Francisco Oliveira, presidente da Águas do Ribatejo
“O Grupo de Lesados ajudou-nos a melhorar a nossa relação com o cliente” Os objetivos para o futuro do sistema intermunicipal, os desafios do setor, as queixas dos munícipes em destaque nesta entrevista
|10 Jul 2022 11:03
Sílvia Agostinho/Miguel António Rodrigues Já no seu 12º ano de atividade, a Águas do Ribatejo enfrentou desde a pandemia uma onda de contestação em grupos de Facebook nunca antes vista. A empresa considerada modelo entre os players do setor já gozou de melhor fama entre os consumidores. Francisco Oliveira, presidente da AR, considera como positivo que tenham aparecido essas pessoas. Os objetivos para o futuro do sistema intermunicipal, e os desafios do setor nesta entrevista
Valor Local- Em 2019 anunciou numa entrevista ao Valor Local um investimento de 38 milhões de euros para quatro anos, numa altura em que até 2018 já tinham sido concretizados entre 2013 e 2017 quase 130 milhões. Qual é o ponto de situação neste momento, tendo em conta que tivemos uma pandemia pelo meio, e como tal o que foi efetivamente concretizado? Francisco Oliveira – Muito foi concretizado apesar das contingências do mercado. Tivemos uma grande dificuldade na realização e concretização de obra, porque há dificuldades na disponibilização de materiais e de mão de obra tornando mais difícil cumprir com os prazos de execução. Estamos a fazer os possíveis para cumprir com o que está acordado com o gestor dos fundos comunitários, aumentando a disponibilidade do serviço da Águas do Ribatejo. Mas destes 38 milhões tem ideia de quanto é que foi efetivamente aplicado? Neste momento não tenho. Quais as obras mais importantes que estão ou ainda vão estar a decorrer no terreno? As mais importantes prendem-se com o efluente esgoto. No que respeita ao fornecimento de água nos sete municípios estamos todos ao mesmo nível. A grande aposta é agora a construção ou a requalificação de novas estações de tratamento de águas residuais para dar cumprimento aos objetivos ambientais. Este ano está prevista a inauguração de um conjunto de várias ETAR, desde Coruche, Benavente, Torres Novas, entre outros concelhos. Tendo em conta que não é possível colocar estações de tratamento em todas as localidades, que outras soluções, a Águas do Ribatejo tem pensado para este tipo de locais? De facto, temos muitos territórios de baixa densidade com grande dispersão demográfica o que acarreta para a Águas do Ribatejo um acréscimo dos níveis de investimento. Temos as fossas sépticas que são consideradas equipamentos de tratamento de efluente residual. Por outro lado, junto dos clientes é possível também a recolha através do pagamento da tarifa do saneamento com direito a duas ou três limpezas dos seus reservatórios por ano. Foi a medida que se encontrou. Em 2019, altura da nossa última entrevista, as perdas de água andavam nos 32 por cento. O senhor presidente disse que a meta era chegar à casa dos 20 por cento, qual é o ponto de situação? É verdade temos esse objetivo. Hoje devemos andar nos 28 por cento. Não é igual em todos os municípios, mas é a média. Estamos a falar de água não faturada ou de água que se perde e para tal estamos a efetuar zonas de controle de abastecimento, fazendo uma setorização de forma a percebermos os problemas de determinado troço - quais são os níveis de perda e irmos à procura dessas roturas. É um trabalho muito difícil e rigoroso, porque as perdas por vezes não são nas condutas, mas nos ramais. ASSISTA AO VÍDEO DA ENTREVISTA
Nos últimos anos entrou em cena o denominado Grupo de Lesados da Águas do Ribatejo, no fundo clientes descontentes com a política da empresa e os seus procedimentos, e que numa entrevista à Rádio Valor Local se queixou, entre outros assuntos, da roleta russa das faturas milionárias e das contagens inverosímeis. Este grupo veio acabar com um aparente estado de graça da Águas do Ribatejo que passou a conhecer um nível de contestação nunca antes visto, uma empresa que entre os players do setor é um exemplo, mas pelos vistos não é assim para os seus clientes e munícipes que vieram colocar em causa a AR e as suas práticas.
Não necessariamente. Somos a empresa com o melhor equilíbrio tarifário da região e isso é indiscutível. Basta compararmos com os tarifários de outras empresas, como o mais acessível para o consumidor. Ainda este ano reduzimos o tarifário de abastecimento da água. O que acontece é que há sempre circunstâncias, nomeadamente, no período de Verão em que há um maior consumo de água. Mas este grupo de pessoas também foi importante para a Águas do Ribatejo poder afinar algumas áreas, nomeadamente, as leituras dos contadores no sentido de podermos ser mais assertivos, evitando-se atrasos e valores acumulados. Mas quando aparecem faturas no valor de milhares de euros como aconteceu, isso quer dizer que a empresa não tem funcionários em número suficiente para ir fazer a leitura dos contadores? Durante a pandemia tivemos problemas de saúde nos nossos funcionários, e por esse motivo não foi feita a contagem com a regularidade exigida. Obviamente que nalguns casos entrou também a componente da gestão de resíduos, a taxa de gestão de resíduos, que aumentou, ao contrário da água e do saneamento. Quando fala das faturas milionários e tendo sido detetados, eventualmente, erros, lapsos ou até avarias, essas situações foram todas retificadas. Segundo este grupo, foi escasso esse número de retificações face ao número exponencial de reclamações. Naquelas em que de facto foram apuradas irregularidades isso aconteceu. Nas outras não se pôde fazer isso. A empresa apesar de servir os munícipes tem de cumprir aquilo que é a regularidade da sua faturação, e, portanto, digo que o contador é como o algodão e não engana. Em conclusão sempre que há avaria no sistema de contagem ou por alguma circunstância aconteceu uma rotura, a Águas do Ribatejo tem junto dos seus clientes a atenção de não faturar aquilo que é água perdida no terreno, não sendo cobradas as taxas de saneamento, as tarifas de resíduos. A demanda é muita e sobretudo no verão em que as nossas captações quase não conseguem compensar aquilo que é o consumo de água. Foi possível fazer, pelo menos, acordos de pagamento com estas pessoas que foram surpreendidas por elevados valores nas suas faturas? Já tínhamos esse mecanismo e de certa forma aumentámos essa possibilidade tendo em conta o estado económico do país, estendendo os prazos para os acordos de pagamento, sem cortes no abastecimento de água. Continuamos hoje em dia com um número muito elevado de acordos de pagamento. Não tenho ideia de quantos, mas isso acontece em todos os concelhos. Queremos facilitar a vida aos nossos cidadãos e clientes. Ainda neste rol de críticas é dito que a AR não admite a existência de falsas contagens por via de refluxos de água, entrada de ar nos contadores, existência de eletricidade parasita nas redes, (esta última nos contadores eletrónicos e que a própria entidade reguladora aceita que isso pode acontecer por questões técnicas). Os nossos contadores são iguais aos de outras entidades gestoras. Nós não dizemos que o contador é 100 por cento fiel àquilo que é a passagem de água. Os contadores, hoje em dia, têm um nível de sensibilidade que essas questões não são acolhidas tecnicamente como válidas, como a existência de ar nas condutas ou eletricidade estática como capazes de desvirtuar significativamente o real valor das faturas. Admitimos que possam existir, mas estamos a falar de valores mensuráveis ao nível de uma grandeza muito pequena. Não digo que essas pessoas não tenham razão, mas o problema principal é abrir a torneira e fazer consumo de água de forma pouco cuidada. Os recursos hídricos são finitos. Embora a água seja um bem público temos de a gerir como tal. Senhor presidente, o ónus do problema não pode ser apenas visto do lado dos consumidores, quando por exemplo e isto acontece, o funcionário da Águas do Ribatejo não aparece todos os meses para fazer a contagem, e nem toda a gente está familiarizada com a possibilidade de dar as contagens ou de usar as aplicações eletrónicas. Ora bem! Mas os nossos funcionários têm a sensibilidade de informarem os clientes sempre que há uma leitura anormal, alertando-os para o facto. Por isso foi bom ter aparecido este grupo de pessoas, esta associação, que nos ajudou a afinar aqui este tipo de questões, porque não somos donos da verdade. Mas pelo que se percebe ainda há um mal-estar destes consumidores em relação à Águas do Ribatejo, pelo menos a avaliar pelas redes sociais. A AR não foge à regra do que acontece em outros sistemas. É um facto que a empresa tem tido o reconhecimento do grande serviço que tem prestado… Entre os pares, porque entre os consumidores é mais difícil. É preciso vermos que se este grupo de municípios não tivesse constituído a Águas do Ribatejo, hoje em dia as Câmaras não tinham condições de possuírem esta dimensão de serviço. Quando olhamos para outros onde não ocorreu a agregação o nível de serviço é muito inferior, sendo que essas entidades suportam mais de 50 por cento dos custos do sistema, e por isso têm faturas ao consumidor mais baixas. As entidades públicas devem refletir no consumidor final aquilo que é o custo do bem, mas sem subsidiar o sistema, fazendo dumping. Um dos grandes desafios no futuro no nosso país e no setor em particular será fazer com que as pessoas paguem na fatura o que efetivamente produziram a nível de resíduos, mas sem indexação ao consumo de água. Uma campanha da Deco já dizia que lixo não é água. Como é que também no seio da Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas (APDA) da qual é presidente da assembleia geral veem esta matéria?
Essa é uma questão muito presente a par de outras como as alterações climáticas, a cibersegurança dos sistemas. No caso dos resíduos o problema é muito complexo e exige uma mudança de paradigma, porque ainda são pouco tratados. Efetivamente não é justo que alguém que consuma mais água tenha de pagar mais resíduo. Mas também tenho dificuldade em perceber como podemos migrar para outro sistema. A recolha porta-a-porta (seletiva) que a Ecolezíria, (que abrange cinco dos concelhos da Águas do Ribatejo) pretende implementar nos vários concelhos pode dar resultado neste aspeto? Pode, mas tem encargos brutais para as entidades gestoras. Temos um projeto piloto no sentido de avaliar nas áreas de maior concentração urbana a viabilidade deste sistema, com recolha dos biorresíduos, com o intuito de se desviarem fluxos, por forma a não termos de levar resíduo para aterro, e com isso diminuírem-se as taxas. Hoje em dia temos valores brutais nos resíduos que depois são canalizados para o Fundo Ambiental, mas há aqui uma injustiça porque a Taxa de Gestão de Resíduos acaba por não financiar o sistema pelo menos diretamente. Temos de facto de identificar nesta discussão cada poluidor/consumidor e isso pode acontecer no porta-a-porta onde cada munícipe tem o seu contentor individual e conseguimos pesar e ver quanto é que tem de pagar. Até porque se não alterarmos este sistema, o cidadão pensa que pode continuar com os seus hábitos porque está a pagar para isso, desprezando a reciclagem e a separação dos resíduos. A Águas do Ribatejo apanha por tabela nesta componente dos resíduos. Em 2019, a Águas do Ribatejo criou o seu regulamento de serviços, um instrumento fundamental na relação com o consumidor. Porquê, apenas, ao fim de 10 anos? Repare que existe a lei geral. Tivemos de nos adaptar às regras da ERSAR e o regulamento no fundo apenas expurga da lei geral o que são as obrigações das entidades gestoras. Mais recentemente e aquando da atualização do tarifário para este ano, a Águas do Ribatejo recebeu uma recomendação da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) para baixar o preço das tarifas. Em causa estariam proveitos tarifários superiores aos verificados entre julho de 2020 e julho de 2021, e que não estariam alinhados com o contrato de gestão delegada em vigor. Trocando por miúdos a ERSAR considerou que a AR estava a onerar mais do que devia as tarifas. Nalguns parâmetros o que o regulador nos disse é que podíamos eventualmente reclamar dessa situação, mas como fomos alertados de que durante esse determinado período houve um incumprimento decidimos acatar, e reduzir os 2 por cento sem qualquer problema. Mas por que não fez logo esta atualização? O tarifário tem uma série de parâmetros que devem ser repercutidos para se chegar ao valor das tarifas como o consumo e a disponibilidade, fixas e variáveis. Um desses parâmetros precisou de uma afinação. Fizeram mal as contas inicialmente? Não fizemos mal as contas coisa nenhuma. A regulação do tarifário levou-nos para esse valor e corrigimos. Como é que estão a correr as adesões ao My Aqua (aplicação destinada a comunicar leituras e gestão do contrato)? Tem estado a correr bem. É importante termos disponíveis estas novas acessibilidades para denúncia de roturas ou para facultar as leituras. É um serviço importante nesta relação com os clientes que se sentem mais à vontade para lidar com tecnologias. A ERSAR já disponibilizou o Relatório Anual dos Serviços de Águas e Resíduos em Portugal para o ano 2021, em que a acessibilidade económica ao serviço é considerada como boa. Aliás na área de influência dos nossos sete concelhos acaba por ser onde é mais barata a fatura da água, apesar das críticas de que a água está cara aqui nos concelhos da AR. Está a ver?! Afinal acaba por dar consistência a tudo o que eu disse até agora. Isto significa que temos feito um nível de investimentos que permite servir o munícipe, e mesmo assim acomodar na tarifa um valor que não hostilize em termos daquilo que é o seu encargo. Queremos manter no futuro esta justiça da nossa tarifa. Por vezes estes relatórios também são muito simpáticos para as entidades. Olhe que não! (risos) A AR possui também um bom indicador, segundo este relatório, na componente da resposta às sugestões e reclamações. É importante e temos tido a preocupação de responder num período de tempo que seja o adequado. Admito que em algumas circunstâncias existam falhas, até porque há pessoas que já se dirigiram a mim nesse sentido, mas serão residuais. Contudo os clientes continuam a queixar-se de que quando abrem a torneira, por vezes, a água vem escura. Temos a eterna questão do manganês aqui no sistema. É preciso dizer que nós herdámos tudo isto. Tem a ver com a qualidade do solo em que estamos a fazer cada vez mais captação de água, acarretando a libertação do manganês para a rede pública. Temos vindo a construir estações de tratamento de água que se revestem de um encargo muito grande por forma a filtrar toda essa água antes de entrar na rede. Mesmo assim e apesar de tudo ainda chega às torneiras água escura, mas é normal porque dentro da conduta existem áreas de sedimentação de outras partículas, e quando há agitação elas ainda vêm à tona. Ainda assim cumprimos com aquilo que são os parâmetros biológicos e químicos. Moura de Campos saiu de diretor da empresa. Estava desde o início e foi substituído por Miguel Carrinho, até aqui diretor financeiro. Foi a escolha natural? Sim por um conjunto de razões, porque foi um dos quadros técnicos que desde a sua fundação acompanhou a evolução da empresa. Continua a ser o diretor financeiro. Moura de Campos foi um dos grandes responsáveis do trajeto que a empresa teve até aqui. Por outro lado, a visão que o engenheiro Miguel Carrinho tem sobre o setor, participando em grupos de trabalho nacional e internacionalmente, ganhando ao longo dos anos know-how fazem dele a escolha certa. A Águas do Ribatejo esteve muito bem entregue durante 10 anos ao engenheiro Moura de Campos e vão continuar agora com Miguel Carrinho. Foi um nome consensual entre todos os municípios. |
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