pelo contrário, talvez seja difícil, sim, compreender as posições desafiadoramente conservadoras e dogmáticas perante um mundo em mutação intensa e permanente.

São necessários líderes que deem o exemplo a este nível, que sejam corajosos, que corram riscos, que evitem a popularidade fácil e que apresentem disposição para enfrentar as inevitáveis ​​acusações de inconsistência. Os líderes devem acrescentar valor pela positiva.

Enquanto este paradigma não se alterar, o que poderia ter tido um efeito benéfico na vida pública, ameaça-a, ao invés. Chega a parecer que as redes sociais foram criadas para garantir formas de tribalismo primário e para fomentar a prática da intransigência e da imponderação.

Muito recentemente, ouvi o humorista Ricardo Araújo Pereira contar uma história que retrata na perfeição o tipo de “debate” que vai circulando em boa parte dos fóruns públicos de comunicação online: um avô, uma criança e um burro atravessam tranquilamente uma aldeia quando, de repente, são ofendidos e apelidados de pouco inteligentes.

“Têm um burro, mas vão os dois a pé”, ouviram eles em tom jocoso. O idoso, envergonhado, decide então pôr-se em cima do burro. Quando atravessam outra aldeia, é novamente alvo de ofensa, pois vai montado no burro enquanto o pobre menino vai a pé. O avô toma então a decisão de sair de cima do burro, cedendo o lugar ao neto. No momento em que chegam a uma outra aldeia, são novamente injuriados, pois o senhor, que é idoso, vai a pé. “A criança, cheia de energia, é que vai montada no burro. São mesmo ‘inteligentes’”, ouviram eles.

Infelizmente, esta história ajuda-nos a compreender perfeitamente uma parte significativa da comunicação das redes sociais. Volto ao nível de pensamento crítico e à forma como alguns políticos - cuja qualidade devemos necessariamente questionar - se vão aproveitando disso de uma forma eticamente reprovável.

Deixar tudo como está é contribuir para mais crises e mais desastres sociais. É muito importante equilibrar a liberdade, que tão dificilmente se alcançou, com sentido de responsabilidade. Nesta mudança que urge, os políticos assumem o protagonismo; são quem deve dar o mote.
​
Termino com ironia, fazendo referência a uma dimensão paralela, em que as redes sociais são utilizadas para moldar a nossa conceção política para melhor. Nesta realidade (imaginária), os pontos de vista e as crenças são expressos generosamente e acolhidos com entusiasmo. Cada um de nós permite que os seus preconceitos sejam desafiados, aceita e respeita opiniões opostas e aprende com aqueles que veem o mundo de maneira diferente da sua. 

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